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Por Vilma Gryzinski
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Vírus que aumenta a febre política

Tensões preexistentes são amplificadas por realidades complexas

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 24 abr 2020, 10h42 - Publicado em 24 abr 2020, 06h00

O que é verdade e o que é imaginação criativa sobre Winston Churchill nem sempre têm uma distinção clara. Mas vamos lembrar aqui uma anedota como só o gênio inglês poderia produzir. Ele e Clement Attlee estavam no banheiro da Câmara dos Comuns. Haviam governado juntos durante a guerra — muita gente esquece a parte de Attlee, o líder da oposição trabalhista, encarregado de tocar o dia a dia enquanto Churchill derrotava a Alemanha nazista. O impossível tinha acontecido. O “homem modesto, com muitos motivos para a modéstia”, numa das incontáveis zoações churchillianas, derrubara nas urnas o aristocrata com lugar garantido em qualquer lista dos dez maiores vultos da história humana. Voltando ao mictório. “Está se sentindo meio estranho, Winston?”, perguntou Attlee, um socialista austero e furiosamente estatizante, querendo fazer graça. “Com certeza, Clement. Sempre que você vê alguma coisa grande, privada e que funciona bem, quer nacionalizar.”

“Ah, que tempos. Ah, que homens. Ah, como é inútil ficar fazendo comparações históricas”

Ah, que tempos. Ah, que homens. Ah, como é inútil ficar fazendo comparações históricas. A crise do coronavírus só pode ser chamada de “a maior desde a II Guerra Mundial” porque a mente humana exige classificações. Todas as suas características únicas já foram suficientemente ressaltadas, mas vale a pena lembrar que o vírus maldito e a peste da devastação econômica, com as violentas tensões que o combate a ambos desencadeia, não criaram uma situação em que todos os humanos gritam “invasão nazista” ou “ataque de zumbis alienígenas”, agarram paus e pedras e vão para a luta, sob risco de se acabarem todos. Os prejuízos individuais no caso da epidemia são calculados de forma diferente. Qual o maior risco para mim: pegar o vírus e sofrer a versão (minoritária) que frequentemente leva à morte ou ficar preso em casa, sem dinheiro e sem trabalho? As decisões coletivas, obviamente, seguem padrões diferentes, mas o peso da avaliação individual ajuda a entender por que as divisões políticas, quando já são muito gritantes, aumentam em vez de diminuir neste momento de crise.

São fenômenos autoevidentes, embora não únicos, nos Estados Unidos e no Brasil. Note-se que os dois países têm em comum a vastidão territorial e as diferenças regionais da epidemia. Nova York (ou São Paulo) enfrenta uma realidade, brutal, embora já em refluxo, bem distinta da de Iowa ou Nebraska, alguns dos estados onde se disseminou, sem confrontos graves apesar do tamanho das armas que fazem parte da paisagem do interiorzão americano, o movimento pelo fim do isolamento. Por incrível que pareça, isso não é uma má notícia, pois mostra que a devastação não atingiu um nível que faria com que os derrotados se unissem sob qualquer bandeira. Também não é errado políticos quererem ganhar eleição — e para isso apostarem no menor desgaste possível. Apostam errado? Perdem. E acabam todos no lugar onde os fluidos corporais de Attlee e Churchill terminaram no dia daquele encontro. Sem nem deixar uma anedota espirituosa para a história. Falando em apostas, é razoável presumir que algumas coisas não acontecerão: golpe militar, racha da Federação americana e gente rasgando os 600 reais que o governo pôs no bolso dos mais desamparados.

Publicado em VEJA de 29 de abril de 2020, edição nº 2684

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