Trump tem salvação ou está na hora de temer aos céus?
Filho encrencou pai de forma estrondosa ao admitir e provar de que queria ouvir proposta dos russos para encrencar Hillary, mas ainda não é o fim
Os mais otimistas diriam que foi uma estratégia para neutralizar os adversários.
Mas está difícil encontrar otimistas depois que Donald Trump Jr. revelou, de moto próprio, a sequência de e-mails em que se dispõe a ouvir uma emissária russa com “provas” de falcatruas de Hillary Clinton, na época da campanha.
Também está difícil entender o papel exato da advogada Natalia Veselnitskaya, que compareceu ao encontro, em junho do ano passado, e não entregou nada do prometido.
E mais difícil ainda explicar a intermediação de um empresário artístico, Rob Goldstone, que invocou o nome de seu cliente, um cantor do Azerbaijão, e o pai dele, conhecido de Trump da época do Miss Universo em Moscou.
O primeiro contato foi feito através da secretaria de Trump, Rhona Graff. Não é preciso ter formação jurídica para saber que, uma vez envolvida a secretária, as agendas eventualmente aparecem.
Bem, este é um resumo rápido e, como certas cargas de cavalaria, mal feito. Interessa mais, para os efeitos atuais, o que vem depois.
ROUBADA OU CILADA
Trump Jr. vai enfrentar inquéritos, no Congresso e possivelmente na Justiça. Mas não ocupa nenhum cargo no governo, ao contrário da irmã, Ivanka, e do cunhado, Jared Kushner. Este participou do encontro com a russa – saiu no meio, depois de uns dez minutos.
Provavelmente Kushner percebeu que era uma roubada. Foi o suficiente, porém, para se encrencar: sabia do assunto que havia sido prometido, embora não concretizado.
Portanto, concordou em ouvir alguém que falaria, segundo Goldstone, de provas quentes vindas de Moscou, da parte da promotoria-geral, envolvendo contribuições russas para o comitê democrata.
Portanto, participou de um conluio. Mesmo que sem consequências e mesmo que, juridicamente, não seja um crime.
Politicamente, é um desastre. A única possível e mesmo assim fraca alternativa seria provar que, além de uma roubada, o encontro foi uma cilada, uma armação tramada para envolver a família, preventivamente, na hipótese considerada improvável, à época, de que Trump fosse eleito presidente.
Trump se encontrará assim numa situação clássica: nomear alguém da família é fácil, difícil é demitir. Se ficar, o genro enfraquece o sogro. Se sair, não melhora muito as coisas para ele. É uma situação que outro presidente, muito mais próximo, de nós, já viveu com numerosos assessores.
“Furação classe 5” foi o termo usado, com grande alegria, pelo Washington Post para descrever o clima na Casa Branca.
Alegria porque o Post, juntamente com o New York Times e mais 90% da grande imprensa, vê a possibilidade de que o sonho se torne realidade: um crescendo de revelações que leve o Partido Republicano a perder a maioria, nas eleições legislativas do ano que vem, ou a se convencer a votar pelo julgamento político e eventual afastamento do presidente.
VICE CERTINHO
A sequência de reviravoltas dramáticas desde que Trump estreou com extraordinário estrépito na cena política americana não faz prever nenhum roteiro certinho.
Em todo caso, só para lembrar: Trump tem um vice aparentemente à prova de escândalos. Mike Pence, vindo de uma família de irlandeses católicos, é evangélico.
Do tipo que leva ao pé da letra os princípios mais estritos. Um exemplo: foi ridicularizado pelos antitrumpistas quando disse numa entrevista que evitava marcar almoços ou jantares de trabalho a sós com mulheres, para não correr o risco de vulnerabilizar seu casamento.
Ex-locutor de rádio e ex-governador de Indiana, ele basicamente não tem bens: declarou patrimônio na faixa de 110 mil a 245 mil dóiares, composto na maioria por um fundo de aposentadoria. O filho dele é tenente dos Fuzileiros Navais.
Mais recentemente, Pence tem tido uma série de reportagens relativamente favoráveis, uma espécie de provocação da imprensa antitrumpista para irritar seu chefe – mas nada rechaçadas pelo vice.
Trump já disse várias vezes que Pence foi a surpresa mais agradável que teve como presidente. Até sobre religião os dois falam.
A cena de pastores evangélicos fazendo uma oração em torno de Trump, com imposição de mãos, pode ser atribuída a Pence. O vice aparece na foto enormemente simbólica, de cabeça abaixada em oração, logo atrás do pastor de camisa azul. A reza tem que ser forte. Seja qual for.