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Revolução anticultural: a decadência de universidades americanas

Esquerdização tosca e violenta cria centros de oposição ao conhecimento, ao debate e à paciência até dos que descontam a natural combatividade dos jovens

Por Vilma Gryzinski 10 mar 2017, 09h01

Vencer o debate sempre foi um dos maiores orgulhos da esquerda – mesmo que a discussão fosse entre alas que disputavam o troféu de esquerdismo. Estudar, ler, conhecer os argumentos contrários, dominar os recursos da oratória e também saber quando insuflar a massa a vaiar o adversário eram partes integrantes do arsenal do universitário esperto.

Só a última parte sobrou em algumas das mais importantes universidades do mundo, as do eixo Estados Unidos-Inglaterra. Isso quando as vaias não são acompanhadas de agressões e de atos que impedem palestrantes de falar.

Professores e reitores muitas vezes abaixam a cabeça e ouvem impropérios, mesmo ou talvez exatamente porque incentivam seus estudantes a agir como uma cópia bizarra dos batalhões da Revolução Cultural.

O trágico movimento da China maoísta, criado para destruir “de baixo para cima” as estruturas de poder, na academia, nas artes e, sobretudo, no próprio Partido Comunista, foi um dos acontecimentos mais brutais do país.

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Até hoje é impossível calcular o número de pessoas acossadas, humilhadas em público, transferidas para o campo e executadas – isso sem contar a destruição de relíquias históricas. A imagem mais triste que ficou foi a de professores com chapéu de burro e cartazes pendurados no pescoço fazendo “autocrítica”, enquanto os jovens convocados para fazer a Grande Revolução Cultural do Proletariado sacudiam livrinhos vermelhos do pensamento de Mao Tse-tung.

Numa palestra recente do cientista político Charles Murray no Middlebury College, uma universidade do estado de Vermont, estudantes impediram que ele subisse ao palco. Quando conseguiu subir, deram-lhe as costas e vaiaram.

Quando saiu do local, para fazer a palestra numa sala fechada, acionaram alarmes de incêndio. Ao se retirar, uma professora que o acompanhava sofreu agressões como puxões de cabelo e um golpe no pescoço. O carro em que ambos entraram foi chutado e amassado até conseguir sair sob proteção de policiais universitários proibidos de qualquer atitude remotamente agressiva.

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“Foi o dia mais triste da minha vida”, disse Murray. Desde 1994, ele está acostumado a provocar reações extremas por causa do livro A Curva de Bell, mas nada semelhante ao que aconteceu em Middlebury, onde ouviu slogans malucos como “Racista, sexista, antigay; suma daqui, Charles Murray”.

No livro do qual jamais se livrará, Murray contesta um dos dogmas mais entranhados, da esquerda à direita: a de que as desigualdades sociais são fruto de condições injustas. O argumento mais rejeitado é o de que o componente genético pesa mais na inteligência e que raças diferentes têm variações intrínsecas de QI, com asiáticos no topo, seguidos de brancos e, por fim, negros.

Todos os argumentos já foram usados para desconstruir as teses de Murray. Nem adianta dizer que ele defendia o uso do ensino para diminuir as desigualdades que considera naturais, embora perversas. Seu livro mais recente é um mergulho na “América profunda”, a dos brancos de classe operária deslocados, um tema que detectou muito antes do fenômeno Trump.

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Curiosamente, Murray defende um programa de renda mínima, uma espécie de bolsa individual para pessoas desempregadas ou de baixa renda. Como libertário conservador, ele gosta da ideia de diminuir todos os inúmeros processos burocráticos envolvidos em outras formas de benefícios sociais.

Mas acha, principalmente, que a renda mínima ou universal é necessária para abrandar a revolução, já em curso,  da substituição de várias formas de trabalho pela robotização.

Vale a pena ouvir o que tem a dizer? Os estudantes “ativistas” de Middlebury acham que não só ele não deve ser ouvido, como impedido de falar. No novo léxico dos aprendizes de revolucionários anticulturais, Murray é um “supremacista branco”, termo que atualmente atinge qualquer pessoa que não pregue a derrubada de Donald Trump – a quem, por sinal, o cientista politico não apoiou.

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As maluquices politicamente corretas das universidades americanas já viraram até folclore. Aliás, o termo politicamente correto, que em sua nobre origem pretendia combater formas variadas de discriminação, está proibido na Universidade de Wiscosin-Milwaukee. Pode implicar numa acusação de que alguém esta sendo “sensível demais”.

Também estão na lista “terceiro mundo”, “seja homem” e “que loucura” – este por “criar uma perspectiva negativa de pessoas com diagnósticos no campo da saúde mental”.

A Universidade de Washington, em Tacoma, orientou seus alunos no sentido de que o uso das regras gramaticais perpetua o racismo – já vimos algum parecido no Brasil. A norma culta do inglês implica em discriminação, mesmo que não consciente.

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É o que chamam atualmente de microagressões. Nem uma única atividade humana está livre dessa praga, segundo o Centro de Escrita da universidade, uma vez que o racismo está presente em  “sistemas, estruturas, regras, linguagens, expectativas, orientações que formam nossas aulas, escolas e sociedade”. E depois as classes ilustradas se espantam quando cidadãos comuns, exposto a essas ideias infernais, votam em Trump.

É claro que a linguagem e a escrita são perscrutadas há muitas décadas como reflexo privilegiado das estruturas vigentes – ou dominantes. Mas nem o estruturalista francês mais exagerado pensaria em propor o que fizeram estudantes de língua inglesa de Yale, fundada em 1701, em Connecticut, com o moto “Luz e Verdade”.

O curso de Grandes Poetas Ingleses, disseram os alunos, faz com que muitos “se sintam tão alienados que levantam e vão embora”. Por quê? Consideram-se ofendidos pela obra de Chaucer, Spenser, Shakespeare, Donne, Milton, Pope, Wordsworth e T.S. Eliot.

Como não é possível mudar, retroativamente, a raça ou o sexo desses escritores prodigiosos – embora alguns talvez até gostassem  da ideia -, os alunos que assinaram o manifesto pedem que seja eliminados do curso.

Em lugar de aprender, inclusive criticamente, com a humanidade em toda a sua gama refletida na obra dos grandes poetas, os aprendizes de revolucionários anticulturais preferem riscá-los da história. Nem Katherina, a shakespeariana megera cruelmente “domada” por Petruchio, concordaria com uma bobagem dessas.

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