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Quem fez a cabeça de Trump: estas mulheres ou os generais?

É uma missão impossível, ou talvez inútil, controlar o Afeganistão, mas o preço de ver o talibã de volta talvez seja mais insuportável ainda

Por Vilma Gryzinski 23 ago 2017, 16h00

“Fácil de entrar, difícil de sair”. A definição sobre o Afeganistão dada por um sujeito que entendia de campanhas militares continua sendo exemplarmente sucinta e, em muitos aspectos, verdadeira.

O sujeito era Alexandre, o Grande, que entrou e saiu do Afeganistão há mais de 2.300 anos. Deixou para trás, como no resto do mundo da época, os fundamentos de um império helenizado que durou relativamente pouco.

Muitos outros construtores de impérios passaram pelo país do fim do mundo, com dinastias com nomes como Hotaks e Durranis, muito parecidos com o fictícios dothrakis de Game of Thrones.

Trancado na Ásia Central, inacessível de um lado por montanhas geladas e, nos outros flancos, por uma cultura típica de povos isolados em regiões remotas, o Afeganistão chegou à época da foto acima, os anos setenta do século XX, com uma mistura característica das transformações que começavam no Ocidente e batiam no resto do planeta.

Mulheres de burca, a tenda corporal que foi uma adaptação dos princípios muçulmanos à cultura tribal, dividiam as calçadas de Cabul com jovens de minissaia e sapatos de salto quadrado que estariam perfeitamente à vontade na onda saudosista da moda atual.

Desenvoltas, sorridentes e impensáveis no Afeganistão de hoje, as três mulheres da foto tiveram um papel importante. Ajudaram o general da reserva H. R. McMaster, conselheiro de Segurança Nacional, a convencer Donald Trump a ir contra seus instintos, como disse o próprio presidente, e autorizar um aumento de tropas americanas no Afeganistão.

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CASO PERDIDO

Segundo a argumentação de McMaster, vazada para o Washington Post, a foto significa que o Afeganistão não é um caso perdido, um lugar no fim do mundo onde os Estados Unidos se atolaram, ao entrar para acabar com o estarrecedoramente brutal domínio dos talibãs, os ultrafundamentalistas que abrigavam e ajudavam a Al Qaida de Osama Bin Laden.

E do qual deveriam sair, dezesseis anos depois, para não sacrificar mais vidas e recursos. Por este raciocínio, se os afegãos querem de volta ou não conseguem se livrar dos talibãs, que reconquistaram posições depois do recuo americano, que se danem.

Trump defendeu exatamente isso durante a campanha. Curiosamente, agora é criticado por ter mudado de posição, à esquerda e à direita, com argumentos muito parecidos.

Como o relutante aumento de tropas parece muito com uma desanimada decisão na mesma linha de seu ídolo máximo, Barack Obama, o New York Times critica Trump por não ter um plano diplomático, por ser tosco, por falar por tuítes e todo o blablablá habitual.

O site Breibart, que ficou mais interessante ainda com a volta do ex-conselheiro estratégico Stephen Bannon, depois de perder a guerra interna com o general McMaster, disse que a decisão de continuar e aumentar a presença militar no Afeganistão pode custar a Trump a reeleição em 2020.

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Um caminho bem longo e complicado, da perspectiva atual, em que as forças antitrumpistas se animam com a perspectiva de derrubar o presidente via impeachment.

‘FADIGA DE GUERRA’

Mas parece incontestável que os assessores a quem Trump chama orgulhosamente de “meus generais” convenceram o presidente a aumentar em número ainda não declarado as tropas americanas que impedem a derrocada do governo atual e o avanço dos talibãs.

Todos eles conhecem bem o terreno e o risco de entregar o país de volta aos fundamentalistas, agora incrementados por um ramo do Estado Islâmico. Entre outros riscos, a derrocada do Afeganistão forneceria uma área de recuo para os jihadistas que estão sendo derrotados no Iraque e na Síria.

Jim Mattis, o Cachorro Louco, atual secretário da Defesa, em 2001 voou de helicóptero com seus marines para avançar até Kandahar, na ofensiva anfíbia de mais longo alcance da história americana. Do ponto de vista militar, a operação da Força Tarefa 58 é considerada um modelo de audácia e inovação.

McMaster teve uma missão extremamente ingrata: chefiou em 2010 uma força-tarefa de combate à corrupção no Afeganistão, muito mais difícil do que derrotar o talibã.

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O general John Kelly, agora chefe da Casa Civil, comandou a gigantesca base dos fuzileiros navais de Camp Lejeune depois do 11 de setembro e da subsequente invasão do Afeganistão. Em 2010, perdeu um filho, também marine, na explosão de uma mina em território afegão.

Uma exceção: de forma geral, os militares americanos saem das classes mais pobres, ainda muito identificadas com sentimentos patrióticos ou com falta de opções de carreira – exatamente os eleitores de Trump.

Uma das mais explícitas declarações de Kelly: “Quem acha que a guerra contra nosso modo de vida acabou só porque alguns autodenominados formadores de opinião estão com ‘fadiga de guerra’ e querem que saíamos do Iraque e do Afeganistão, está muito enganado. Este inimigo está empenhado na nossa destruição. Vai lutar contra nós por gerações e o conflito terá muitas fases, como já teve desde 11 de setembro”.

GUERRA SANTA

Juntamente com as saias curtas e a onda de modernização dos anos setenta no Afeganistão, outro modismo ocidental havia chegado ao país: o comunismo ao modelo típico da época, misturando nacionalismo com um apelo forte entre os militares. As consequências seriam trágicas.

Assim que deram um golpe, chamado de Revolução de Saur (o segundo mês do ano, em persa), os comunistas se dividiram em facções rivais. Golpes e contragolpes acabaram levando a União Soviética a interferir em favor de uma facção aliada.

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Para os russos, não só foi fácil entrar, em 1978, como sair tornou-se tão difícil que só aconteceu já no ponto da trajetória que levaria à dissolução do próprio império soviético.

Para ajudar no combate aos soviéticos, Estados Unidos, Paquistão, Arábia Saudita e outros armaram e sustentaram os mujahidins, uma palavra que entrou no dicionário mundial. A resistência virou uma jihad, ou guerra santa. Muçulmanos fundamentalistas de vários países, especialmente árabes, foram para o Afeganistão. Entre eles, um certo Osama Bin Laden.

Divididos por etnias, ideologia ou alianças com potências estrangeiras, os afegãos se mataram sistematicamente até que um grupo fundamentalista cujos militantes se denominavam talibãs, ou estudantes dos códigos muçulmanos, conseguiu se impor, praticamente por exaustão dos adversários.

Recompensaram com todo o apoio que podiam dar o homem que havia sistematizado a jihad nos moldes contemporâneos. Desde o começo, o xeque Bin Laden havia estabelecido quem era o inimigo: os Estados Unidos.

Esta guerra, em diferentes estágios, como definiu Kelly, continua a ser lutada. O apelo do jihadista ficou maior ainda com a ascensão do Estado Islâmico e se tornou especialmente perigoso com a adesão de muçulmanos radicados na Europa e nos Estados Unidos.

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O Afeganistão continua a ser um atoleiro, mas o perigo ficaria menor ou maior se os americanos desistissem e dessem o fora?

Foi esta a decisão que Trump precisou tomar. Ouviu os “seus generais”, que previam um vácuo de poder similar ao que aconteceu no Iraque quando Obama, seguindo a opinião pública e suas próprias inclinações, determinou a retirada total.

Entrar é fácil, sair é difícil e continuar pode ser mais complicado ainda, do ponto de vista da política interna. Trump está no mesmo ponto que Daenerys Targaryan em Game of Thrones atualmente.

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