Por que impeachment não passará? É a eleição, burros
Pelosi é estrategista política experiente, joga num tabuleiro que conhece bem e, com o Partido Democrata em peso por trás, aposta que vai quebrar Trump
A Dama vai derrubar o Rei?
Através do impeachment, dificilmente.
Nancy Pelosi sabe disso muito bem.
Com toda a retórica de defender a democracia, a constituição, a própria ideia fundacional dos Estados Unidos, e ainda se sentir “tristemente” obrigada a recorrer ao impeachment para isso, a presidente da Câmara dos Deputados está olhando para a eleição presidencial de novembro do ano que vem.
A tática de enfraquecer Donald Trump através de um processo obviamente desgastante, onde seus conhecidos e múltiplos defeitos são projetados na grande tela da consciência (e do inconsciente) nacional, já demonstrou ter efeitos sérios.
Em média, 50% ou 51% dos americanos, talvez um pouco mais, dependendo da pesquisa, são a favor de que o Senado vote pelo afastamento definitivo do presidente.
Isso significa que o Senado irá coonestar o impeachment?
De jeito nenhum.
Significa que, mesmo absolvido pela maioria dos senadores (republicanos), ele vai perder a reeleição?
Também não. Ou ainda não.
A essa altura, ninguém com um mínimo de experiência crava, sem tremer a mão, num resultado.
Todas as pesquisas indicam maioria de votos para um candidato democrata, seja ele quem for.
Todas as pesquisas podem: a) estar erradas; b) dar a maioria dos votos populares ao candidato opositor e a vitória no Colégio Eleitoral a Trump.
Já aconteceu antes, lembram?
Trump mantém uma aprovação que não cai abaixo dos 40%, praticamente um prodígio, em especial para alguém com tanta capacidade de despertar ódio até o limite do paroxismo.
Só para dar uma ideia: uma psiquiatra de Yale, Bandy Lee, “analisou” a carta de seis páginas em que Trump descasca Nancy Pelosi e todo o processo de impeachment com seus notórios arroubos.
Alguma dúvida sobre a conclusão? “Com os sinais de patologia que ele revela, deveria se submeter a um exame de saúde mental ou, se se recusar, remover-se do cargo”.
Ou seja, nem psiquiatras de Yale usam mais a lógica. Como o presidente vai se remover se não aceita que sua saúde mental seja colocada em dúvida?
Não vamos nem falar na ética dos diagnósticos à distância, pois essa já foi para o espaço há muito tempo (a doutora Lee adiciona um argumento: tem a obrigação de fazer o telediagnóstico, pois, na hipótese contrária, seria cúmplice da “psicose compartilhada”).
É muito possível que Nancy Pelosi e outros líderes democratas que contam acreditem no desequilíbrio mental de Trump.
Mas a frase legendária de James Carville sobre o propósito da primeira campanha presidencial – “É a economia, seus burros” – pode ser 100% transposta para as jogadas políticas que levaram ao impeachment de Trump.
“É a eleição seus burros”.
Com a economia bombando, a bolsa nem se fale, a inflação controladíssima, o desemprego em níveis históricos de baixa e a perspectiva de que um acordo comercial com a China torne tudo isso ainda acachapante, Trump tem que ser minado em outro plano.
Pelosi apostou que vai conseguir isso.
Dentro de três meses, ela completa inacreditáveis 80 anos – um triunfo da genética e das intervenções estéticas – e tem cancha no tabuleiro.
Nos últimos dias, tem usado um broche que representa a maça, o símbolo do poder da Câmara dos Representantes – bem menos impressionante do que o artefato usado no Parlamento britânico, mas, assim mesmo, poderoso.
Curiosamente, a massa americana tem muitos dos atributos de que Trump é acusado.
Para começar, emula a fasces, da Roma antiga, as varas amarradas, significando o fortalecimento de todos pela união do poder do Estado.
Vem daí, todo mundo sabe, a palavra fascista no sentido original. O fascismo italiano copiou amplamente a simbologia romana.
O broche de Nancy Pelosi tem uma pérola (falsa, embora ela seja milionária e use também joias verdadeiras caríssimas) para representar o globo terrestre.
E uma águia, o símbolo dos Estados Unidos da América, por cima da coisa toda. Nem precisa explicar o que quer dizer.
Sem querer, ela talvez tenha usado uma representação visual do slogan: “Vamos fazer a América grande de novo”.
Já deu certo uma vez na primeira eleição de Trump, contra tudo e contra todos.