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Patrulha da sobrancelha: em Cambridge, loucura politicamente correta

Professores universitários poderiam ser denunciados anonimamente por “mudança na linguagem corporal” como erguer as sobrancelhas

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 2 jun 2021, 08h26 - Publicado em 2 jun 2021, 08h20

Não foi dessa vez que os 800 anos de história de Cambridge ruíram estrondosamente. Mas provavelmente será da próxima: a loucura politicamente correta que grassa nas grandes universidades britânicas e americanas não pretende deixar pedra sobre pedra.

Em Cambridge, onde vicejaram Charles Darwin (a batata dele está assando), Lorde Byron, Bertrand Russell e Stephen Hawking, cada um deles um exemplo espetacular de como contestar o senso comum pode produzir conhecimento e arte, durou quase uma semana um site onde alunos poderiam denunciar anonimamente as “microagressões” praticadas por professores.

Microagressões são um dos exemplos mais clássicos de como ideias boas e nobres, tal como combater a discriminação contra minorias, podem se transformar no sétimo círculo do inferno politicamente correto.

Um exemplo dessa insanidade inquisitória está na definição do que são microagressões segundo o site temporariamente sepultado em Cambridge. Enquadram-se na categoria “insultos e indignidades” o que o site qualifica de “comportamentos como uma mudança na linguagem corporal quando reagindo àqueles com uma determinada característica”.

Ficou em dúvida? Esclareça-se: os tais comportamentos incluem “levantar as sobrancelhas quando um funcionário ou aluno negro está falando, minimizando o funcionário ou aluno que levanta o tema de raça ou racismo no ensino”.

Outros: “Cumprimentos arrevesados” nas mesmas circunstâncias. “Evitar ou dar as costas a determinadas pessoas”. Fora tratar alguém como se fosse do gênero ao qual diz não pertencer.  E chamar “mulher de menina”.

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Como provar que um professor cometeu o delito de levantar as sobrancelhas? A denúncia anônima dispensaria comprovações, como na Santa Inquisição.

A eliminação do site foi uma vitória parcial numa guerra que parece perdida. Na mesma categoria se inclui a sobrevivência, provavelmente também temporária e por motivos relacionados apenas ao patrimônio cultural, da estátua de Cecil Rhodes em Oxford, onde subsistem doações e uma bolsa deixada pelo megaimperialista que foi precursor da exploração de diamantes na África do Sul.

O furor politicamente correto já ultrapassou as fronteiras tradicionais das ciências humanas – está a perigo, por exemplo, o ensino de grego e latim nas escolas dedicadas ao estudo das civilizações clássicas da antiguidade. Até a matemática, a ciência exata por excelência, é acusada de ser racista e várias escolas médias americanas hoje priorizam “as experiências das comunidades de cor”.

A medicina não escapa e o diretor de redação do Jornal of the American Medical Association, JAMA, considerou-se ontem obrigado a se demitir por causa do podcast de outro médico da equipe dizendo que fatores socioeconômicos, e não racismo estrutural, são responsáveis pelas diferenças nos indicadores médicos de brancos e negros.

“Fiquei profundamente decepcionado comigo mesmo pelos lapsos que levaram à publicação do tuíte e do podcast. Embora não os tenha produzido ou lido, sou o responsável em última instância”, penitenciou-se Howard Bauchner.

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O mencionado Charles Darwin também anda a perigo. A revista Science publicou um artigo de um antropólogo de Princeton, Agustin Fuentes, dizendo que  A Origem do Homem traz uma “visão racista e sexista da humanidade”, revelando ser frequentemente “problemático, preconceituoso e injurioso”.

“Darwin representou povos indígenas das Américas e da Austrália como inferiores aos europeus em capacidade e comportamento. Povos do continente africano foram consistentemente referenciados como cognitivamente depauperados, menos capazes e de status inferior a outras raças”, anotou o professor.

Darwin também apresenta “as mulheres como inferiores aos homens (brancos), frequentemente próximas das ‘raças inferiores’”. Ele também descreve o homem como “mais corajoso, enérgico, inventivo e inteligente, invocando a seleção natural e sexual como justificativa, apesar da falta de dados concretos e de avaliação biológica”.

Darwin reflete, assim, “a misoginia tanto vitoriana quanto contemporânea”.

Imagem só, um estudioso da era vitoriana ser, bem, vitoriano. Pelos padrões atuais, seria reacionário. Pelos padrões da época, em termos científicos e não sociais, foi um revolucionário.

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Contestar tudo, inclusive Darwin, é prerrogativa das práticas saudáveis do pensamento livre. Mas fazê-lo pelos motivos errados, ou fora do contexto histórico,  é o tipo de tolice que acaba em patrulha de sobrancelhas.

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