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O mundo fica distante de novo

A crise nas cadeias de abastecimento é golpe na globalização?

Por Vilma Gryzinski 24 out 2021, 08h00

Em abril de 1956, um cargueiro zarpou de Nova Jersey para Houston levando uma novidade: “caixas” de aço corten de tamanho padronizado que podiam ser transferidas diretamente para carrocerias de caminhões especialmente adaptadas para transportá-las. Chamavam-se contêineres e tinham sido inventadas por Malcom McLean, um empreendedor que havia começado no ramo dos transportes como menino paupérrimo do interiorzão da Carolina do Norte, trabalhando com um caminhão de segunda mão. As humildes “caixas” mudariam o mundo. Ao racionalizar e baratear os custos do transporte marítimo, elas confluíram para transformações muito mais celebradas, como a revolução digital, a transformação da China em economia de mercado e a entronização do capitalismo e do livre fluxo de mercadorias como sistemas consensuais. O conjunto dessas mudanças foi chamado de globalização.

“Não adianta ter tudo mais barato se as mercadorias ficam empilhadas nos portos”

Levantar de manhã e tomar um café com cápsula feita na Suíça — um país que não produz um único pé de arábica —, teclar num celular fabricado em Zhengzhou e pegar um carro alimentado a chips semicondutores vindos de Taiwan são atos que a globalização normalizou. E os contêineres viabilizaram, em escala estonteante. O maior navio cargueiro do mundo tem capacidade de levar 23 992 contêineres. Cabem neles 145 milhões de pares de tênis. Tão revolucionárias quanto as ânforas para o transporte de vinhos e azeites disseminadas pelos fenícios, as caixonas de transporte inauguraram problemas que se tornaram clássicos da globalização. A começar pela redundância dos estivadores, uma categoria altamente sindicalizada e boa de briga, características que não impediram seu drástico encolhimento. Das fábricas de calçados gaúchas às siderúrgicas de Detroit, a transferência da produção para a China provocou o mesmo efeito exterminador nos empregos. A promessa da economia globalizada era que os postos de trabalho sugados “aqui” — no setor manufatureiro — ressurgiriam “ali” — na indústria de serviços e de tecnologia avançada. Nem sempre foi uma promessa cumprida, redundando em rebeliões eleitorais como a vitória de Donald Trump e do Brexit, mas a economia globalizada tirou 1,1 bilhão de pessoas da pobreza e barateou o custo de vida de outros bilhões.

É todo esse processo de escala planetária que hoje está estremecido. A Covid-19 assustou mesmo os governos mais liberais, ao fazê-los descobrir que os suprimentos médicos, de máscaras a substâncias para a fabricação de vacinas, dependiam totalmente da China. E o pós-Covid está provocando outra constatação: não adianta ter tudo mais barato, de brinquedos a autopeças, se as mercadorias trazidas do outro lado do mundo ficam empilhadas nos portos, sem caminhoneiros suficientes para esvaziar os contêineres. Pode ser apenas um susto passageiro, um soluço num mundo ainda sob os efeitos traumáticos da pandemia. Pode ser uma nova fase que exija adaptações como mais espaços para armazenagem — e, portanto, custos maiores. Pode ser que o mundo encolhido pela globalização esteja ficando menos pequeno de novo.

Publicado em VEJA de 27 de outubro de 2021, edição nº 2761

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