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Por Vilma Gryzinski
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Lobo Guerreiro x Rambo: o estilo dos confrontos China-EUA

O coronavírus criou um novo campo de operações hostis e as jogadas de cada lado estão cada vez mais agressivas; cada um quer se livrar de alguma coisa

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 1 Maio 2020, 11h14 - Publicado em 1 Maio 2020, 07h34

Donald Trump quer usar o novo coronavírus para jogar a culpa na China, e suas artes de despistagem,  pela terrível crise que a pandemia criou nos Estados Unidos e tentar assim ser reeleito presidente?

Sem dúvida nenhuma.

A China quer usar a doença e suas consequências malditas para mostrar sua eficiência no combate à praga, enquanto os Estados Unidos são um país fraco, desorganizado, vulnerável e prontinho para deixar – adivinhem para quem – o lugar de superpotência mundial?

Com toda certeza.

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O mais instigante nessa nova configuração da disputa geopolítica dos dois países é que, sem entrarmos de forma alguma no campo da equivalência moral, ambos têm bons argumentos nessa nova “coronawar”.

A guerra fria não é nova – ao contrário, é um dos definidores de nossos tempos. A novidade é a nova agressividade – de Trump, nem se fale, faz parte do estilo.

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A mais recente foi declarar que “tem um alto grau de confiança” em evidência que “viu, sim” na teoria de que o novo coronavírus tem origem num laboratório do Instituto de Virologia de Wuhan.

A hipótese de uma “fuga” acidental não é nova e, apesar do ar conspiratório, foi levantada pela primeira vez por dois pesquisadores chineses. 

Eles estudaram casos anteriores de contaminação acidental por sangue e urina de morcegos usados no laboratório justamente para pesquisas a vasta quantidade de doenças se transmitem.

A outra teoria, de que o vírus foi “desenhado”, ou seja, criado em laboratório com pedaços de outras doenças para produzir uma arma biológica contra inimigos da China, já foi descartada, inclusive pelos serviços de Inteligência dos Estados Unidos (só o francês Luc Montagnier, Nobel de 2008 pela descoberta do HIV, continua acreditando na origem artificial, que atribui à busca por uma vacina contra a Aids).

Curiosamente, o conspiracionismo foi descartado por organismos governamentais e cientistas de países ocidentais, mas não pela China.

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Numa manobra clássica de contrapropaganda, a China tem plantado agressivamente, através de seu exército digital e da sua rede diplomática, que o vírus na verdade é uma criação do Exército americano.

Esse novo estilo de reações agressivas exercido especialmente através de representantes diplomáticos, tem até um apelido: Lobo Guerreiro.

A origem é a série de filmes de ação de enorme sucesso, criada, dirigida e interpretada pelo ator Wu Jing.

Para quem tem paciência ou até gosta do gênero, a série é imperdível, em especial por empacotar o nacionalismo chinês numa embalagem à que o público ocidental está acostumado.

O herói é Leng Feng, atirador de elite de uma tropa de operações especiais, um tanto rebelde (enquanto não ameaçam a China, claro). 

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É mais moderninho do que o sorumbático e solitário Rambo, também criado por Sylvester Stalllone, mas tem exatamente o mesmo papel de encarnar um arquétipo de masculinidade e resistência física que acaba incorporando mitos e características nacionais.

Tema do primeiro filme da série: um vilão inabalável, protegido por mercenários americanos, rouba de um laboratório chinês amostras de sangue doadas por voluntários para pesquisas científicas. O objetivo é criar um vírus que atinja apenas chineses, espalhando doença e malformações fetais.

Atenção: o filme é de 2015.

 

A parte boa, se assim podemos dizer, da corrida da China para abocanhar o lugar de superpotência mundial e deslocar os Estados Unidos é que os dois países estão numa corrida radical para encontrar uma vacina para o novo coronavírus.

Imagem o prestígio e o reconhecimento de toda a humanidade ao país que encontrar a forma de evitar a praga que não só já devorou mais de 200 mil vida como arrisca simplesmente arruinar a economia mundial.

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Se conseguir a vacina e oferecê-la generosamente a um planeta traumatizado a China ganhará uma aura de invencibilidade.

Capaz até de apagar as bem fundamentadas suspeitas de que demorou demais para revelar as verdadeiras dimensões da doença, destruiu amostras que mostrariam sua natureza e fez isso tudo com a cumplicidade, pelo menos passiva, da direção da Organização Mundial de Saúde

Se não conseguir, já está espalhando  teorias conspiratórias contra os Estados Unidos que circulam não apenas nas franjas da internet, como no caso das contra teorias americanas.

A pesquisadora Chen Xuyan  mais do que insinuou uma entrevista de televisão que os teste iniciados em Seattle com humanos foram suspeitosamente rápidos. Um sinal de que os Estados Unidos já conheciam a doença antes que ela explodisse em Wuhan.

A acusação já foi feita em níveis mais altos, acompanhada dos devidos protestos.

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Para o público interno, a China tem um arsenal completo de propaganda: reagiu rapidamente a uma doença desconhecida, tomou medidas duas embora necessárias para proteger seus cidadãos, construiu hospital de campanha com velocidade alucinante  e saiu do “vírus de Wuhan”  com 4 643 mortos, o número revisado.

A economia sofreu e ainda vai sofrer, mas já está recuperando o ritmo alucinante.

Em compensação, países europeus e os Estados Unidos cometerem erros fatais,  somam mortos às dezenas – ou centenas, no caso americano – de milhares, revelaram lideranças fracas e vão se ferrar mais ainda com descalabro econômico.

São argumentos fortes justamente porque têm elementos verdadeiros. A tática do Lobo Guerreiro é antiga e executada com disciplina máxima.

A tática do Loiro Guerreiro na Casa Branca também tem lógica: os chineses armaram, nem que tenha sido involuntariamente, em parte, um agente patológico perfeito para tentar deixar os Estados Unidos de joelhos. 

Mais: “A China vai fazer qualquer coisa que possa para me fazer perder a eleição”. 

Palavras do próprio Trump, perfeitamente ciente de que um inimigo externo capaz de matar mais de 200 mil americanos sufocados por pulmões devastados e paralisar a maior economia do mundo é um instrumento eleitoral poderoso.

Brutalmente atingido por uma crise de dimensões únicas, sem contar os próprios tiros no pé que dispara regularmente, Trump vai usar cada vez mais os ataques contra a China como forma de tirar de suas costas qualquer responsabilidade pela desgraça.

Xi Jinping e seu exército de agentes em todos os setores vão tentar explorar as fragilidades reveladas pelas grandes democracias para não só expandir os interesses chineses como pregar a superioridade de seu sistema.

Em Rambo III, tem uma cena que virou icônica.

“Quem é você?”, pergunta um coronel russo, o vilão, ao fortão de camisetinha.

“Seu pior pesadelo”, responde Rambo.

Quem está se infiltrando nos sonhos de Trump no momento certamente é o “vírus chinês” e todo seu elenco de consequências inconcebíveis – do ponto de vista dele, em especial, perder a reeleição e ainda por cima para um conhecido sinófilo chamado Joe Biden.

Mas talvez o Lobo Guerreiro tenha dado um bote grande demais para sua boca. Talvez tenha acreditado demais na máxima de Sun Tzu de que “a glória suprema é quebrar a resistência do inimigo sem lutar”.

No detestável mundo novo criado pela pandemia, esse confronto entre China e Estados Unidos, que era uma espécie de doença pré-existente administrável pelos interesses mútuos em fazer negócios e ganhar dinheiro, caminha para a fase de síndrome aguda.

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