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Por Vilma Gryzinski
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Guerra química: muitos agora evitam remédios made in China

Trump quer trazer de volta a produção de medicamentos há muito terceirizada, França se preocupa com os equipamentos médicos - e a vacina também

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 18 Maio 2020, 08h07 - Publicado em 18 Maio 2020, 07h59

Os Estados Unidos querem produzir seus próprios remédios, a França vai fabricar suas próprias máscaras e até a Índia quer diminuir a dependência dos insumos farmacêuticos ativos, que importa para a produção que a colocou na categoria de campeã mundial de genéricos.

Não é preciso dizer qual os pontos em comum entre países tão diferentes.

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Primeiro, quebraram a cara quando explodiu a epidemia do novo coronavírus e se viram de mãos vazias, tendo que implorar à China, mesmo pagando muito caro, pelo fornecimento de equipamentos vitais, a começar pelas máscaras cirúrgicas cuja falta matou cidadãos comuns, internos e funcionários de asilos para idosos e trabalhadores dos sistemas de saúde.

Segundo, descobriram que dependem não só de equipamentos de proteção e aparelhagem hospitalar, mas também de remédios.

Nos bons tempos da globalização, coisa de uns quatro meses atrás, os americanos – ou a esmagadora maioria deles – iam dormir tranquilos, sabendo ou não dos seguintes dados: farmacêuticas chinesas fornecem aos Estados Unidos 90% de remédios como antibióticos, vitamina C, ibuprofeno e hidrocortisona, 70% do acetaminofeno e até 45% do heparin.

Produzir mais e mais barato, mesmo descontando-se o custo adicional do transporte, foi a lógica que acabou entregando à China o controle do fornecimento mundial de remédios.

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Como alterar isso depois do choque do coronavírus?

A produção nacional dirigida para setores estratégicos voltou a rondar o vocabulário como se nunca tivesse ido embora depois de descobrir que não tinha mais lugar num mundo onde tudo, sempre, poderia ser fabricado, estocado e fornecido por um preço muito mais barato no exterior.

O barato, como se diz no interior, saiu caro na hora da emergência.

Depois de passar pelo aperto de não ter máscaras, kits de teste, respiradores e até termômetros, o presidente Emmanuel Macron, considerado pelos inimigos à esquerda como entreguista terminal, e globallsta-mor pela direita, quer aumentar a fabricação de máscaras na França.

Foi um gesto mais para a plateia que fez quando a crise estourou. Mas o significado não escapou, o velho nacionalismo e seu companheiro de sempre, o protecionismo, ao qual ele dedica tanto desprezo, estão doidinhos para voltar.

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É só o primeiro passo de “um novo modelo que está para ser inventado”, segundo disse ao New York Times um ex-diretor da Secretaria Geral para a Defesa e Segurança nacional, Louis Gautier.

Macron também deu ataque quando soube que a Sanofi, grande farmacêutica francesa, estava comprometida a produzir para o mercado americano uma vacina ainda não existente, mas já em discussão.

A Sanofi está numa operação conjunta com a Glaxo com dinheiro do governo americano para buscar a vacina, na França. Seu diretor local foi chamado para uma conversa com o primeiro-ministro, Édouard Philippe.

Foi tudo dado como um mal entendido e o CEO da farmacêutica, Paul Hudson, teve o juízo de voltar atrás, depois de dizer que os Estados Unidos teriam a prioridade da vacina (que, repetindo, ainda não existe)

Brigar com a Sanofi é uma coisa, com a China é outra bem diferente.

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Mesmo agora, depois do choque inicial, ninguém tem material médico em quantidade suficiente para se sentir independente.

Pelo menos para brigar, os Estados Unidos têm o sujeito certo, Peter Navarro, o assessor para assuntos comerciais que nunca ouviu falar em discurso diplomático.

“A China conseguiu dominar todos os aspectos da cadeia de fornecimento usando as mesmas práticas comerciais viciadas que usou para dominar os outros setores: exploração da mão-de-obra barata, regulamentações ambientais frouxas e maciços subsídios governamentais”, resumiu ele.

E o que aconteceria se o estado de guerra fria do momento ficasse um pouco mais quente?

“Se a China fechar a porta para a exportação dos componentes básicos para nossos remédios, as prateleiras das farmácias ficariam vazias em questão de meses e o sistema de saúde deixaria de funcionar”, resumiu para o Times a especialista em risco Rosemary Gibson.

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Para deixar as coisas mais claras, um artigo na agência oficial XinHua notou nada diplomaticamente que os Estados Unidos acusam a China de espalhar o novo vírus, mas “chafurdariam no inferno” se o país suspendesse a exportação de medicamentos.

Pode ser mais claro?

A Índia, que depende em 70% dos insumos chineses para a fabricação de remédios, sentiu os efeitos da crise, quando começou a epidemia na região de Hubei e as atividades foram paralisadas.

Agora, já tem planos de diminuir essa dependência, tanto para efeitos internos quanto para manter a liderança mundial que a coloca  como fornecedora de  fim quinto dos genéricos consumidos no mundo.

Antigos laboratórios e outras instalações já estão sendo reativados na nossa onda de nacionalismo.

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Como Trump, que não tem superpoderes nem sequer maioria na Câmara,  começaria, segundo o mesmo plano de Macron, a trazer de volta a produção de remédios de volta para os Estados Unidos é um assunto monumental – mas geralmente envolve algum incentivo governamental.

Mas é o tipo de assunto de que gosta. 

“Não é só a China, deem uma olhada na Irlanda. Eles fariam nossos remédios. Todo mundo fabrica nossos remédios, menos nós. Vamos trazer de volta todas estas redes de suprimentos”.

Paralelamente, e com muito mais urgência, existe a disputa pela vacina contra o novo vírus.

Trump já anunciou quem serão os diretores da Operação Warp Speed, a nova Operação Manhatan. 

Um é Moncef Saloui, nascido no Marrocos, formado em microbiologia na Bélgica e  com carreira na Glaxo, onde dirigia a divisão de vacinas. 

O outro diretor é um general. Gustave Perna – uma comprovação de que tão importante quanto desenvolver uma vacina é a logística alucinante da produção em massa e da administração. Trezentos milhões de frascos e outros trezentos de seringas descartáveis,  tudo mantido em temperatura refrigerada? Falem com o general.

O objetivo da Warp Speed é pular etapas no longo processo de se chegar a uma vacina e distribuí-la. 

Poucos países avançados têm condições de fazer isso, inclusive porque muitos europeus proibiam os testes com primatas. O que parecia um gesto nobre, de proteção aos animais, virou uma limitação nessa hora de extremo perigo. Pesquisadores europeus às vezes têm que mandar seu trabalho para colega de países onde isso continua a ser possível, como a Inglaterra.

Essa, no momento, está concentrada na “vacina de Oxford”, a mais avançada das três que estão no páreo (a americana da Moderna, entre outras na disputa; e a chinesa, da Sinovac).

A de Oxford vai começar a ser testada em 501 pessoas, de um grupo de controle de 1.112. O nome dela parece código seguro: ChAdOx1 nCoV-19.

A equipe de Oxford tem um acordo com a AstraZeneca, um dos grandes laboratórios britânicos, com participação suíça. A farmacêutica se propõe a ter 30 milhões de doses da vacina até setembro.

Os Estados Unidos já fizeram um acordo para ter acesso privilegiado, o que com toda certeza provocaria mais tensões nessa guerra química que envolve desde a aspirina mais humilde até a sonhada vacina que nos tirará do pesadelo.

É uma guerra com objetivos nobres, mas não sem disputas, concorrências e ataques de nacionalismo. 

Envolve centenas de milhões de vidas, provavelmente outro tanto de bilhões de dólares, prestígio, reconhecimento e um pequeno detalhe: já pensaram se cada pessoa que faz uma compra na farmácia virasse a embalagem para ver de onde vem seu remédio?

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