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Gritar “liberdade” dá pancada em Cuba. Até onde o regime vai resistir?

A explosão de manifestações espontâneas mudou tudo e a repressão não consegue sufocar novas e surpreendentes vozes de protesto

Por Vilma Gryzinski 19 jul 2021, 08h33

Deve dar um frio na espinha de muita gente quando quando o chefe da maçonaria, uma organização tradicionalmente cautelosa e muito mais ainda num regime totalitário, escreve uma carta ao presidente para manifestar “nossa rejeição à sua posição à frente do país, por convocar incitar e ordenar um enfrentamento com violência em relação ao povo cubano, também detenções e violência contra manifestantes pacíficos e cidadãos que pensam contra o sistema que o senhor representa”.

Foi isso que disse José Ramón Viñas Alonso, uma das várias e surpreendentes vozes que estão se levantando contra o regime liderado, pelo menos no papel, pelo presidente Miguel Díaz-Canel.

O líder da maçonaria foi convocado a prestar depoimento a agentes da polícia política. Durante a sessão, foi aconselhado a escrever “sobre a vacina e outras conquistas”. 

Seria quase humor negro se a situação não fosse tão mais perigosa para outros que criaram coragem, ou se desesperaram o suficiente para fazer como um homem anônimo que enfrentou aos gritos de “liberdade” uma turba de centenas de pessoas convocadas pelo regime, geralmente dos Comitês de Defesa da Revolução, para enfrentar os protestos. Foi dominado e jogado no chão, debaixo de pancadas, a humilde camiseta rasgada, a voz silenciada.

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Os cubanos que já estavam engajados em atos de resistência começam a ser conhecidos mundo afora. São artistas plásticos, cantores de rap e outros das áreas criativas onde o sufoco à liberdade de expressão é mais sentido, fora dissidentes heroicos como Guillermo Fariñas e as valentes Damas de Branco, ligadas à Igreja católica.

Mas o real motivo de preocupação para o totalitarismo vem daqueles que se criaram nas dobras do regime. Ou dos que nunca pensaram em assumir uma posição pública, temendo, com razão, os muitos braços da repressão.

Uma das manifestações mais simples e comoventes veio da Ring Pizza, cujos donos escreveram no Facebook: “Depois de dez anos sendo sua pizzaria favorita, hoje não estamos aqui para vender pizza, mas para dizer Pátria e Vida, Abaixo o Comunismo e Liberdade para Cuba”.

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“Chega de tantas mentiras e de tanto sofrimento, o bloqueio termina quando acabar o comunismo. Não queremos seu governo, não queremos você, caia fora, Díaz Canel”.

Quando a pizzaria assume posições políticas desafiadoras, a coisa está feia.

Muito mais ambíguo, o escritor Leonardo Padura disse que entre os manifestantes do 11 de julho pode ter havido pessoas “opostas ao sistema, inclusive algumas pagas”, mas nada tira a importância do grande grito que se ergueu sobre a ilha.

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“Impõem-se as soluções que muitos cidadãos esperam ou reclamam, alguns manifestando-se nas ruas, outros opinando nas redes sociais e expressando seu desencanto ou inconformismo, muitos contando os poucos e desvalorizados pesos que têm em seus bolsos e muitos, muitos mais fazendo em resignado silêncio filas de várias horas sob o sol ou a chuva”, disse o escritor ao El País

A escolha cuidadosa das palavras talvez seja mais forte do que os ataques abertos ao regime.

Mais contundente, a locutora Laritza Camacho, que foi apresentadora de um programa diurno de televisão, posição que só poderia ocupar se passasse no teste ideológico, escreveu uma carta aberta a Díaz-Canel nos seguintes termos: “Esperei suas desculpas e sua demissão depois de ver o caos e a violência que sua ordem direta provocou nos últimos dias”.

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Ela diz que “teria sido muito bom” se Díaz-Canel tivesse pintado os cabelos grisalhos e se aproximasse incógnito dos “grupos de revolucionários confundidos” – uma das designações dadas pelo regime aos manifestantes – e, depois de “sentir na pele a primeira paulada” da polícia, entendesse o que suas ordens haviam provocado.

Laritza Camacho ressaltou que é filha de revolucionário, teve uma boa impressão do presidente bonitão quando o ouviu anos atrás, não pertence a nenhum grupo dissidente e sequer saiu às ruas no 11 de julho.

Días-Canel deveria tirar pelo menos quinze minutos por dia para conversar com pessoas do povo, sugere ela, “mas não as procure na fila do frango porque só vai ouvir impropérios”.

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A locutora praticamente deu uma aula magna, passando pela economia – “a estrutura fechada de nossas empresas propicia o roubo, a corrupção e a pouca produtividade” – e chegando ao Partido Comunista de Cuba, em cujas fileiras se encontram “muitos militantes sem moral, com pedidos de visto para ir embora do país”, esperando a loteria da emigração.

“O que está acontecendo em Cuba é tão grave quanto sem precedentes”, escreveu Julio César Guanche, professor da Universidade de Havana, posto em que dificilmente seria admitido um “contrarrevolucionário”.

“Não há nada mais revolucionário do que procurar maneiras de resolver conflitos. Não há nada mais revolucionário do que voltar-se para a política quando apenas a guerra civil parece possível”.

São palavras que ganham peso por virem de um simpatizante do regime. Não é o único.

“Precisamos fazer uma análise crítica de nossos problemas para agir e superá-los, e evitar sua repetição”, disse Díaz-Canel na quarta-feira passada, indicando algum tipo de abertura.

Pode ser tarde demais?

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