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Por Vilma Gryzinski
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E se fosse com você? Racismo e assédio têm zonas cinzentas

O sujeito de chapelão aí acima pode ate empurrar Donald Trump para queda, uma das muitas consequências da onda de denúncias de comportamentos tortos

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 30 jul 2020, 20h41 - Publicado em 11 nov 2017, 14h29

O que é certo e o que é errado sempre parecem óbvio – mas nem sempre o são.  Expulsar diretores, substituir atores em filmes já rodados ou derrubar jornalistas são castigos evidentemente merecidos em certos casos, exagerados em outros ou simplesmente abusivos.

O caso de Roy Moore, candidato a senador pelo Alabama,  é um dos mais interessantes. O juiz do Alabama que parece uma paródia do americano conservador, evangélico e durão, pode até acabar com a maioria republicana no Senado.

Seria um empurrão a mais para o sonho da oposição: conseguir a abertura de um processo de impeachment contra Donald Trump. Atualmente, os republicanos têm uma maioria precária  no  Senado: 52 em 100, mas na verdade o número é o da boa ideia , 51, uma vez que John McCain vota habitualmente contra projetos de Trump.

Moore ganhou a candidatura numa eleição complementar para ocupar o lugar deixado por Jeff Sessions, que renunciou ao Senado para ser o equivalente a ministro da Justiça de Trump.

Ajudado por Steve Bannon, que gosta de se apresentar como o gênio que elegeu Trump e voltou a fazer magia negra na sua guerra particular contra figuras mais maleáveis do establishment republicano, ele ganhou a candidatura em eleições primárias.

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Parecia garantido: o Alabama não elege um senador democrata desde século passado e o juiz linha dura, que chegou para votar  na única condição aceitável para usar chapéu de cowboy  – estava a cavalo -, tinha uma vantagem de dois dígitos, como dizem os americanos. Até que apareceram as  meninas.

São casos ocorridos há quase 40 anos. Pelo menos quatro mulheres deram entrevistas ao Washington Post mais ou menos na mesma linha. Moore tinha 30 e poucos anos e um pendor por adolescentes. Uma delas, de 14 anos, contou como foi cortejada e acabou ficando só com roupa íntima com ele. Houve carícias.

O establishment republicano passou a tratar Moore como lixo tóxico. Quer que saia da eleição e dê alguma chance de vitória ou, pelo menos, de retidão moral ao partido. Um aliado local de  Moore jogou mais estrume no ventilado ao evocar Maria e José, ela “com uns 14 anos” e ele “um carpinteiro” já trintão. Jesus ajude os políticos de amigos assim.

Abstraindo-se a figura de Roy Moore, que de modo geral está à direita de Gengis Khan, é certo que acontecimentos com mais de quatro décadas, alguns possivelmente falhos como testemunhos, acabem com uma carreira política?

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Fora simpatias ou antipatias políticas, quem tiver uma filha nessa faixa de idade provavelmente vai dizer sim. Outros acharão um absurdo. E muitos ficarão na zona cinzenta: não foi certo, mas não justifica o ostracismo do juiz de chapelão.

Uma conversa particular entre duas pessoas, gravada ao acaso, pode embasar uma acusação de racismo? Não pode, evidentemente. Crime é discriminar ou ofender publicamente, ao vivo ou pelas redes, pessoas de outras raças. Só para lembrar: ninguém é obrigado por lei a gostar de negros, asiáticos, judeus, mulheres, gays e aquelas outras letras todas.

Seria maravilhoso se todos se gostassem e convivessem em harmonia, respeito e igualdade. Mas a realidade é diferente. E complicada.

Uma pesquisa feita pelo Telegraph indica de 20% das mulheres, ou seja, uma em cada cinco, acha que já sofreu assédio sexual no trabalho (já pensaram se esta pesquisa fosse feita aqui?).

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A definição desse tipo de  assédio parece ser de uma clareza absoluta. E todo mundo que já viu (ou viveu) sabe perfeitamente o que é. Na prática, de novo aparecem as zonas cinzentas.

A situação mais palatável: acontece um avanço, o objeto de desejo diz não e o proponente aceita a rejeição sem mágoa ou desejo de vingança. Algumas mulheres acharão graça – e contarão para um bocado de gente, podem apostar.

Outras usarão a proposta para manipular o chefe babão. Todo mundo também vai ficar sabendo, nem que seja só de observar os sorrisinhos mútuos. E umas poucas cederão, esperando privilégios. Todos os demais vão odiar isso.

Intimidação, violência  e uso de força física, como fizeram Harvey Weinstein e Kevin Spacey, são exceção em ambientes de trabalho minimamente regulamentados e merecem punição rigorosa.

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Mas tirar todas as cenas em que o ator aparece num filme já pronto, substituindo-as por outras a serem filmadas,  soa como as infames manipulações de fotos do stalinismo. Não querem o ator, um abusador serial? Que engavetem o filme e assumam o prejuízo.

Um político obscuro, lá do País de Gales, Carl Sargeant, conseguiu fama póstuma ao se suicidar depois de ser afastado por suspeita de mãos bobas. “Por que alguém iria se matar se não tivesse feito nada”, foi o comentário impiedoso que circulou na hashtag metoo, ou “eu também”, com seu arrastão de revoltados, dispostos a fazer justiça com os próprios dedos.

E se Sargeant estivesse na zona cinzenta, uns avanços impróprios, devidamente recusados, nada mais grave do que isso. O que seria justo acontecer com ele?

A regra de ouro, “não faça aos outros o que não quer que façam com você”, que vai dos filósofos da Grécia antiga ao cristianismo, passando por um leque de religiões orientais, tem que ter duas mãos. Punição proporcional aos assediadores e assemelhados, sem caça às bruxas.

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Mulheres fortes sabem como cortar um avanço indesejado – com a óbvia exceção do uso da violência por parte do assediador. Sabem que se subirem ao apartamento de um homem haverá uma sequência previsível de acontecimentos.

Se a intenção é dizer não, melhor nem subir. Não será exatamente uma surpresa se Harry Weinstein colocar uma roupa mais confortável e aparecer de roupão, pedindo uma massagem e outras coisas mais.

Quanto ao juiz Roy Moore, já está frito. Caso deixe Donald Trump em posição mais vulnerável ainda do que a atual por assédios ou comportamento indevido há quase 40 anos, nos cafundós do Alabama, será uma espécie de ironia histórica.

Um político de um estado ali pertinho, Arkansas, quase caiu no abismo por histórias similares, antigas e recentes. Teria sido justo tirar Bill Clinton da presidência por seu  movimentado currículo de infidelidades?

Provavelmente, não, como de fato aconteceu. Pelo menos naquele tempo. Hoje, já estaria pendurado de cabeça para baixo em alguma hashtag.

 

 

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