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Por Vilma Gryzinski
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De quem é Jerusalém? Todas as respostas estão corretas

Esta é uma das muitas complicações sobre a cidade que Trump decidiu reconhecer como a capital de Israel

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 30 jul 2020, 20h39 - Publicado em 6 dez 2017, 13h34

“Se algum dia Jerusalém for nossa, e eu ainda for capaz de fazer alguma coisa a respeito, começaria por limpar tudo. Construiria, em volta dos lugares santos, uma cidade completamente nova, arejada, cômoda e com sistema de esgotos adequado.”

Esta foi uma das declarações mais desprovidas de sentimentalismo já feitas sobre a cidade triplamente santa. Ainda mais considerando-se que quem a escreveu foi Theodor Herzl, o criador do sionismo.

Não que Herzl não tenha sentido o turbilhão emocional que o esmagador peso histórico e religioso da cidade provoca em quem anda pela primeira vez num lugar percorrido, em suas diferentes camadas, pelo profeta Isaías, Jesus e o futuro imperador romano Tito.

Mas Jerusalém era definitivamente uma cidade suja e tomada por mendigos em 1898, a única vez em que Herzl, um cidadão do Império Austro-Húngaro, esteve lá.

Sua missão era estranha: tinha saído de Viena para interceder por um empreendimento judaico junto ao kaiser Guilherme II em visita à Terra Santa. Queria que o imperador alemão pedisse a boa vontade do império otomano, a já decadente potência da qual a a esquálida Palestina fazia parte.

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Não teve sucesso, mas as mudanças históricas que se seguiram foram estonteantes. Muitas têm datas redondas este ano.

Em 1917, os ingleses tomaram Jerusalém aos otomanos e a Declaração Balfour abriu caminho para que mais judeus, inspirados pelos sionismo, procurassem na Palestina o refúgio e a esperança que não tinham na Europa.

Outra guerra mundial, a segunda, abriu caminho para que em 1947 a ONU determinasse a partilha da Palestina. Jerusalém seria um “corpus separatum”, uma entidade à parte que teria uma administração internacional jamais materializada. Árabes e judeus começaram um conflito que viraria guerra no ano seguinte, quando foi criado o Estado de Israel.

A metade oeste, ou ocidental, de Jerusalém veio com a primeira vitória de Israel. A segunda foi na Guerra dos Seis Dias, em 1967, que colocou a cidade inteira, além de territórios que iam da Síria ao Egito, sob controle de Israel.

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Em ambas, Israel esteve à beira do extermínio e pode dizer que agiu em defesa própria. Ao mesmo tempo, tornou-se uma potência de ocupação, com as obrigações que isto implica. Inclusive de não implantar os centros populacionais que circundam toda a cidade santa.

Jerusalém hoje é uma cidade limpa, mantida tão impecavelmente por Israel quanto possível. É também um dos lugares mais nervosos do mundo. O controle policial, a hostilidade mútua, os momentos das orações e os ataques a facadas que furam a segurança de ferro não dão folga.

O apoio entre a população palestina aos atos violentos indica o inconformismo com a perda, na prática, do lugar que consideram, legitimamente, seu.

Os dois lugares santos para os muçulmanos, a mesquita de Al Aqsa e a Cúpula, ou Domo, da Rocha, irradiam a questão de Jerusalém para todo o mundo islâmico.

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A formação rochosa encimada pela cúpula dourada, a imagem mais bela e marcante da cidade, é segundo o Corão o lugar de onde Maomé levitou rumo a uma viagem ao céu numa única e prodigiosa noite do ano 621 da era cristã.

Foi na mesma rocha que, pela narrativa bíblica, o Deus de Israel ordenou a Abrão que sacrificasse o filho Isaac, a prova de obediência cancelada no último minuto como num filme de suspense.

Sobre ela Salomão ergueu o primeiro templo, que durou entre 410 e 470 anos, dependendo das fontes de verificação impossível.

A destruição dos dois templos judaicos – a segunda, mais documentada, no ano 70 – marcou as duas grandes catástrofes sofridas na antiguidade pelo povo judeu, a derrota seguida do cativeiro na Babilônia e a eliminação nacional que não deixou “pedra sobre pedra” durante o domínio romano, levando à dispersão  populacional e ao exílio de quase dois mil anos.

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Este é um rápido resumo da centralidade de Jerusalém para árabes e judeus. E ainda nem entramos no cristianismo, uma vez que a disputa pela cidade durante o meio milênio que decorreu a partir da ascensão e vertiginosa expansão da religião pregada por Maomé foi entre cristãos e muçulmanos.

Para muitos israelenses judeus, o histórico de violência dos palestinos é a prova de que uma cidade dividida num futuro acordo de paz, uma demanda praticamente unânime do resto do mundo, jamais será aceita.

Para muitos palestinos, a ocupação persistente contra todas as resoluções da ONU e a infiltração em cada centímetro de território assimilável são  a prova de que nunca terão a cidade, nem sequer a metade oriental, de volta por meios pacíficos.

Um hábito de muitos judeus quando há acontecimentos importantes é perguntar “Isso é bom para Israel?”.

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Reconhecer Jerusalém como capital é bom para Israel? Certamente haverá uma onda de protestos. Caso se transformem numa nova intifada, com o ciclo de manifestações e repressão infinitamente repetido, haverá pouco de positivo.

É bom para os palestinos? Na prática, não muda nada. Mas aumenta o sentimento de revolta e de falta de saída. O maior perdedor, como sempre, é Mahmoud Abbas, o líder da Autoridade Palestina.

E para os Estados Unidos? Incomodar aliados importantes como o Egito e a Arábia Saudita, justamente num momento em que colaboram sigilosamente com Israel e formam a espinha dorsal  a aliança sunita na qual na qual o governo Trump parece apostar, é ruim.

Todos os líderes mais diretamente envolvidos estão vivendo momentos de fragilidade ou instabilidade política. Abbas, Benjamin Netanyahu, o príncipe herdeiro saudita, o presidente egípcio e o próprio Donald Trump, mordido pela investigação sobre conexões russas.

A grande pergunta é se Trump tem um plano para depois do reconhecimento. Dar um prêmio sem pedir nada em troca, como significa para Israel o reconhecimento de Jerusalém, é contra os fundamentos mais elementares da arte da negociação, o ramo em que o presidente se orgulha de ser mestre.

Levar o ônus, sob a forma de hostilidade e até de violência contra cidadãos e instituições americanas, sem ter um bônus vai ser o oposto de uma jogada de mestre.

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