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Por Vilma Gryzinski
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As três pragas dos vice-presidentes: existir, falar, sobreviver

Feitos para não aparecer, exceto "naqueles" casos, os vices sempre causam encrenca quando saem das sombras às quais são condenados

Por Vilma Gryzinski 12 fev 2019, 16h21

“O homem que tem o melhor emprego do país é o vice-presidente. Só o que tem a fazer é levantar todas as manhãs e perguntar: ‘Como está o presidente’.”

A piadinha já entra na categoria de antiguidades. Era feita por Will Rogers, cômico americano do começo do século 20.

Desde então, o humor mudou muito e a situação única dos vice-presidentes atingiu tamanhas proporções que passou a ocupar um lugar especial no imaginário dos Estados Unidos.

O número de filmes e séries em que os vices são personagens importantes é estarrecedor. Geralmente, eles ocupam duas categorias.

São uns crápulas, vendidos, traidores, tentando derrubar um presidente nobre e pacifista. Ou são negros, mulheres, gays, judeus ou alguma outra minoria (quando não uma mistura de várias) que, pelas artes do destino e dos roteiros, acabam sentados naquela mesa famosa do Salão Oval.

Esqueçam o filme Vice, um pastiche que traça um retrato tão tosco de Dick Cheney que conseguiu o prodígio de ser ridicularizado pela direita e pela esquerda nos Estados Unidos (“Uma das mais cansativas e frustrantes experiências do ano”, segundo o nada conservador Daily Beast).

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O Dick Cheney real foi muito mais interessante. E tão poderoso, tanto de fato quanto nos exageros da imprensa, que George W. Bush – pintado no filme como um cretino terminal, um clichê de roteiristas vindos do mundo do humorismo – pensou em não convidá-lo para a chapa na segunda eleição.

Como um dos propulsores da invasão do Iraque em 2003, até hoje ele fez tudo, menos autocrítica com sua voz de Darth Vader, perfeitamente emulada por Christian Bale no filme.

Reconhecer as premissas enganosas (“Seremos recebidos como libertadores”) e as consequências desastrosas seria demais para um homem que se orgulha incondicionalmente de ter participado do governo Bush.

“Inclusive das coisas mais controvertidas que fizemos, pelas quais somos criticados, como o programa de vigilância eletrônica dos terroristas e as técnicas de interrogatório enfatizadas, coisas que nos permitiram salvar vidas”.

Uma argumentação obviamente similar à usada por governos, democráticos ou ditatoriais, para justificar medidas emergenciais e excepcionais que podem ser discutidas até o Juízo Final sem uma conclusão entre as partes.

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TRAUMA DE VICE

Segundo a “escola Michael Moore” de pensamento político – tradução: bobagens sobre delírios, com alguns bons argumentos no meio -, os Estados Unidos invadiram o Iraque para roubar o petróleo. E Cheney só estava interessado em favorecer a Halliburton, a gigante de equipamentos e serviços petrolíferos da qual havia sido CEO.

A Halliburton, através da subsidiária KBR, realmente conseguiu uns contratos bacanas, em especial de abastecimento da insaciável máquina militar no Iraque.

A importação de petróleo – a preço de mercado, obviamente – chegou a míseros 11 700 barris por mês no ano passado. A KBR foi vendida pela Halliburton em 2007. Os processos por superfaturamento jamais resvalaram em Dick Cheney, um dos políticos mais odiados e investigados pela imprensa – antes do advento de Donald Trump, claro.

Com todo seu perfil de vilão assumido e desafiador, Cheney nunca chegou nem perto de Spiro Agnew, o vice de Richard Nixon que chegou a receber um suborno de 10 mil dólares, em dinheiro, em pleno exercício do cargo.

Filho de um imigrante grego (sobrenome original: Anagnostopoulos), ex-governador de Maryland, inimigo estridente da imprensa liberal, Agnew foi ofuscado pelo escândalo Watergate, mas deixou o cargo com o rótulo de pior vice-presidente de todos os tempos.

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Para não ser processado por corrupção, fez um acordo reconhecendo um crime menor, por não ter declarado uma devolução do imposto de renda. Renunciou no dia 10 de outubro de 1973, quando o governo Nixon já fazia água.

Mesmo assim, outros processos correram e ele foi condenado a pagar uma devolução ao erário, com multa, de mais de 200 mil dólares.

A história política americana tem “trauma de vice” desde o famoso duelo de 1804 em que morreu Alexander Hamilton, um dos mais celebrados Pais da Pátria.

Inimigo político de Hamilton, Aaron Burr, vice-presidente de ninguém menos que Thomas Jefferson, sentiu-se altamente ofendido com a maneira como havia sido tratado por ele num jantar em Nova York, segundo fofoca publicada por um jornal.

Sem retratação, exigiu um duelo, irrecusável pelo código de honra da época. Hamilton morreu, depois de horas de agonia, com a bala que entrou pela barriga, ricocheteou na costela e produziu um estrago considerável em órgãos vitais antes de parar pouco acima da primeira vértebra lombar.

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Outra bala de trajetória peculiar entrou pelas costas de John Kennedy, saiu pela garganta, passou pelo peito e o punho de John Connally, o governador do Texas que o acompanhava na fatídica recepção em conversível em Dallas. Só parou na coxa de Connally, sendo encontrada na maca que o levou ao hospital.

A “bala mágica” – que não foi o tiro fatal na cabeça do presidente – tornou-se um dos inúmeros componentes espetacularmente suspeitos do assassinato.

ASTROLOGIA ESOTÉRICA

Jacqueline Kennedy sempre achou, contra a lógica elementar, que o crime havia sido encomendado por Lyndon Johnson, o vice que tomou posse como presidente no avião que levava o corpo de Kennedy enquanto ela ainda vestia o tailleur cor-de-rosa manchado de sangue do marido.

A figura do vice vilão tomou força no imaginário americano depois de Johnson, um democrata durão que enfrentou a explosão de protestos contra a guerra do Vietnã.
Poucas escolhas de vice foram tão desastrosas para um país quanto a da ex-dançarina de boate Isabelita Perón. Promovida a esposa durante o longo exílio de Juan Perón, ela entrou na chapa do marido agradecido e triunfalmente reeleito em 1973.

Também pode ser discutido até o Juízo Final se a Argentina cairia nas trevas da ditadura militar se Perón não tivesse morrido em 1974, considerando-se que a eterna briga entre peronistas de direita e peronistas de esquerda, entre outros fatores, já empurrava o país para o buraco.

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Mas poucas vezes na história mundial houve alguém tão surrealmente incompetente quanto Isabelita, assessorada por José López Rega, El Brujo, autor do livro Astrologia Esotérica e eminência parda do outono do patriarca populista.

Reportar intrigas reais ou imaginárias entre o presidente e seu vice é um clássico dos fofoqueiros políticos e da imprensa sempre louca por uma novidade.

Tentaram fazer isso com Mike Pence, o vice que foi fiador da pureza ideológica de Donald Trump junto ao eleitorado evangélico.

Por incrível que pareça, o altamente impuro Trump está mantendo à risca as promessas mais importantes.

Só para lembrar: Trump era um candidato totalmente desacreditado com dificuldade para encontrar qualquer político “sério” para compor a sua chapa.

Os americanos antitrumpistas que apostam tudo no impeachment do presidente sonham também com um “serviço completo”: alguma coisa que invalidaria a chapa Trump-Pence, ainda mais agora que a democrata Nancy Pelosi voltou a ser presidente da Câmara.

A ideia de ter um evangélico puro sangue no comando da Casa Branca apavora o pessoal.

O leitor pode substituir o “evangélico” para fazer todas as ilações que quiser.

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