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Argentina: pandemia, inflação e mau comportamento? Pau no governo

Eleitores não estão para atitudes impróprias de seus governantes, como mostram as eleições primárias que massacraram Fernández e Cristina

Por Vilma Gryzinski 14 set 2021, 07h38

Cristina Kirchner está injuriada e quer a cabeça do ministro da Economia, Martín Guzmán. É típico dos momentos de crise empurrar a culpa para os outros – e a crise interna no peronismo está fervendo.

Terremoto, cataclisma e catástrofe foram algumas das metáforas usadas para qualificar o que significa para o governo argentino o resultado das eleições primárias para o Congresso.

Das 24 províncias argentinas, os candidatos apresentados pela Frente de Todos, representante do peronismo unido, perderam em nada menos do que 18. Em termos nacionais, o governo perdeu por nove pontos.

Nem as pesquisas de opinião detectaram o estonteante resultado das PASO (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias, um sistema vigente desde 2009). Ao contrário, um instituto usado pelo governo errou por nada menos do que quinze pontos.

“Alguma coisa fizemos de errado”, engoliu o presidente Alberto Fernández, uma decepção até para os que nunca acreditaram que seria a cara do peronismo civilizado e livre de escândalos, catapultado para a Casa Rosada pela própria  Cristina como figura menos desagregadora do que ela.

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A questão para Fernández não é o que não fez certo, mas como conseguiu fazer tudo errado.

No manejo da economia, não é exatamente uma surpresa que tenha seguido o modelo do peronismo de esquerda, com seus conhecidos vícios: hostilidade aos credores internacionais, impressão de dinheiro (e a consequente e devastadora inflação), controle cambial, tarifas congeladas, intervenção drástica na mais renomada exportação argentina – 50% da produção pecuária ficam obrigatoriamente no país, para produzir a ilusão da carne barata e entregar de bandeja à concorrência fatias do mercado internacional.

Tão ruim, ou pior, foram dois escândalos devastadores para a imagem de cordura e correção que Alberto Fernández tentou vender. 

Um foi o da “vacinação VIP”, o fura-fila que beneficiou políticos e amigos do poder, organizado a partir do próprio Ministério da Saúde.

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Outro foi o entra e sai na residência presidencial de Olivos, culminando com uma festa de aniversário da mulher do presidente Fabíola Yañez que desrespeitou todas as duras regras a que os argentinos comuns estavam obrigados durante a “quareterna”, o prolongado confinamento que não conseguiu controlar a pandemia nem muito menos manter a vitalidade econômica.

A festa foi no ano passado, mas as evidências, incluindo fotos que mostram um grupo de amigos reunidos à mesa sem medo de serem felizes – e sem máscaras nem distanciamento físico -, só vieram à tona recentemente. 

Foi um desastre para a imagem de Fernández, que primeiro tentou dizer que as fotos eram fake news e depois se desculpou sem nenhum entusiasmo, tentando nada cavalheirescamente empurrar o abacaxi para a própria mulher.

“Enquanto você festejava, meu filho morria com apenas 42 anos”, escreveu um eleitor numa mensagem anônima colocada no envelope destinado ao voto.

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A lição deixada pelos eleitores argentinos é cristalina: quando a economia vai mal, a pandemia demora a ser controlada e os governantes têm mau comportamento, o recado das urnas é cruel.

O repúdio ao governo foi tal que os eleitores perdoaram até o partido do ex-presidente Mauricio Macri, que deixou a Casa Rosada rubro de vergonha por não conseguir dominar o descalabro econômico que só piorou com a pandemia.

A acachapante derrota peronista beneficiou também um candidato novo, tipo rejeição a “tudo o que está aí”, o libertário e mediático Javier Milei, um economista bom de briga cujo partido criado do nada teve mais de 13% dos votos, tornando-o o terceiro candidato mais votado da cidade de Buenos Aires (“Não vim aqui para guiar cordeiros, vim para despertar leões”, comemorou ele, numa típica figura de linguagem). 

Se os resultados das primárias se refletirem nas eleições, o governo vai perder a maioria no Senado, presidido pela vice, Cristina, e administrado “como se fosse um de seus hotéis”, na definição acerba de um editorialista do La Nación. 

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Sem o Senado, torna-se impossível governar com a caneta, inclusive com as profundas intervenções no Judiciário introduzidas com o objetivo específico de beneficiar Cristina, enrolada numa série de processos por corrupção e crimes correlatos.

É claro que a derrota também aumenta os conflitos internos na Frente de Todos e deixa a ala de Cristina Kirchner mais insatisfeita ainda com Alberto Fernández. 

A cabeça do ministro da Economia é o mínimo que o cristinistas querem. O presidente deu provas públicas de apoio a Guzmán, o que provavelmente diminui as perspectivas de sobrevivência do jovem ministro que é professor em Columbia e muito próximo de Joseph Stiglitz.

Esquerdismo acadêmico é uma coisa, na vida real – ou surreal,  como na Argentina – é bem diferente. 

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Mudança de ministério, obviamente, só serve para dar vazão ao ritual do bode expiatório.

O problema que a Argentina compartilha com o Brasil é sistêmico e uma nova camada de maquiagem não muda nada. 

Muito longe de ter entrado no descalabro econômico argentino, pelo menos por enquanto, o Brasil não pode deixar de olhar para seu grande vizinho do sul e ler a mensagem que o eleitorado escreveu nas urnas.

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