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O lirismo denso de Wells Tower

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Por Rodrigo Levino
Atualizado em 13 ago 2018, 22h04 - Publicado em 20 ago 2011, 10h14

Em 2010, a revista The New Yorker publicou, como faz a cada dez anos, a lista de 20 autores com menos de 40 anos de idade considerados os mais promissores de sua geração. Antes de ser uma sentença definitiva, a lista é uma bússola eficaz. Um dos seus pontos cardeais é Wells Tower, de 37 anos, que teve o seu primeiro livro lançado no Brasil esta semana.

Tudo Destruído, Tudo Queimado (tradução de Adriana Lisboa, Rocco, 280 páginas, 34,90 reais) faz jus ao lugar conferido a Tower na lista, que é feita em segredo e causa frisson no mercado editorial americano. Os nove contos que compõem o livro estão calcados em dois pilares: de um lado, a objetividade e a renovação dos grandes contistas americanos, vista em gente como John Cheever e Raymond Carver; de outro, a dedicação aos personagens infortunados.

Nascido em Vancouver, no Canadá, e criado na Carolina do Norte, Tower passou a adolescência e o início da juventude metido com bandas de rock e fanzines, lendo autores não muito distantes de sua geração, como o britânico David Mitchell, e apurando o humor denso (não sem lirismo) que marca as suas narrativas e seu olhar sobre relações marcadas por disputas, traições, solidão e azar.

Do rock, pode-se dizer que o autor trouxe para os seus contos a secura das palavras; tem estilo bastante econômico. Fosse música, não passaria de três acordes. De autores como Cheever e Carver, a quem já foi comparado embora recuse de pronto, a maneira como descreve as tensões quase sempre nascidas em situações cotidianas e sem grande importância, que vão se acumulando como uma comédia de erros em que cada solução se mostra ainda mais desastrosa que o problema que a motivou.

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Há o viking que observa com resignação e tédio a aldeia que vai saquear (é o conto que dá nome ao livro) e violar seus habitantes; os irmãos que se reencontram depois de décadas para uma caçada em que a mira das armas parece estar apontada para os dois, tamanha a tensão nas discussões; passando pela adolescente que tem o sonho de ser livre das regras familiares destruído por uma imensa pia de pratos sujos que tem de lavar; e a criança do conto O Leopardo, incansável na tentativa de convencer os pais de que não deve ir à escola naquele dia por haver um animal selvagem rondando a casa.

Tower vai desfiando a sua verve ao enredar personagens e histórias que despertam no leitor a reação próxima do riso nervoso. É bem humorado, mas também é trágico. A criança é lúdica, mas tem de lidar com os maus tratos do padrasto. Os irmãos têm entre si a barreira intransponível da desconfiança que o parentesco torna ainda mais cruel. Ser irmão, nesse caso, é o pior que lhes poderia ter acontecido. E sobre a adolescente repousa a marca de um país que já foi, como dito em Sem Destino, filme de Dennis Hopper, um bom lugar para viver, mas as sucessivas guerras em que entrou e as crises econômicas que enfrentou têm reduzido os sonhos da maior parte dos americanos a, como no conto, uma imensa pia de pratos sujos.

Formado em antropologia e sociologia, com mestrado em literatura pela Universidade de Colúmbia, o autor tem por marca principal a observação perspicaz do fim (mais um) do sonho americano. Para tanto, abre mão de ideologias políticas (não é militante como Johnatan Safran Foer, seu contemporâneo) e concentra o foco nas relações comezinhas.

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Para efeito de comparação, o que consagrou John Cheever nos anos 1950 foi o talento em perceber os dilemas de uma parcela da sociedade americana nascida no pós-guerra e sem muito talento para lidar com a cobrança que a abundância do período trazia sobre suas vidas. Era a obrigação de vencer e de dar certo que movia seus personagens. Tower estuda outra face: a da precariedade pura e simples. A única coisa a que seus personagens parecem obrigados a conseguir é um pouco de paz.

Em 2009, indagado pelo jornal americano The New York Times sobre o porquê de tanto realismo nos seus contos, o escritor foi incisivo. “Nada pode ser mais estranho do que a vida americana.” Oito dos nove contos de Tudo Destruído, Tudo Queimado são uma prova disso. E Tower, um bom retratista dessa época de crise e ambições limitadas.

 

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