Para a família Bolsonaro, não há separação na política
À medida que o caso Flávio Bolsonaro avança surge a pergunta: qual será o estrago político se o filho 01 vier a ser condenado antes de 2022?
Não há separação de corpos na família Bolsonaro. O ex-assessor Fabrício Queiroz era inicialmente ajudante do pai, depois foi trabalhar para o filho. Está ligado ao clã bolsonarista há décadas. O que havia no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro pode ser uma mistura de hábitos nos escritórios políticos da família, tanto que a filha do Queiroz estava lotada na representação do então deputado federal Jair Bolsonaro. Isso posto, o que acontecer com um afeta a todos, para o bem ou para o mal.
Desde a prisão de Queiroz, os ministros palacianos tentam afastar o presidente do caso. A estratégia inicial foi a de tirar o advogado Frederick Wassef, dono da casa onde o Queiroz foi preso, dos processos do filho 01. Mas retirá-lo de tal forma a não desmoralizá-lo, nem irritá-lo. O temor é de que ele faça revelações – leia a entrevista que o advogado deu, publicada na última edição de VEJA.
Além disso, é como se Frederick Wassef nunca tivesse sido também advogado de Bolsonaro. E foi. O próprio presidente disse isso para explicar a presença assídua do advogado nos palácios do Planalto e do Alvorada.
Fato é que, independentemente da narrativa construída, Bolsonaro já sentiu o golpe, tanto que mudou o comportamento, como informado pela coluna recentemente. Ele reduziu a beligerância e defende agora o entendimento entre os poderes. Também não tem dado seus gritos matinais no cercadinho do Alvorada, como o famoso “acabou, po**a”.
A ida do Ministério Público do Rio de Janeiro ao Supremo Tribunal Federal, com o intuito de puxar o caso de Flávio Bolsonaro de volta para a primeira instância, é mais uma parte do cerco ao presidente. Há ainda o inquérito da Polícia Federal sobre a tentativa de interferência política no órgão, e as investigações das fake news e das manifestações anti-democráticas. As duas últimas atingem muitos aliados políticos que atuam no parlamento, nas redes sociais e nas ruas.
Sem dúvida alguma, o processo mais perigoso, contudo, é o que avança sobre o Flávio. A decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que transferiu o caso para a segunda instância, deu uma trégua. Mas para se ter uma ideia da importância de Queiroz, basta ver essa mudança de tom do presidente desde a prisão do ex-assessor.
No Palácio do Planalto é repetido o mantra de que, se houve rachadinha – método ilegal que se apropria do salário dos funcionários -, isso também ocorreu em outros gabinetes de deputados estaduais da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Na visão do governo, eles estariam sendo poupados.
A narrativa não é um bom argumento – sempre foi a desculpa daqueles que cometeram ilícitos. Já vimos esse filme antes em Brasília. Nos bastidores, lideranças do PT diziam, no escândalo do mensalão, que a compra de apoio no parlamento havia sido feita em outros governos.
Adotar um comportamento apenas porque “todos fazem” não é uma explicação razoável para quem se autopromoveu como implacável contra o crime. Enquanto as contradições do discurso da família Bolsonaro ficam mais aparentes, a situação do senador Flávio Bolsonaro permanece complicada.
O TJ-RJ contrariou a jurisprudência do Supremo quando tirou o assunto da primeira instância, e do juiz natural do caso, mas ao mesmo tempo não concedeu a Flávio Bolsonaro o que sua defesa mais queria: a anulação de todas as provas coletadas na investigação. Enquanto o MP do Rio prepara o contra-ataque, a vitória parcial do clã soluciona alguns, mas não todos problemas. Fica o principal: qual será o estrago político caso Flávio Bolsonaro venha a ser condenado antes de 2022? Essa é a questão que ronda o Palácio do Planalto.