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O custo e a qualidade da assistência em oncologia

Um sistema de alta qualidade para pacientes com câncer deve ser acessível, centrado no paciente e baseado em evidências científicas e medidas de qualidade

Por Luiz Paulo Kowalski
Atualizado em 18 out 2017, 12h00 - Publicado em 18 out 2017, 12h00

Foi Martin Luther King Jr. quem afirmou que “de todas as formas de desigualdade, a injustiça no cuidado à saúde é a mais chocante e desumana”. Políticos em campanha costumam lembrar muito desse assunto e até convencem seus eleitores.
Lembram o que disse Hillary Clinton durante a última campanha presidencial norte-americana? Ela afirmou que lutaria para que “todos os americanos tivessem acesso aos cuidados de saúde a um custo aceitável, de qualidade, independentemente de seu endereço e renda. Assistência à saúde deveria ser um direito, não um privilégio”.

O direito à saúde no Brasil

No Brasil, esse direito consta em nossa Constituição. No entanto, existe um notável descompasso entre a pressão da população por uma melhor assistência médica e a capacidade dos sistemas de saúde em se adaptar e incorporar novas e eficientes tecnologias. A resposta para essa questão está na incorporação da qualidade na assistência. Como afirma Porter na obra Redefining Health Care (Redefinindo os Cuidados em Saúde, em tradução livre para o português), a tecnologia médica moderna é ofertada por estruturas organizacionais, práticas de gerenciamento e modelos de precificação do século XIX. Ou adquire-se eficiência, ou o sistema colapsa.

O que é qualidade na saúde?

Nesse sentido, de acordo com a Agência de Pesquisa e Qualidade em Saúde dos Estados Unidos (Agency for Healthcare research and Quality), qualidade é fazer coisas certas, no tempo certo, do modo certo, para a pessoa certa e obter os melhores resultados possíveis. Melhor resultado não é garantia de sucesso, é garantia de que o melhor foi feito dentro do estado atual de conhecimento.

Por sua vez, o também norte americano Instituto de Medicina (Institute of Medicine) define qualidade como o grau em que os serviços de saúde para indivíduos e populações aumentam a chance de se obter desfechos desejados e consistentes com o conhecimento profissional atual. Aqui também se entende como o melhor possível. Não há milagres esperados. Também não se espera que o médico seja o único responsável.

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O mesmo Instituto de Medicina, em 2001, publicou o livro Crossing the Quality Chasm (Cruzando o abismo da qualidade, em tradução livre para o português) visando melhora na qualidade da assistência, baseada em liderança. Nele são descritas seis medidas que devem ser buscadas:

  1. efetividade, isto é prover serviços baseados em conhecimento científico a todos aqueles que possam ser beneficiados, mas evitando prover estes mesmos serviços a aqueles que não sejam potenciais bons candidatos;
  2. segurança, buscando evitar danos em pacientes em que o cuidado tenta ajudar;
  3. assistência centrada no paciente, provendo cuidado com respeito e responsabilidade levando em conta suas necessidades, preferências e valores;
  4. tratamento realizado em tempo adequado, reduzindo esperas e atrasos potencialmente perigosos para os pacientes;
  5. eficiência, evitando desperdícios de equipamentos, suprimentos, ideias e energia;
  6. equanimidade, provendo cuidado que não varie em qualidade devido características como gênero, etnia, local de moradia ou condição socioeconômica.

Premissas de um sistema de alta qualidade

Para o Instituto de Medicina, um sistema de alta qualidade para tratamento de pacientes com câncer deve ser acessível e centrado no paciente, ter uma grande interação médico-paciente, ter o suporte de uma equipe multiprofissional e ser baseado em evidências científicas, medidas de qualidade (incluindo resultados e custos do tratamento), medidas contínuas de melhoria e uso de sistemas informatizados. É fundamental que instituições de saúde computem todos os dados, analisem e melhorem suas práticas, divulguem seus resultados e estejam abertas a trocas de experiências e conhecimento que possam aprimorar o sistema em benefício dos pacientes e da sociedade.

Hoje, clínicas e hospitais buscam melhorias adaptando-se a uma série de recomendações de certificações nacionais e internacionais, que são fundamentalmente baseadas em critérios de qualidade e segurança; cuidado humanizado; assistência e assim por diante. Por outro lado, os médicos buscam especialização, título de especialista e participação em programas de educação médica continuada.

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O conceito de Cancer Center na oncologia

Especificamente em oncologia, o conceito de Cancer Center, que no início era basicamente focado em oferecer cuidados oncológicos simultaneamente e não de maneira seriada como era a prática até o final do século XX,  foi ampliado, e o  Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos (National Cancer Institute), define um “Comprehensive Cancer Center”, como uma instituição que presta cuidados diretos de saúde a pacientes oncológicos, mas também realiza pesquisa básica e clínica, participa de programas de controle da doença e de educação para a população.

Não existem dois pacientes iguais, mas todos desejam e devem receber a melhor assistência multiprofissional com o objetivo de ter a melhor chance de cura e de reabilitação. Não basta seguir uma receita de bolo, como um “guideline” (recomendações baseadas em consenso formulado por grupos multidisciplinares baseados nas melhores evidências científicas disponíveis). É preciso que o paciente seja cuidadosamente avaliado por uma equipe multiprofissional que saiba aplicar o conhecimento baseado em evidências de forma integrada.

Vários estudos mostram que a discussão de casos em um “Tumor Board”, reuniões com equipes multidisciplinares, melhora a qualidade e os resultados da assistência. Hoje, o médico não pode trabalhar isoladamente. Não há como oferecer assistência oncológica de qualidade sem um alto grau de organização, sem experiência e recursos adequados.

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Diversas sociedades médicas da área oncológica têm proposto uma série de iniciativas de qualidade da assistência. Cada vez mais se utilizam “guidelines”) e “pathways” (planos multidisciplinares de cuidado, específicos para grupos de pacientes, onde diferentes atribuições e atividades dos vários profissionais são minuciosamente descritas).

Elas têm sido sistematicamente utilizadas em instituições especializadas demonstrando maior adesão às diversas etapas do tratamento, menos complicações de todas as formas de tratamento (fundamentalmente cirurgia, radioterapia, quimioterapia, imunoterapia) e melhores resultados de sobrevida em longo prazo. Resultados de tratamento são melhores nesses ambientes, principalmente quando um alto volume de pacientes é tratado nesses centros. A utilização dessas ferramentas associa-se a melhores resultados funcionais, menos complicações, menos desperdício, menor custo do tratamento e melhora da satisfação dos pacientes.

Toda esta área do conhecimento necessita de ampliação. O médico que outrora se dedicava à assistência, ensino e pesquisa, hoje precisa – além dessas habilidades – também pensar em gestão. Precisa haver uma forte aliança entre a gestão hospitalar, gestão pública e as equipes multidisciplinares para que a melhor assistência oncológica seja prestada a um custo aceitável para o maior número possível de pacientes. De outro modo, os poucos pacientes que podem pagar pela assistência, poderão não ter como fazê-lo no futuro. Tanto os planos privados de saúde quanto o sistema público terão sérias dificuldades para absorver os custos crescentes.

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É preciso, cada dia mais, ter consciência de que exames diagnósticos e tratamentos onerosos podem não ser necessários e muitos não são necessariamente os melhores.

Finalizando, Joham W. Von Goethe disse que “conhecer não é suficiente, nós devemos aplicar. Querer não é suficiente, nós devemos fazer”. Assim, todo o conhecimento médico na área de oncologia caminha muito rapidamente e existem diversas dificuldades em aplicar por não dispormos imediatamente de todos os medicamentos, de todos os equipamentos e de todos os recursos.

Mas não basta querer o melhor, a medicina exige parcimônia e um juízo crítico baseado em evidência, experiência, bom senso e seriedade.

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(Edson Lopes Jr./VEJA.com)

 

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