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“Farinha pouca? Meu pirão primeiro”

O Brasil está próximo de concluir uma nova etapa da imunização, a de vacinar portadores de comorbidades, mas o programa tem problemas a serem avaliados

Por João Fernando Monteiro Ferreira
3 Maio 2021, 13h19

“Farinha pouca? Meu pirão primeiro”. O dito popular reflete o que está acontecendo em vários cantos do planeta: com a demanda por vacinas contra o novo coronavírus muito superior à oferta, a escassez somada à urgência da situação faz várias categorias exercerem um verdadeiro cabo de guerra, cada uma buscando legitimar a importância de vacinarem seus profissionais: professores, policiais, motoristas de transporte público… e todos têm um bom motivo para pleitearem a antecipação da agenda.

Associações médicas, por sua vez, como nós da SOCESP (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo), levantamos a bandeira em prol da imunização dos pacientes com doenças cardiovasculares (DCVs) crônicas. A razão é simples: de acordo com estudos, as comorbidades relacionadas a maior chance de pior prognóstico e mortalidade pela CO VID-19 são: neoplasias sólidas metastáticas e hematológicas, doenças cardiovasculares (cardiomiopatias, insuficiência cardíaca, doença arterial coronariana crônica), doenças cerebrovasculares, doenças renais crônicas, doença pulmonar obstrutiva crônica, diabetes e obesidade.

A combinação destas patologias eleva ainda mais a chance de internação e óbito. Estudos mostram que cardiopatas, por exemplo, têm 10,5% mais chances de morte por insuficiência cardíaca na progressão da infecção, enquanto na população em geral a incidência é de 2,3%. Entre os hospitalizados, cerca de 50% apresentaram doenças crônicas sendo que 40% destas eram cardiovasculares.

O Plano Nacional de Imunização (PNI) para COVID-19, do Governo Federal, definiu quais seriam os primeiros grupos a receberem a vacina, dando prioridade aos trabalhadores da saúde, indivíduos com maior chance de desenvolver formas graves (idade superior a 60 anos e presença de comorbidades) e aqueles que trabalham em serviços essenciais. Povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas, além de pacientes internados com mais de 60 anos, também foram contemplados nesta primeira fase.

Agora o Brasil está próximo de concluir esta etapa da vacinação e podemos dizer que a estratégia foi acertada. Até o momento.

Próximos passos
Para a nova fase de vacinação, a orientação do PNI é que cidadãos entre 18 e 59 anos, portadores de comorbidades sejam os próximos a receber o imunizante. Estima-se que aproximadamente 17,7 milhões de pessoas se enquadrem. Mas, para contemplar toda esta camada, considerando as duas doses por pessoa, serão necessárias mais de 35 milhões de doses, o que não parece viável a curto prazo.

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Outro problema é que o programa não especifica os critérios que devem ser adotados para a imunização desta população, cujo risco é heterogêneo. Além disso, governadores e prefeitos têm autonomia para definir prioridades, abrindo precedentes para que aqueles com menor risco de complicações e mortalidade – como profissionais de categorias consideradas essenciais – sejam escolhidos e recebam a vacina antes de portadores de comorbidades cardiovasculares, por exemplo, o que seria um grande equívoco.

Dessa forma, é importante que o PNI utilize critérios técnicos, do ponto de vista médico, para direcionar as doses a quem realmente apresenta maior risco de internação e morte, especificando claramente as diretrizes para hierarquização das comorbidades e também sobre a maneira de comprovação de tais patologias.

Fechando o cerco
Na última Atualização da Diretriz de Prevenção Cardiovascular está especificado que, na maioria das situações clínicas, a vacinação é identificada como ação de prevenção primária. No caso dos cardiopatas, geralmente é considerada prevenção secundária para combater descompensações, que agravam a as DCVs pré-existentes.

Por isso, a SOCESP defende a criação de uma logística diferenciada de vacinação contra outras doenças já a partir deste ano. Em documento denominado Plano de Ação e Estratégias para Prevenção da Mortalidade por DCNT/DANT no período de 2021-2030, encaminhado ao Ministério da Saúde, a entidade solicitou ampliação e mudança do calendário de vacinas como forma de proteger pacientes com cardiopatias contra viroses que podem impactar o coração. As propostas contemplam incluir portadores de diabetes e DCVs entre aqueles que devem receber imunização para gripe influenza (H1N1).

Isso porque, no caso da vacinação contra H1N1, portadores de comorbidades, no calendário do Ministério da Saúde, estão alocados apenas na terceira etapa da campanha, a partir de 9 de junho, após a imunização de crianças de 6 meses a 6 anos, gestantes, povos indígenas e professores, além de outros grupos. Porém, relatos históricos relacionam a relação sazonal entre epidemias de influenza e maior incidência de mortes em idosos e pacientes com Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Em contrapartida, estudos comprovaram os benefícios da vacinação para combater as infecções neste público, com marcada redução nos desfechos de mortalidade geral, internações hospitalares, taxas de infarto do miocárdio e de Acidentes Vascular Cerebral (AVC).

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Entram neste ranking das vacinas importantes para evitar complicações em pacientes com comorbidades, a vacina contra o pneumococo, a Pneumo 23, indicada aos maiores de 60 anos e àqueles com condições clínicas de risco para pneumonia, incluindo portadores das DCNTs; a vacina contra Hepatite B, para a qual são recomendadas três doses nos pacientes até os 49 anos de idade, na dependência da situação vacinal prévia; a tríplice viral, com limite de idade em 49 anos e a DT (Difteria e Tétano) uma vez que idosos e cardiopatas são susceptíveis a quedas e ferimentos.

A repaginação técnica das campanhas de vacinação – seja contra a COVID-19 ou outros agentes – somada ao distanciamento social e às medidas de proteção individual, tendem a reduzir as taxas de infecção, diminuindo a ocorrência de complicações que impactam tanto o sistema de saúde como a vida das pessoas.

Artigo escrito em colaboração com Eduardo Palmegiani, presidente da Regional de São José do Rio Preto da SOCESP

Letra de Médico - João Fernando Monteiro Ferreira
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