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Estudo afirma: uso de maconha por adolescentes aumenta risco de psicose

Estudos mostram que pessoas propensas a problemas mentais geralmente são mais atraídas por entorpecentes

Por Ronaldo Laranjeira
11 out 2018, 14h53

Um estudo conduzido pela pesquisadora Patricia Conrod, professora de psiquiatria da Universidade de Montreal, no Canadá, chegou a uma conclusão preocupante: o uso de maconha por adolescentes aumenta diretamente o risco de desenvolvimento de psicose. O estudo foi publicado no início do mês de junho, pelo respeitado jornal JAMA Psychiatry.   

O levantamento contou com a participação de 3.720 adolescentes da área metropolitana de Montreal que, por 4 anos, responderam a uma pesquisa anual e sigilosa via internet, na qual relatavam o uso ou não de cannabis e sintomas de psicose. O número representa 76% dos alunos da 7ª série que frequentam 31 escolas secundárias na região.  A pesquisa foi dividida em quatro períodos, com intervalo de 12 meses entre eles. No primeiro, os participantes tinham uma média de idade de 12,8 anos.

O resultado? Em todos os períodos foram identificadas, em níveis estatísticos relevantes, associações positivas entre o uso de maconha e sintomas de psicose, relatados um ano após o consumo da droga. Além disso, 86,7% dos participantes tiveram, no mínimo, dois períodos com relatos de sintomas de psicose. Já 94,4% dos adolescentes também relataram ao menos dois períodos de uso de cannabis. Tal situação demonstra-se preocupante no país, pois, segundo Conrod, pesquisas indicam que aproximadamente 30% dos estudantes mais velhos do ensino médio na província canadense de Ontário usam maconha.

A busca pela causalidade

O principal objetivo deste estudo era identificar ou descartar se o consumo de maconha estava diretamente relacionado ao surgimento posterior de sintomas da doença, em um cenário com alguns desafios. O primeiro? É durante a adolescência que geralmente começam tanto a psicose, quanto o uso de cannabis. O segundo: as informações sobre causalidade ainda são escassas. Grande parte desta situação se deve à forma como a maior parte das pesquisas sobre o tema tem sido feita até então, utilizando metodologias que promovem resultados sujeitos a questionamentos.

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Para superar tais desafios, os pesquisadores usaram uma técnica complexa chamada Random Intercept Cross-Lagged Panel Model (RI-CLPM), que promove a coleta, análise e cruzamento de dados em diversos níveis.

As informações coletadas foram avaliadas em um teste de sintomas similares aos psicóticos em adolescentes, e em uma escala de seis pontos de frequência de uso de maconha. Dentre outras medidas, a técnica permitiu a análise individual das respostas dos participantes, por período e de forma geral, a comparação com o grupo e também dos perfis dos adolescentes.

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Com os resultados finais em mãos, os pesquisadores puderam identificar de forma segura e individual se o aumento no consumo de maconha precede o aumento dos sintomas de psicose, e vice-versa. Foi possível inclusive diferenciar causalidade direta e associações temporais entre a droga e a doença.

É importante ressaltar que a pesquisa baseia-se em relatos dos adolescentes. Porém, os pesquisadores levaram isso em consideração, tendo estudado trabalhos anteriores, que indicam que a taxa de acerto em tais relatos varia de 80% a 100%. Além disso, a mecânica da pesquisa, totalmente confidencial e sem oferecer consequências aos jovens, proporcionou garantias aos adolescentes, que se sentiam mais à vontade para responder os questionamentos.

A importância dos resultados

Este estudo é hoje o teste mais rigoroso que se tem conhecimento sobre o assunto. A literatura médica mostra que pessoas propensas a problemas mentais geralmente são mais atraídas por entorpecentes, mas o levantamento mostra o caminho contrário – no caso da maconha, pessoas sadias que consomem a droga, mesmo sem histórico familiar de doença mental ou maior suscetibilidade aos efeitos da substância, têm um risco maior de desenvolvimento de psicose do que quem não é usuário.            

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A novidade chega em um momento muito importante para o Canadá, que aprovou o consumo e cultivo da droga para maiores de 18 anos a partir de outubro. Muito se fala a respeito da diminuição da criminalidade e também do valor bilionário que pode ser arrecadado em impostos com a legalização e venda de maconha. Mas estas alegações precisam ser debatidas.  

No primeiro caso, creio que se trata de uma conjectura, pois não existem dados conclusivos que demonstrem que a descriminalização acabe com o tráfico. Se atualmente ele já promove um mercado paralelo de cigarro e bebidas alcoólicas (contrabandeados ou falsificados), o que o impedirá de fazer o mesmo com a maconha? O European Monitoring Centre for Drugs and Drug Addiction indica que em Portugal, que descriminalizou o consumo de drogas, o tráfico até aumentou.

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Já com relação aos impostos arrecadados, fico me questionando se tal valor compensa o impacto que certamente será provocado à saúde dos usuários e, consequentemente, à rede pública de saúde. A entidade governamental norte-americana Centers for Disease Control and Prevention (CDC) estimou em 2016 que o abuso de álcool, uma droga legal, custava aos contribuintes, setor industrial e cofres públicos dos Estados Unidos 249 bilhões de dólares por ano (mais de 921 bilhões de reais). Você não leu errado, as cifras são impressionantes e seguem a linha de outros levantamentos que também apontam impactos bilionários.                        

Com isso em mente, afirmo: medidas como essa não podem ser tomadas baseando-se em debates filosóficos. Se cercar das melhores informações, para tomar decisões abalizadas em fatos é crucial. Porém, enquanto as evidências científicas confiáveis apontam para um lado, as políticas públicas (muito afetadas por lobby político ou financeiro) seguem para outro. Não se pode brincar com a vida das pessoas, mas, infelizmente, é isso que está acontecendo.

 

 

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