O jogo de Lira, depois de uma dupla derrota de Bolsonaro
Presidente da Câmara ganha tempo para levar Bolsonaro à capitulação. Se conseguir, será vitória pessoal. Caso contrário, terá prolongado a agonia governista
Foi uma dupla derrota em menos de 24 horas na Câmara.
Na quinta-feira, a comissão especial da Câmara rejeitou por 23 votos a 11 a proposta do governo impondo o regresso ao voto impresso a partir das eleições do próximo ano.
Ontem, essa comissão decidiu recomendar a rejeição ao plenário, onde o projeto de emenda constitucional (nº 135) será votado na próxima semana. A proposta de veto foi aprovada por 22 votos a 11.
“O plenário será o juiz dessa disputa, que, infelizmente, já foi longe demais”, anunciou Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Pelas regras internas, ele pode fazer isso com um projeto duplamente rejeitado numa comissão criada especificamente para analisá-lo.
Lira fez um jogo duplo. Deu um alento à plateia bolsonarista, e, ao mesmo tempo, delineou uma grande derrota do governo no plenário.
O naufrágio governista está no mapa de Lira há semanas. Seu partido, o Progressistas, locomotiva do Centrão, foi coautor de um manifesto, no mês passado, contra o projeto do governo do qual é aliado. Subscreveu com outros 10 partidos um compromisso público de veto ao voto impresso.
Em tese, o presidente da Câmara ganha tempo para insistir com Bolsonaro na capitulação, antes de uma votação de resultado provavelmente vexatório.
Caso consiga, poderá anunciar uma vitória pessoal numa conjuntura crítica. Se não conseguir, terá prolongado a agonia governista em praça pública. E, se o inesperado fizer uma surpresa — em política, até o impossível acontece —, manda o projeto de Bolsonaro ao Senado, onde a derrota foi prevista à Globonews, ontem, pelo presidente da Casa, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
O enterro da ideia de voto impresso não invalida seus efeitos na mobilização eleitoral do presidente-candidato. Terá sido útil enquanto durou, e permanecerá como lembrança a ser evocada na campanha de reeleição. Pela agenda de marketing do Planalto, aos poucos Bolsonaro deverá introduzir outro tema: uma nova Constituição.