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Por Coluna
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“Utøya” e “22 de Julho”: matou 77 e jurou que faria de novo

Focalizando o massacre de 2011 na Noruega, um filme faz uma anatomia do ódio, enquanto outro filme põe a plateia no meio dos 72 minutos de terror

Por Isabela Boscov Atualizado em 4 dez 2018, 19h19 - Publicado em 4 dez 2018, 19h08

Desde a II Guerra Mundial a Noruega não enfrentava tantas mortes de uma só vez quanto em 22 de julho de 2011, quando o ultradireitista Anders Behring Breivik colocou uma bomba em Oslo e então rumou para a Ilha de Utøya, distante quarenta quilômetros, e durante 72 minutos, sem que ninguém pudesse impedi-lo, abriu fogo contra os quase 400 adolescentes que estavam reunidos ali num acampamento de verão do Partido Trabalhista. Na fantasia doentia de Breivik, ele estava assim dando sua contribuição para acabar não só com o governo liberal então no poder, como também com a geração seguinte de liberais noruegueses. Como quase sempre nesses casos, Breivik, então com 32 anos, era um zero à esquerda – lar desfeito, mau desempenho escolar, qualificações escassa – que ouvira o canto da sereia do ódio e da supremacia branca e creditava seus males ao suposto declínio da nação e dos costumes. Quando foi preso, depois de deixar 77 cadáveres e mais de 300 feridos espalhados por Utøya e Oslo, pediu atendimento médico “urgente”: cortara o dedo num fragmento do crânio de uma das vítimas e não queria que infeccionasse. E, com ar de zombaria, disse que faria tudo de novo. Em Utøya, que está nos cinemas, o diretor norueguês Erik Poppe faz um sensacional (e terrível) plano-sequência em tempo real para mergulhar a plateia no terror das crianças e adolescentes que tentavam fugir aos disparos sem saber de onde eles vinham. Em 22 de Julho, da Netflix, o inglês Paul Greengrass (da série Bourne e de Voo United 93) abre o foco para recriar todas as facetas dessa história – e mostrar como a Noruega colocou Breivik no seu devido lugar com o apoio às vítimas, um julgamento impecável e o exercício justamente dos princípios que o terrorista desejava destruir.

Leia a seguir a resenha completa:


Um Contra Todos

Dois filmes muito diversos refletem sobre o horror que o neonazista Anders Breivik impôs à Noruega em 2011, com o massacre de 77 pessoas – na maioria adolescentes

Durante 72 minutos, Anders Behring Breivik atirou contra todo e qualquer alvo que visualizasse. Duas horas antes, detonara um veículo com explosivos no distrito governamental de Oslo, deixando oito mortos; na Ilha de Utøya, a 40 quilômetros da capital norueguesa, dedicou-se a – em suas próprias palavras – exterminar, tiro a tiro, a geração seguinte de liberais de seu país. Teve um êxito tenebroso: dos 69 mortos, 59 eram menores de 21 anos. Entre os dois ataques, Breivik matou 77 pessoas e feriu outras 320. No julgamento, diante de sobreviventes e familiares das vítimas, fez a saudação nazista. Sozinho, em 2011 Breivik quadruplicou a taxa de homicídios da Noruega, um país pouco familiarizado com a violência – o que pode ter contribuído para a resposta demorada e inadequada ao ataque em Utøya, conforme concluíram as próprias autoridades. Em outro tipo de reação, entretanto, a Noruega não falhou. Primeiro, no escrúpulo com que garantiu ao assassino não só o rigor da lei como também a proteção dela, num processo de lisura impecável. Mais ao ponto ainda, desde os jovens sob fogo no acampamento de verão do Partido Trabalhista até o primeiro-ministro, os noruegueses demonstraram a solidez justamente dos valores que Breivik visava a destruir, a começar pela solidariedade. Esse é o ponto para o qual convergem dois filmes muito diversos: Utøya, em cartaz nos cinemas, e 22 de Julho, produzido para a Netflix.

22 de Julho
22 de Julho (Netflix/Divulgação)

Dirigido pelo inglês Paul Greengrass, conhecido por três filmes da série Bourne e por seus assombrosos exames de episódios reais em que atritos ideológicos e sociopolíticos eclodem em violência – Domingo Sangrento, Voo United 93 e Capitão Phillips –, 22 de Julho é o que proporciona a visão mais abrangente. Desde o preparo da bomba de Oslo até a sentença final, Greengrass segue Breivik e tenta perscrutar seu ultradireitismo, feito de uma mistura mal assentada de rancor, alijamento e ignorância. Numa interpretação inquietante do ator Anders Danielsen Lie, o terrorista norueguês ostenta sua empáfia sem conseguir ocultar, sob ela, o sentimento terrível de insignificância que o move.

Utøya
Utøya (Califórnia/Divulgação)

Em paralelo, Greengrass acompanha Viljar Hanssen (Jonas Strand Gravli), de 17 anos. Um dos jovens mais queridos entre os quase 400 que estavam na ilha, ele conseguiu manter um pequeno grupo unido e proteger seu irmão menor até ser alvejado vezes seguidas – uma delas na cabeça. Viljar ficou à morte e enfrentou um árduo caminho até a recuperação. Com sua típica atenção para o detalhe, capacidade de análise e recusa a sentimentalismos, Greengrass faz o rapaz emergir do filme como uma pessoa de carne e osso à frente de quem se colocou um obstáculo incompreensível  – e, ao mesmo tempo, como uma síntese da Noruega sóbria e equânime que se opôs ao ódio de Breivik.

Utøya
Utøya (Califórnia/Divulgação)

Utøya, do norueguês Erik Poppe, é uma criatura bastante diferente e muito comovente, que – sem que isso tenha sido planejado – complementa 22 de Julho. Flagrando a adolescente Kaja (Andrea Berntzen) minutos antes de o ataque começar, o diretor desenha com pinceladas certeiras uma jovem com aspirações políticas e a convicção de que é necessário sempre almejar o certo e o justo. Kaja dá uma bronca na irmã mais nova, e elas se deixam brigadas. Quando imagina que esse momento pode ter sido o último, Kaja faz de tudo para achar a caçula no meio do tumulto. Do atirador, não se vê nem sombra; apenas se ouvem as rajadas de tiros e as pausas entre elas, enquanto a menina tenta fazer algo pelas pessoas que encontra no decorrer de sua busca, filmada em longos planos, e em tempo real. Ao contrário de Viljar, Kaja é uma personagem fictícia, em que as experiências de vários jovens são compiladas. Mas, da mesma forma que sua contraparte verídica, é um emblema de algo que, por mais frágil que pareça, pode ser indestrutível.

Isabela Boscov
Publicado originalmente na revista Veja em 28/11/2018
Republicado sob autorização de Abril Comunicações S.A
© Abril Comunicações S.A., 2018

Trailers

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UTØYA
(Utøya 22 Juli)
Noruega, 2018
Direção: Erik Poppe
Com Andrea Berntzen
Distribuição: Califórnia
22 DE JULHO
(22 July)
Noruega/Islândia/Estados Unidos, 2018
Direção: Paul Greengrass
Com Anders Danielsen Lie, Jonas Strand Gravli, Jon Øigarden
Onde: na Netflix

 

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