O dito por não dito
No tocante aos políticos, é preciso revisitar o passado para ter noção precisa do presente
Nem sempre as consultas ao Google resolvem questões cruciais de memória. Uma folheada em jornais antigos, guardados pelo hábito dos nascidos sob a égide do mundo analógico, fornece noção mais precisa a respeito de ditos que ao longo do tempo se transformaram impunemente em não ditos.
Numa olhada rápida nos arquivos, foi possível resgatar três deles: o primeiro e mais recente ocorreu em agosto de 2017, com Michel Temer saudando a saída de Rodrigo Janot da chefia do Ministério Público: “Sem Janot a Lava-Jato terá rumo correto”, disse antes de ser incluído por ordem de Raquel Dodge, sucessora de Janot na chefia da PGR, em inquérito do Supremo Tribunal Federal sobre favorecimento da Odebrecht por parte da secretaria de Aviação Civil durante o governo Dilma Rousseff, cargos ocupado por seus dois braços direitos Moreira Franco e Eliseu Padilha.
O segundo tem como protagonista o petista Jaques Wagner, hoje cotado como um dos possíveis candidatos do PT à Presidência da República. Em 2008, governador da Bahia e ainda aliado de Geddel Vieira Lima, então ministro da Integração Nacional, Wagner pontificou em entrevista ao jornal “Valor”: “Popularidade de Lula não é capaz de eleger postes”. Lula elegeu Dilma Rousseff e o tempo fez do autor da frase um candidato a “poste”. Por ora, com intenções de votos oscilantes entre 1% e 2%.
O terceiro exemplo é estrelado por Lula presidente no início do segundo mandato, em 2007, falando sobre sua definição de bravata. “É quando o cara promete ou ameaça coisas que sabe que não pode fazer”. Definiu-se a si quando no último discurso prometeu provar inocência depois de condenado e ameaçou estabelecer mecanismos para o controle da imprensa, coisa que não conseguiu quando mandava de Brasília, muito menos conseguirá na prisão em Curitiba.
Para não dizer que não falamos de pesquisas e suas circunstâncias: Datafolha de agosto de 2012 apontava que 73% dos consultados achavam que os acusados no escândalo do mensalão deveriam ser punidos, mas apenas 11% acreditavam que alguém seria preso por conta dos crimes. A realidade, como vemos, venceu a descrença.