Para Bolsonaro, melhor o depoimento presencial que mais uma derrota no STF
A dúvida agora é se o presidente vai falar ou se calar, como sugeriu a AGU; para aliados, o silêncio soaria como confissão de culpa
O presidente Jair Bolsonaro bateu o pé desde o começo contra a ideia de depor presencialmente no inquérito aberto com base nas denúncias do ex-ministro Sérgio Moro. E agora, mais de um ano depois, toma a iniciativa de pedir ao Supremo Tribunal Federal para dar pessoalmente seus esclarecimentos a respeito da suposta interferência na Polícia Federal. O motivo da virada é um só: politicamente, é melhor abraçar os riscos do depoimento do que amargar mais uma derrota no STF.
Embora tivesse declarado publicamente lá atrás que não via problema nenhum em ser ouvido pessoalmente pela Polícia Federal, Bolsonaro sempre se manifestou na direção contrária nos bastidores. Na época em que o inquérito começou a avançar, a avaliação feita por ele e seus ministros mais próximos era a de que o depoimento presencial seria um risco. Bolsonaro queria a certeza de que suas explicações seriam dadas em um ambiente controlado. Por escrito, sem risco de dar alguma declaração que pudesse alimentar de alguma forma as denúncias de Moro. Bolsonaro costumava repetir que o depoimento presencial era parte de uma ação do STF para constrangê-lo.
Partindo dessa orientação, a Advocacia-Geral da União insistiu no depoimento por escrito. Elencou precedentes no próprio Supremo Tribunal Federal de autoridades investigadas que puderam gozar dessa prerrogativa, como ex-presidente Michel Temer. Diante da decisão do então relator Celso de Mello de determinar a oitiva presencial, mudou de estratégia. Se arriscou em uma tese vista como para lá de mirabolante por ministros do STF: a de que, na condição de investigado, Bolsonaro optaria por ficar em silêncio e, portanto, nem precisaria nem comparecer ao depoimento. O tribunal não comprou a ideia e o recado chegou ao presidente.
Embora ministros do STF reconhecessem que havia divergências na Corte a respeito da exigência do depoimento presencial, o fato é que uma eventual derrota cairia bem mal para Bolsonaro. Principalmente num momento em que o presidente tenta segurar uma trégua com o STF. Ao pedir para ser ouvido presencialmente, mesmo depois de tanto tempo brigando pelo depoimento por escrito, o presidente enterra a polêmica.
A dúvida, agora, é se o presidente vai falar ou ficará em silêncio, como indicou a AGU ao tentar emplacar a tese de que ele não precisaria nem comparecer ao depoimento. A avaliação feita desde o começo por ministros próximos a Bolsonaro é a de que seria muito ruim para a imagem do presidente se sentar com a PF e advogados de Moro e permanecer calado. Soaria como uma confissão de que esconde fatos que poderiam incriminá-lo.