O balão de ensaio da privatização da Petrobras
Presidente sabe que não há clima para discutir a venda da estatal, mas encontra um bode expiatório para o aumento do preço dos combustíveis
O ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente da Câmara, Arthur Lira, e o presidente Jair Bolsonaro, todos juntos, ecoaram em menos de 24 horas a ideia de privatizar a Petrobras. Rapidamente, as ações da estatal deram sinais de alta e abriu-se uma discussão sobre como a venda da empresa poderia impactar na constante alta dos preços de combustíveis. Uma alternativa, como disse Lira, para colocar esse patrimônio a serviço da população em vez de apenas pagar dividendos a acionistas.
Não é preciso ir muito longe para enxergar o balão de ensaio. O governo sabe muito bem que não existe clima no Congresso para discutir a privatização da Petrobras, muito menos a poucos meses do fim do ano pré-eleitoral. O presidente, diga-se de passagem, nunca foi a favor de privatizar a estatal. Chegou a dizer que Fernando Henrique Cardoso deveria ser fuzilado por isso. Mas o próprio Bolsonaro explica: se não falasse em fuzilamento, nem sequer seria chamado para dar entrevista.
Falar em privatizar a Petrobras rende algumas manchetes ao hoje presidente da República, que já não tem mais dificuldade de conseguir um microfone. Mais do que isso, o discurso lhe permite se eximir do aumento dos preços nas bombas. “É muito fácil: aumentou a gasolina, culpa do Bolsonaro. Já tenho vontade de privatizar a Petrobras. Tenho vontade. Vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer. O que acontece? Não posso controlar, melhor direcionar o preço, mas, quando aumenta, a culpa é minha apesar de ter zerado imposto federal”, disse Bolsonaro.
É bem mais fácil jogar a culpa da alta dos combustíveis numa suposta ineficiência do sistema do que numa instabilidade econômica que decorre, ao menos em parte, de decisões tomadas pelo seu próprio governo. Mais fácil ainda seria poder jogar a culpa integralmente na iniciativa privada. Como se a política de preços de uma Petrobras privatizada ganhasse automaticamente uma espécie de blindagem em relação a tudo o que acontece no governo.
Um resultado prático dessa retórica repentina sobre a venda da Petrobras é dar ao governo uma plataforma de campanha para o ano que vem, uma vez que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva surge como opositor natural desse discurso. Seria também uma forma de dar uma roupagem um pouco mais liberal a um governo que abandonou a agenda de reformas e custa a avançar nas prometidas privatizações.