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Valentina de Botas: Quem perde é a nação adiada

As forças que se movem agora querem parar o país contra as reformas que podem tirá-lo da paralisia

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h56 - Publicado em 26 abr 2017, 20h13

Eduardo Giannetti, cujas erudição e clareza admiro, me pareceu um pouco confuso no programa Roda Viva. O governo Temer não tem legitimidade, repetiu mais vezes do que lhe foi perguntado; ao mesmo tempo, afirmava que a lei deve ser sempre observada, esquecido de que foi precisamente essa a receita do impeachment de Dilma Rousseff e que Michel Temer assumiu legitimado, então, no cumprimento da Constituição, a lei maior. Exceto pela fraude de Renan Calheiros e Ricardo Lewandowski preservando os direitos políticos de Janete. Com alvar clareza e denso conhecimento, Giannetti deu uma aula de Brasil e ressaltou uma enormidade ofuscada pela magnitude da corrupção: a incompetência inata de Dilma teve mais relevância na destruição do país do que a roubalheira. Contudo, o economista não compreende por que a população, que foi às ruas em 2013 por razões menores, não faz o mesmo agora. Não tenho lições a dar ao escritor de quem li com prazer o livro “Auto-engano”, só quero lembrar, como integrante da população que não foi às ruas em 2013 e não vai agora, que quando os indignados ensaiávamos ir às ruas naquele ano, os black blocs as tomaram levando o terror a algumas cidades.

Aqueles movimentos, sem uma pauta nacional e simpáticos ao governo Dilma Rousseff que logo simpatizou eles, deram passe livre a delinquentes anistiados como manifestantes por muitos jornalistas encantados com a estética do vandalismo também moral de fascistas mascarados e, fazendo poesia ruim e péssimo jornalismo, homenageavam aquela versão troncha de um ainda idealizado maio de 68 enquanto ônibus eram incendiados, o cotidiano das cidades convulsionado e a população aterrorizada. Ora, esses bandos tinham objetivos diferentes dos da nação indignada que mostraria como se protesta civilizadamente e, em São Paulo, por exemplo, pretendiam atazanar o governo de Geraldo Alckmin visando as eleições de 2014. Inicialmente, o pretexto eram os 20 centavos de aumento na tarifa de ônibus e metrô. Depois, entoavam que “não é pelos 20 centavos”. Não mesmo: Janete, que ignorava o Congresso, quis conversa com os black blocs, recebidos, então, por Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência. Não por acaso, tentaram se infiltrar nas manifestações pró-impeachment, mas foram repelidos porque ali não havia lugar para fascismos de ordem nenhuma. O terror serviu ao governo federal espantando estrategicamente das ruas os brasileiros indignados; resultou, em São Paulo, em dezembro daquele ano, no espancamento do coronel da PM Reynaldo Simões Rossi que, sangrando a caminho do hospital, ainda advertia seus comandados que não reagissem àquela agressão; e culminou, no Rio, em fevereiro de 2014, no assassinato do cinegrafista Santiago de Andrade.

Não sou porta-voz de ninguém, só porto mesmo a minha voz anônima, que fui aprendendo a tornar pessoal, própria; ora mais indignada, ora mais tristonha, ora mais esperançosa, ora mais calada ou mais audível dentro das nossas realidades que só me dão a sensação de que as percebo porque me intrigam e me desconcertam. Assim, não sei dizer por que a população se retrai agora, falo por mim: o mundo acabou, todos os avisos anunciam depois de cada delação, mas essenciais pendências demasiado mundanas me prendem a ele na vida para se ganhar dia a dia, para se perder um pouco a cada dia, para se achar algum riso apesar do que desafia a alegria possível de se viver num país que, acometido por desordens cognitivas, parece achar que a realidade é somente questão de adesão. A mobilização permanente inviabiliza o cotidiano e as forças mobilizadas agora representam arcaísmos e querem parar o país contra as reformas que podem tirá-lo da paralisia, como se estas fossem mero querer de um governo cujo apelido de ilegítimo serve a quem as combate por conveniência e/ou desinformação, numa recusa em aderir ao século 21 e ao fato de que, se as reformas não forem encaminhadas agora, o vulnerável presidente Michel Temer perderá pouco ou nada de seu capital político que era somente a nobre moldura fornecida pelo justo alívio da nação em se livrar de Janete.

Só que os fatos não são uma questão de adesão e quem perde é a nação adiada. Nesse contexto, eu iria às ruas em favor, e não contra as reformas sem as quais o país lavado a jato não existirá. Marchar por elas seria o desdobramento natural dos protestos pelo impeachment se os movimentos que os impulsionaram não tivessem se confundido a tal ponto que se interseccionam com as forças contrárias a ele. Ah, mas não pode fazer as reformas depois? Claro que sim, nunca também, outro nome para o depois que não chega.

Giannetti reafirmou a necessidade dramática das reformas, mas o tal governo ilegítimo, ministros e parlamentares investigados… A alternativa? Ele gosta da ideia de uma constituinte exclusiva. Eu não. Receio que a exclusividade tornaria os constituintes descompromissados quanto ao que aprovarem. Mas o que mais me incomoda na ideia é que seus simpatizantes parecem convencidos de que, do lado de fora do Congresso, só há homens e mulheres probos e competentes, entre os quais o eleitor escolherá, com a precisão que só os eleitores têm, uma elite moral e técnica para alinhavar o futuro. Enquanto isso, ficamos pendurados na sucessão de fins do mundo. Ademais, os congressistas e o governo teriam competência institucional para o dia a dia administrativo-legislativo do país, mas não para as reformas? Para quais outros atos estariam legitimados ou deslegitimados? Aqui relembro, mais com desencanto pragmático do que com indignação estéril, as boas-vindas de Ulisses Guimarães ao neófito Dantas de Oliveira: estou no Congresso há sete legislaturas e nunca vi uma melhor do que a posterior.

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Pelo olhar de Giannetti, vimos a nação sem sentido esmagada entre a ausência do Estado onde ele é essencial e a presença dele onde ele é indesejável. Tomara saibamos, nessa falta de sentido, fundar o tempo para inventar outro país. Com algumas ressalvas, achei pertinente o diagnóstico sobre a desidratação do PT como representação do pensamento de uma parcela da sociedade que, se aderir à realidade, constatará na sigla o comando da máfia que vendeu a nação com a conivência imperdoável da oposição. O PT, sempre apostando na desordem cognitiva do país, ainda rumina cálculos entre as possibilidades eleitorais de Lula e o calendário da Lava Jato como se o gangsterismo lulopetista não justificasse a extinção do partido.

Parar a nação quase paralisada, neste 28 de abril, dá sobrevida ao primitivismo radicalizado que o lulopetismo nos legou; a adesão de brasileiros de bem a uma greve contra si manifesta nossa desordem cognitiva e celebra o legado de um defunto moral e político que insiste em simular imortalidade: Lula, confirmação inquestionável de que quando um homem se vende, por menos que receba – ainda que o desprezível sacerdote do nosso atraso tenha ganhado muito negociando a nação – sempre recebe mais do que vale.

 

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