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Valentina de Botas: Os votos estavam verdes

Democracia é grego para os rejeitados pelo Centrão que atacam quem conseguiu o que eles não conseguiram

Por Valentina de Botas
Atualizado em 30 jul 2020, 20h23 - Publicado em 26 jul 2018, 17h24

Valentina de Botas

Tão incerto o Centrão garantir votos para Alckmin é o destino do país submetido a certas figuras erradas que integram essa maçaroca de partidos, mas o fato é que Ciro Gomes e Jair Bolsonaro desejavam tal apoio indesejado. E é legítimo que o desejassem. Sobretudo para governar, alianças são necessárias. Se feitas em torno de princípios, como ensinava Tancredo Neves, provam que as complexidades da política, naquilo que ela tem de intersecção com discurso e prática na democracia, não precisam ser canalhices. Mas democracia é grego para os rejeitados pelo Centrão que atacam quem conseguiu o que eles não conseguiram. Fingindo que não querem mais ou nem sequer chegaram a querer os eventuais votos semeados pelo Centrão, numa versão esculhambada da raposa de Esopo, as viúvas do Centrão só agora choramingam que os votos podem estar verdes de podres. As costuras são complicadas e o jogo, mais do que pesado, é sujo: na terça-feira, enquanto o candidato do PSDB repetia, no evento “Seu País, Sua Decisão ─ Presidenciáveis 2018”, organizado pela AmCham, em São Paulo, o que dissera no Roda Viva do dia anterior ─ se eleito, não ressuscitará a obrigatoriedade da contribuição sindical ─, Paulinho da Força plantava notinhas pilantras bem acolhidas na imprensa dizendo o contrário em acenos para seu eleitorado na campanha pela reeleição na Câmara.

 

Uma estranha no ninho

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Na convenção do PSL que oficializou Jair Bolsonaro como candidato do partido isolado em seu extremismo, Janaína Paschoal, por seu discurso no evento e declarações posteriores, parece que não percebeu dois detalhes: 1 ─ foi convidada para ser vice na chapa, não cabeça; 2 ─ o convite veio de um antidemocrata que inspira a aniquilação de dissidentes, a adoração a ditadores e o afeto a torturadores, mas claro, os ditadores e torturadores certos, aqueles de estimação. Nesse meio insalubre, um democrata e homem público decente como Fernando Henrique Cardoso é execrado e o coronel Ustra, reverenciado. Alguns analistas imparciais a favor do deputado dizem que tal dificuldade com a condição de bípedes civilizados está presente entre todos os eleitores de todos os candidatos. Não está. Patologia similar só é diagnosticada entre petistas (e congêneres como Ciro Gomes), com seus próprios ditadores e terroristas prediletos e suas constantes ameaças a jornalistas independentes, ou alguém consegue realmente imaginar também um eleitor do PSDB ou do MDB tão apaixonado (?) por seu candidato que pregue, como adeptos de Bolsonaro fizeram nesta semana, bloqueio em massa do jornalista Ricardo Noblat no Twitter? O crime dele foi dizer o que representou o discurso de Janaína na convenção: lições inúteis de tolerância a intolerantes.

Insultar jornalistas é comum no eleitorado em geral, mas a mobilização para calar ou constrangê-los habita os extremos da esquerda e da direita. Esta direita extremada, a meu ver, nem direita é, mas somente um primitivismo que combina um reacionarismo patrulheiro dos hábitos privados e um liberalismo tão fajuto que seu líder não poderia ser outro se não Jair Bolsonaro, que sempre votou a favor da pauta econômica do PT e de privilégios do funcionalismo. Mesmo depois da sua conversão ao liberalismo no caminho para o Planalto, como um Saulo deformado no caminho de Damasco, suas afirmações indicam que, ainda que pretendesse ser um liberal, ele não poderia sê-lo porque simplesmente não sabe o que é isso. Não tenho nada pessoal contra Bolsonaro, só não votarei nele porque o acho dramaticamente despreparado para governar um país tão complexo como o Brasil, em tempo algum, muito menos numa situação que exigirá do novo presidente capacidade de diálogo também com dissidentes; conhecimento, não de especialista, mas de um político que tenha absorvido aprendizado compatível com sua experiência pública e Bolsonaro, em entrevista ao Globo, na semana passada, escancarou sua mediocridade ao ostentar ignorância vexaminosa sobre o Orçamento da União, depois de votar 28 orçamentos no Congresso. Vinte e oito! Como esperar que alguém assim conheça e entenda os problemas do país e responda a eles sem mandar os brasileiros passarem no posto Ipiranga?

Se cumprimentos irônicos e ofensas dos seguidores de Bolsonaro à Janaína marcaram o distanciamento entre ela e a vaga de vice na chapa do PSL, elogios eloquentes num apoio quase oficial a Geraldo Alckmin foram usados por Josué Gomes para se afastar da chapa do PSDB. O homem de 54 anos jura que sua mãe não quer o filhote metido em política. Prefiro assim, acho elegante manter as aparências, uma elegância que custa pouco: apenas a verdade, que, na política como na vida, muitas vezes basta que reste implícita. Não vou tão longe quanto Gomes nos elogios ao candidato que julgo ser o menos pior no cardápio que o destino gozador traz e acrescento uma qualidade omitida pelo industrial: a falta de carisma. Tantas vezes, mero tapume para a ineficiência e a corrupção, o carisma, na América Latina, degenerou em personalismos (peronismo, chavismo, lulopetismo, bolsonarismo) que resultam em regimes autoritários.

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Vice, você disse vice?

O vice ideal para Geraldo Alckmin está bem aqui: eu mesma. Sou mulher, o que, reza a lenda, atrai o voto feminino; sou pernambucana, o que, reza outra lenda, atrai o voto nordestino. Sou mãe, e mães, segundo a conceituada antropóloga Dilma Rousseff, são a metade da população brasileira que é filha de alguém (se ficaram confusos é porque entenderam). Não sou investigada na Lava Jato, o que, dizem todos os oráculos, é qualidade não apenas necessária, mas suficiente. Odebrecht, OAS, BNDES? Nunca vi, nem comi, eu só ouço falar. Sou uma mulher de palavra, muitas delas, porque adoro quase todas. Sou nova na política, que é quase um certificado de perfeição. Mastigo de boca fechada, sei usar talher de peixe, falo baixo. Leio e entendo o que li. Consigo escrever sem ser vencida por crases e vírgulas, períodos compostos por subordinação não me assombram e não me atrapalho com a flexão do infinitivo. Sei de cor a tabuada, as capitais dos estados e os afluentes do Amazonas. À delegacia, só fui para dar queixa ou para testemunhar. Do que mais o Brasil precisa? Tá bem, admito que pontualidade é um desafio para mim, não consigo achar a ponta do durex, não sei andar de bicicleta e não dirijo. Me julguem, mas em minha defesa declaro que só não dirijo porque não tenho carta. O que atesta minha obediência à lei. E não tenho carta porque não fiz o curso no Detran, o que mostra meu senso de responsabilidade, ou seja, não saio por aí, ao volante, sem carta e sem saber dirigir, tipo olha-lá-a-louca. Ok, se procurarem bem, vão encontrar na minha biografia pedaços de biografias alheias que renderiam manchetes sensacionais, ainda que esta possa não ser opinião exatamente unânime entre os envolvidos. Ora, o que foi? Estarei estreando na política, não na vida.

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