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Trump desmonta mundo projetado por Churchill

Na atual fase dos EUA presididos por Trump, abre-se mão da universalidade, e descortina-se uma era de particularismo e relativismo moral

Por Marcos Troyjo
Atualizado em 30 jul 2020, 20h25 - Publicado em 17 jun 2018, 22h48

Marcos Troyjo

Já é extensa a coleção de mudanças que Donald Trump impôs ao papel dos EUA no cenário global. Dado o imenso peso relativo norte-americano, altera-se, por conseguinte, a própria ordem internacional.

Consciente ou não, com menor ou maior grau de intencionalidade, Trump vai aos poucos desmontando uma configuração mundial estruturada ao longo dos últimos setenta anos. E um dos principais projetistas do mundo que se está desmanchando foi Winston Churchill.

Por mais de sete décadas, os EUA capitanearam um mundo em grande medida delineado por Churchill em seu discurso “Tendões da Paz” (“Sinews of Peace”), mais conhecido como “Discurso da Cortina de Ferro”, proferido no Westminster College, no estado norte-americano do Missouri, em março de 1946.

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Tal pronunciamento ofereceu aos EUA uma “moldura política” (“policy framework”, em inglês). E, em seu interior, é claro que a trajetória de política externa e visão de mundo dos EUA de Harry Truman a Barack Obama apresentou oscilações de estilo e foco.

Truman e Eisenhower foram engenheiros dos movimentos inaugurais da Guerra Fria. Kennedy e Johnson buscaram liderança americana num mundo que àquela altura parecia fadado ao conflito Leste-Oeste por muito tempo.

Nixon, Reagan e Bush sênior tentaram — e conseguiram — quebrar a espinha dorsal da União Soviética e assim “vencer” a Guerra Fria. Bush júnior inventou a Guerra ao Terror e aplicou a doutrina dos ataques preventivos (“preemptive”).

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Carter, Clinton e Obama puseram ênfase nos EUA como “superpotência benigna” — protagonistas, sim, mas de um sistema multilateral baseado em regras.

Muitas dessas alternâncias respondem a conjunturas específicas. Em seu todo, no entanto, há uma viga mestra, um “conceito estratégico abrangente”, como descreveu Churchill em seu discurso do Missouri, na certeza de que a expressão agradaria os formadores de política externa e de defesa dos EUA.

Tal conceito teve menos que ver com a Cortina de Ferro ou a ameaça expansionista do comunismo soviético. Tampouco foi algo direcionado apenas a aplicações militares. O objetivo abrangente era “nada menos que a segurança e bem-estar, a liberdade e o progresso de todos os lares e famílias de todos homens e mulheres de todas as terras”.

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Homem experimentado e do mundo, Churchill era cheio de imperfeições — e nada sacrossanto. Na condução quotidiana dos assuntos de estado, fez barbeiragens como ministro da Fazenda (“Chancellor of the Exchequer) ou primeiro lorde do Almirantado. Suas posições relativas ao colonialismo britânico ou ao voto feminino são para lá de questionáveis. Em nome de objetivos maiores, como derrotar o Terceiro Reich, não hesitou em costurar alianças com a União Soviética, regime que abominava.

Assim, Churchill estava longe de ser um idealista, em seu discurso do Missouri, no entanto, parece ter encontrado fórmula em que, defendidos os cânones ocidentais (bandeira cuja liderança deveria caber aos EUA), todos poderiam ganhar.

Nessa linha, Churchill sugeria ao menos duas diretivas. A primeira: há uma família de nações pautadas por valores fundamentais do Ocidente: a democracia representativa, o estado de direito, a livre iniciativa; alguma noção, enfim, de civilização próspera e livre. A segunda, tais valores devem permanecer válidos não importa o antagonista ou a conjuntura. Não devem portanto esmorecer se o adversário for o fascismo, o comunismo ou o terrorismo.

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Fica natural assim entender muito da pregação de Churchill que emerge de tais vetores. A formação de uma aliança ocidental, o valor de uma Europa Unida, o fortalecimento de um sistema multilateral a partir de uma efetiva Organização das Nações Unidas.

Essa visão de Churchill — concebida por indivíduo com amplo treinamento no que ele próprio denominava “a guerra como escola de aperfeiçoamento” — é menos “realista” e mais “moral”.

No campo semântico das relações internacionais, “realismo” é ortodoxamente compreendido como o poder “nu e cru”. O mundo é um tabuleiro em que, quando uns ganham, outros perdem — um “jogo de soma zero”. Aqui, a única régua ética é perseguir seus próprios interesses, mensurados em termos de obtenção de mais poder ou riqueza.

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O Ocidente como moral — o projeto de Churchill — estima não apenas a superioridade de valores como democracia representativa, estado de direito e livre iniciativa, mas também sua ambicionada “universalidade”.

Na segunda metade dos anos 1940, Churchill enxergava os EUA no “pináculo do poder mundial”. Os EUA deveriam portanto liderar a construção de um mundo sustentado sobre os pilares ocidentais.

Na atual fase dos EUA presididos por Trump, abre-se mão de tal ambição de universalidade. Descortina-se uma era de particularismo e relativismo moral. Nela, talvez o próprio conceito de Ocidente tenha perdido a validade.

Vivemos uma trama em que o primeiro-ministro do Canadá é “ofensivo”. O ditador da Coreia do Norte, “talentoso”. Um mundo em que as instituições multilaterais são inclinadas a sempre constranger os EUA, fazendo com que Washington sempre saia perdedor de contenciosos arbitrados multilateralmente.

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