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Por Coluna
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O peso da coroa na balança

Se o preço da redução das penas de Sérgio Cabral for a revelação dos podres do Judiciário mantidos em segredo peloo corporativismo, por que não pagá-lo?

Por José Nêumanne
Atualizado em 30 jul 2020, 20h01 - Publicado em 22 jan 2019, 07h14

José Nêumanne (publicado no Blog do Nêumanne)

Exemplo claro de que normalmente quem detém a coroa consegue safar-se de qualquer apuro, por mais complicado que possa parecer, é a recente decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, em plantão no recesso do fim de ano, de, a pedido do deputado estadual fluminense e senador eleito pelo PSL Flávio Bolsonaro, primogênito do presidente da República, suspender a investigação de seu ex-motorista e segurança Fabrício Queiroz, PM aposentado, para apurar movimentação financeira atípica constatada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), hoje sob o ministro da Justiça, Sergio Moro. As investigações serão suspensas até o relator, ministro Marco Aurélio Mello, se pronunciar. Dilma, rainha deposta, denunciada por Palocci, poderá ser presa a qualquer momento, mas a investigação sobre o herdeiro do trono foi suspensa.

E aí, Moro, como é que fica? Vai levar uma bola nas costas ou apurar o assunto? O silêncio só se justifica se a desconfiança gerada for a melhor explicação encontrada. Ficou patente que houve desvio de verbas pela família para atender às despesas sem se lançarem nas mãos das empreiteiras. Se sair, Sua Excelência pode acabar com o governo que o povo escolheu para limpar o Brasil e fazer as reformas necessárias. Se ficar e mandar investigar a primeira-dama, poderá derrubar o governo e cair junto. A geometria da situação só admite uma saída: a bola autodirigida às próprias costas. Ou seja, procurar para não achar. Lula usou esse expediente de forma recorrente. É o dilema da lei contra a coroa.

No passado tivemos exemplos que não foram, em momento algum, considerados pelo PT, dado que se trata de um partido pouco afeito ao  estudo da História e do funcionamento das instituições democráticas. Durante a Revolução Francesa, por exemplo, Robespierre, o incorruptível, depois de se tornar um dos campeões do Terror revolucionário, acabou guilhotinado. Os líderes revolucionários e os governos que instituíram encontraram quase sempre ao final do seu trajeto o cadafalso, incluído o suspeito Danton, mas a coroa resistiu, tanto que, assim que conseguiu, Napoleão Bonaparte tratou de se ser sagrado imperador.

Quando Márcio Thomaz Bastos partiu para a eternidade, levando no ataúde a caixa-preta de muitas ações criminosas perpetradas pelo partido ao qual serviu como ministro da Justiça, logo ficou claro que o PT tinha perdido o controle das instituições, e aí o sistema voltou-se contra ele.

A saída de cena de Márcio, na verdade, ensejou o surgimento da Operação Lava Jato. Os outsiders conseguiram, em Curitiba, identificar uma poderosa rede criminosa envolvendo o PT, seus aliados e até a soit-disant oposição tucana (comprada), políticos e empresários, corajosamente posta atrás das grades. Os números da operação comandada por Sergio Moro surpreendem: foram 2.476  procedimentos instaurados, 82 acusações contra 347 pessoas e 215 condenações. Os principais líderes do PT foram condenados e o chefão do bando, o ex-presidente Lula, está preso.

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Mas ainda não chegou ao fim. Como escrevi em artigo publicado na semana passada neste blog sob o título de Ainda a roubalheira do PT, o procurador da Lava Jato Roberson Pozzobon, em entrevista a O Estado de S. Paulo, declarou recentemente  que muito ainda está por vir.

Os malfeitos de Executivo e Legislativo foram expostos e as punições estão em curso. Agora eventuais delações do ex-ministro Antônio Palocci, do ex-procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro Cláudio Lopes e de Sérgio Cabral prometem abrir mais caixas-pretas. Urge criar condições para que os três falem com detalhes sobre os crimes que protagonizaram ou de que foram cúmplices.

Palocci dispõe-se a revelar as falcatruas postas em prática pelo PT nos fundos de pensão. Ele acaba de assinar a terceira delação premiada, no âmbito da Operação Greenfield, que investiga os desvios nos fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras (Petros) e da Caixa Econômica Federal (Funcef). O PT, de forma escandalosa, fez uso da  poupança dos aposentados e associados dos fundos de pensão para se perpetuar no poder. Ele se propõe a contar os bastidores do mercado persa das medidas provisórias, cujos números impressionam. Segundo Palocci, “900 das mil medidas provisórias envolviam propinas”. Não é espantoso por um motivo simples: o espanto passou a ser a regra, não mais a exceção. Mas Palocci não delataria empresas e instituições financeiras? Será que vai? Ou será mais uma omissão premiada?

Outro que tem muito a contar é o procurador-geral Claudio Lopes, delatado por receber propina para abafar a corrupção  do governo de Sérgio Cabral. Do seu depoimento poderão sair informações preciosas para entender como funcionava a poderosa máquina de corrupção que pôs a pique as finanças do Estado do Rio de Janeiro.

Ciente de que pode passar décadas na prisão, Sérgio Cabral convenceu-se, afinal, de que só lhe resta, para amenizar as penas a que faz jus, negociar uma delação premiada. Sabe-se que, para intranquilidade de muitos, ele promete revelar as mazelas da magistratura do Estado que governou, magistratura essa  que o cortejou muito e lhe garantiu por anos a fio forte influência no Ministério Público e em varas, cortes e tribunais.

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Um dos maiores aliados do PT, “Serginho”, como era  carinhosamente tratado por Lula, tem muito a contar. Sem o apoio do Estado de São Paulo, e tendo Minas alternado o poder com o PMDB, o apoio de Cabral foi vital para o petista. A aliança dele com Lula mostrou-se fundamental para o PT. Em troca de apoio político, Cabral ganhou  influência na área da Justiça, tendo conseguido nomear vários ministros para as Cortes Superiores.

Sua delação deve ser encarada, portanto, como uma urgência, pois ela tem tudo para ajudar a promover uma benéfica higienização das togas, o que vai contribuir para que o Brasil avance no campo da transparência institucional  e da ética  no âmbito dos Três Poderes.

Há que atentar, entretanto, para uma questão grave: o difícil será o emedebista encontrar um advogado disposto a tocar uma delação que vai  devassar  a podridão instalada nos subterrâneos do Judiciário. Dois de seus advogados já o abandonaram quando ele admitiu que, acuado, só lhe resta agora entregar os maganões do Judiciário, sob pena de sua delação não interessar mais à Polícia ou ao Ministério Público Federal. Mas quem opta pela delação premiada  tem cada vez mais dificuldade de  contratar advogado. No caso do ex-governador, chefão político recordista absoluto em duração de penas, a situação é ainda mais complicada, dado que ele se dispõe a contar dos atos nada honrosos praticados por integrantes dos  tribunais superiores. Teme-se que nenhuma banca de advocacia resista à retaliação dos tribunais e ao fato de os clientes preferirem ir embora.

O certo é que a cúpula judiciária não quer saber desse assunto e tudo fará para manter o ex-governador no silêncio de sua cela. O Judiciário teme um incêndio que poderá ir longe, destruindo reputações até agora intocadas, protegidas pelo corporativismo.

O atual ocupante do Ministério da Justiça, o ex-juiz Sergio Moro, que conhece a fundo os crimes praticados por políticos e empresários durante os mandatos de Lula e Dilma, terá agora a oportunidade de contribuir com seu saber, sua experiência e seu destemor para que não se imponham obstáculos de nenhuma ordem à necessária e urgente delação de Sérgio Cabral sobre o  Judiciário, com o qual ele conviveu tão intimamente, mas por cuja cúpula foi tão hostilizado. E até humilhado. Basta lembrar, nesse particular, o carão que levou do atual presidente do STF, Dias Toffoli, pelo crime, para este, imperdoável, de determinar o uso de tornozeleiras pelo ex-chefinho adorado José Dirceu de Oliveira e Silva. Parece-me razoável que, se forem consistentes os fatos e as provas apresentados por Sérgio Cabral, ele  poderá mesmo merecer uma redução de suas  penas enormes. Diante de tudo o que têm sofrido em crises política, econômica, financeira e, sobretudo, moral, o Brasil e os brasileiros precisam ter certeza de que seus magistrados, inclusive os “supremos”, são honestos e não se deixam manobrar por siglas ou partidos. Ou seja: que o martelo do juiz seja usado para punir todos os culpados e o peso da coroa não distorça tanto o equilíbrio de sua balança.

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