Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Augusto Nunes Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Coluna
Com palavras e imagens, esta página tenta apressar a chegada do futuro que o Brasil espera deitado em berço esplêndido. E lembrar aos sem-memória o que não pode ser esquecido. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

O país que absolve o culpado e pune a vítima mostra a cara na TV

A poucas horas do começo da sessão que inocentou Antonio Palocci, o caseiro desempregado Francenildo Costa continuava pouco animado com a ideia de assistir ao julgamento no Supremo Tribunal Federal. Ainda não vira a cor do dinheiro que  a Caixa Econômica já deveria ter pago há muito tempo pela quebra criminosa do sigilo bancário. Teria de arrumar um terno. E desconfiava que a coisa iria dar em nada.  “Eles sempre […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 16h59 - Publicado em 27 ago 2009, 23h17

A poucas horas do começo da sessão que inocentou Antonio Palocci, o caseiro desempregado Francenildo Costa continuava pouco animado com a ideia de assistir ao julgamento no Supremo Tribunal Federal. Ainda não vira a cor do dinheiro que  a Caixa Econômica já deveria ter pago há muito tempo pela quebra criminosa do sigilo bancário. Teria de arrumar um terno. E desconfiava que a coisa iria dar em nada.  “Eles sempre se ajudam”, previu.

Esse ceticismo vinha sendo alimentado havia dois anos e meio. Desde março de 2006, quando a delinquência se consumou, Francenildo colheu sucessivas evidências de que o Brasil já não se limita a absolver pecadores. Também pune inocentes. Por ter contado que Palocci aparecia com frequência na mansão suspeitíssima que jurou não conhecer, o caseiro da “República de Ribeirão Preto” perdeu o emprego, o sossego, a mulher e a chance de conseguir trabalho fixo em Brasília. O culpado ficou dois meses deprimido com a perda do empregão, mas se elegeu deputado e, sem contas a ajustar com tribunais, poderia escolher entre a volta ao primeiro escalão e a candidatura ao governo de São Paulo. A depressão se foi faz muito tempo.

Convencido pelo advogado, que também lhe emprestou o terno, Francenildo chegou ao STF disposto a depor. Os ministros negaram-se a saber o que tinha a dizer. Quando entrou no plenário, ficou intrigado com aquelas capas longas e pretas. Quando a sessão começou, ficou confuso. Nunca ouvira alguém falando juridiquês. Se o advogado não traduzisse o que diziam os doutores, não teria entendido uma vírgula da discurseira.

Se o intérprete improvisado não censurou momentos especialmente inverossímeis, soube que sentou no banco dos réus durante o falatório do advogado José Roberto Batochio. Para salvar a pele do cliente, o defensor de Palocci voltou a lançar suspeitas sobre o dinheiro que a vítima recebeu do pai. E insinuou que, durante algum tempo, investigadores da Polïcia Federal e o caseiro de alta periculosidade conspiraram contra o ministro da Fazenda, a ordem, o progresso e a estabilidade da moeda.

Continua após a publicidade

Relator do caso, Gilmar Mendes admitiu que o sigilo foi quebrado e que o extrato da conta violada foi entregue a Palocci. Mas não havia provas de que o chefe participou ativamente do crime, decidiu o presidente do STF, balizando o caminho que percorreria ─ e que seria seguido por cinco ministros. Quatro optaram pela sensatez e pela lógica. Se o caseiro não desmentisse o ministro, o estupro não teria ocorrido, certo? Se fossem localizadas irregularidades na conta, Palocci conseguiria desqualificar o testemunho de Francenildo e manter-se no cargo, certo? Gilmar Mendes achou pouco. Queria provas. Não explicou com clareza quais seriam.

Talvez aceitasse a denúncia se o mandante e único beneficiário do estupro fosse pessoalmente à agência da CEF, obrigasse o gerente a descobrir bandalheiras na conta e entregasse a papelada, em mãos, aos amigos da imprensa.  Como não fez isso, sobrou para Jorge Mattoso, ex-presidente da CEF. E, mais uma vez, para o caseiro. Sempre sobra.

As legendas na tela informavam que estava em curso, transmitido ao vivo pela TV Senado, o julgamento da “Pet 3898 – MPF x Antonio Palocci Filho e outros”. Pet de petição, MPF de Ministério Público Federal. O som e as imagens foram muito além do prometido. Foram escancarados, naquela quinta-feira, alguns traços perversos da alma do país: a verborragia, a arrogância, o farisaísmo, a demagogia carnavalesca, a Justiça injusta, a erudição pernóstica, o cinismo, a hipocrisia, a desconversa farsesca, a esperteza, a miopia malandra. Viu-se a alma e e viu-se a cara, em sua sórdida inteireza, do Brasil que absolve os Paloccis e castiga os Francenildos.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.