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O chanceler de Lula é só um áulico a caminho da lata de lixo da História

Se mesmo potências esportivas festejam o segundo lugar num campeonato mundial de qualquer modalidade, manda o bom senso que até a conquista da medalha de prata em taekwondo por um anão olímpico como o Brasil vire notícia de primeira página, certo? Errado, ensinou nesta segunda-feira a Folha de S. Paulo. A façanha da seleção feminina […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 13h37 - Publicado em 16 nov 2010, 03h23

A vice-campeã Fabi será sempre lembrada com respeito pelo país que nem saberá quem foi Celso Amorim

Se mesmo potências esportivas festejam o segundo lugar num campeonato mundial de qualquer modalidade, manda o bom senso que até a conquista da medalha de prata em taekwondo por um anão olímpico como o Brasil vire notícia de primeira página, certo? Errado, ensinou nesta segunda-feira a Folha de S. Paulo. A façanha da seleção feminina de vôlei no Japão não mereceu um único centímetro, uma só vírgula na página mais nobre do jornal.

Derrotadas pelo ótimo time da Rússia no fim de uma campanha empolgante, as bravas e talentosas lutadoras das quadras não  conseguiram mais que a submanchete do caderno de esportes. Sob a foto da líbero Fabi em lágrimas, uma única palavra — VICE — bastou para traduzir a decepção dos editores: nestes trêfegos trópicos, como ensinou Nelson Picquet, o segundo colocado é o primeiro dos últimos. Coerentemente, o noticiário comprimido em menos de duas páginas internas em formato tabloide evocava uma misteriosa “síndrome da Rússia” para atribuir o resultado do jogo não aos acertos das adversárias, mas aos erros das brasileiras.

Nada sobre a medalha de ouro conquistada nos Jogos de 2008, nada sobre as aulas práticas ministradas durante a competição por José Roberto Guimarães, único técnico do planeta a vencer uma Olimpíada com a seleção masculina e outra com a feminina. O texto reiterou que o Brasil trata genuínos vencedores com a arrogância de quem nunca soube o que é perder, embora ganhe só de vez em quando. Em contrapartida, como atestou a mesma edição da Folha, reverencia campeões de araque com os minuetos e salamaleques de subalterno vocacional.

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O espaço que faltou para a valentia e o talento da seleção de vôlei sobrou para o palavrório triunfalista do chanceler Celso Amorim. A entrevista de uma página foi destacada na capa com uma chamada de 10 linhas e o título que, inspirado numa das passagens do hino à vassalagem, reverberou a cretinice de antologia: “Para ministro, Pelé só teve um, e igual a Lula não vai ter”.  A Folha achou pouco subestimar a medalha de prata da seleção de vôlei. Fez questão de também encampar a afronta ao rei do País do Futebol: se o presidente é igual ao maior jogador de futebol de todos os tempos, então o homem que Amorim chama de “Nosso Guia” é o maior governante desde o Dia da Criação.

Ministro das Relações Exteriores de Itamar Franco e de Lula, o diplomata que há oito anos desonra o Itamaraty é sobretudo um áulico a serviço de qualquer presidente, regime ou ideologia. É apenas um duplo equívoco à caça de emprego. Mas quem canta as maravilhas do país do faz-de-conta rouba espaço de gente que melhora o país real. No pódio em Tóquio, as vice-campeãs do mundo choraram a derrota e pediram desculpas aos brasileiros — como se devessem alguma. Na entrevista, Amorim nem pediu licença para protagonizar o espetáculo da desfaçatez.

“Com o governo acabando, posso falar tranquilamente que o Lula é uma figura excepcional, você vai contar três ou quatro líderes políticos como ele no século”, delirou numa das respostas a Eliane Cantanhêde. “É quase da dimensão do Nelson Mandela, e só não é igual porque a situação lá na África do Sul era mais dramática”. Depois de ouvi-lo desdenhar dos direitos humanos, zombar dos presos políticos cubanos, louvar feitos imaginários consumados pelo governante incomparável e qualificar a política externa brasileira de “ativa e altiva”, a entrevistadora perguntou-lhe o que faria diferente caso pudesse voltar atrás. Resposta: “Vou falar como a Edith Piaf: ‘Je ne regrette rien’”. Ele não lamenta nada.

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O problema do Brasil, já se disse aqui mais de uma vez, não é o complexo de vira-lata. Essa disfunção, diagnosticada por Nelson Rodrigues, cingiu-se ao País do Futebol — e só deu as caras entre 1950, quando a derrota na final contra o Uruguai transformou o brasileiro no último dos torcedores, e 1958, quando a Seleção triunfou na Copa da Suécia. O verdadeiro problema nacional é o contrário do complexo de vira-lata: é a síndrome de com-o-Brasil-ninguém-pode.

Ouve-se ainda no útero que a nossa bandeira é a mais bonita do mundo, embora ninguém se atreva a sair por aí trajando camisa azul, calça verde e paletó amarelo. Ouve-se já no berço que o nosso hino é o mais bonito do mundo, muitos sustenidos e bemóis à frente da Marselhesa. E ouve-se há oito anos que o país com quem ninguém pode é presidido por um governante que pode tudo. Até trazer a Olímpiada para o Rio e ganhar, se preciso vestindo ele próprio o uniforme verde e amarelo, todas as medalhas de ouro.

A Era da Mediocridade aposentou valores, subverteu critérios e colocou o país do avesso. Em tempos assim, um Celso Amorim parece valer mais que a seleção de vôlei. O consolo é saber que isso passa. Daqui a muitos anos, as jovens campeãs olímpicas serão lembradas com carinho e admiração. Mas ninguém terá a menor ideia de quem foi Amorim. O chanceler de Lula é só um nada a caminho da lata de lixo da História.

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