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Por Coluna
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O bode na sala

Poucos se deram conta de que Lewandowski autorizou um aumento do funcionalismo e que Rodrigo Maia promulgou uma lei que permite às cidades gastar mais

Por Fernando Gabeira
Atualizado em 30 jul 2020, 20h04 - Publicado em 24 dez 2018, 13h07

Fernando Gabeira 

No final de ano, costumo tirar uma semaninha de descanso. Continuo lendo e escrevendo. Mas tento me libertar dessa gigantesca máquina de informação que nos bombardeia, incessantemente, com notícias, imagens, logotipos, memes, posts e tuítes. É uma forma de sobreviver ao estresse, à produção de cortisol que inibe a glicose no hipocampo e danifica a memória. Com o tempo, um cérebro absolutamente informado corre o risco de ser um cérebro em pandarecos.

Mas, como sou brasileiro, tomo minhas precauções. No início do mês, escrevi um artigo intitulado “Cuidado com dezembro”. É o mês que os políticos preferem para suas decisões absurdas, pois há férias, e o espírito de Natal embala as pessoas comuns. O artigo era resultado de uma experiência de meio século, pois seu ponto de partida foi o AI-5, em 13 de dezembro de 68.

Vivendo e aprendendo. As táticas parecem cada vez mais sofisticadas. Marco Aurélio decidiu numa canetada libertar 169 mil presos (segundo a Procuradoria-Geral da República), Lula inclusive. Não deu certo. Era claro que não daria. Lula nem chegou a arrumar as malas.

No meio do ano, acompanhei da Rússia uma tentativa semelhante. Para mim, era evidente que não daria, mas a cena política teve sua dose de drama. A decisão de Marco Aurélio era tão absurda que durou apenas algumas horas. Foi derrubada, e todos que a temiam respiraram aliviados.

O que há de novo neste dezembro é a tática do bode na sala. A libertação de 169 mil presos cumpriria esse papel. O bode foi retirado, e poucos se deram conta de que Lewandowski autorizou um aumento do funcionalismo, que Rodrigo Maia promulgou uma lei que permite às cidades gastar mais, e os deputados deitaram e rolaram nos projetos de isenção fiscal e aumento do Fundo Partidário. Eles sabem que isso tudo resulta em quebradeira, mas contam, como sempre contaram, com alguma forma de aumentar impostos.

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A relativa frieza não é incapacidade de me indignar. Apenas tento economizar energia, sobretudo depois de um ano tão intenso como foi 2018.

Se mergulhar acriticamente no turbilhão de notícias e polêmicas nacionais, estou perdido. De um modo geral, tenho acesso a elas depois de um dia de trabalho na rua ou no mato.

Às vezes, consigo uma precária conexão no hotel e caio num intenso debate sobre Jesus na goiabeira. Sinceramente, por mais calorosos que sejam os argumentos, minha pergunta não faz sentido, apesar de falarmos o mesmo idioma: eram goiabas brancas ou vermelhas?

Isso porque andei lendo um texto sobre Karl Barth, e sua mensagem é clara: traduzir a revelação divina em termos que não são os da fé está destinado ao fracasso.

Na infância, a árvore de preferência é a jabuticabeira. Havia a chácara de um turco, e subíamos para colher algumas jabuticabas. Os empregados às vezes respondiam com tiro de sal e atingiam o bumbum dos meninos. Doía.

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Assim como no sertão de Guimarães Rosa, Deus, se vier, terá de vir armado; na chácara do turco, Jesus teria de vir acolchoado.

Observo que, nos Estados Unidos, alguns escritores acham que o ano de 2018 foi de muita raiva. Isso aconteceu também no Brasil. Eles propõem a catarse e a reconciliação como antídoto.

É um remédio fácil de receitar. O difícil é encontrar a fórmula. Em dois lugares importantes, Minas e São Paulo, a diplomação dos deputados, que sempre é uma cerimônia tediosa, resultou em pancadaria.

Um livro chamado “Seis propostas para o próximo milênio” aconselhou a leveza como uma das qualidades para o século XXI. No Brasil de hoje, consigo apenas uma semaninha para levezas. Perco uma parte de dezembro advertindo sobre armadilhas da época e entro janeiro com um pé atrás, desde o naufrágio do Bateau Mouche e o deslizamento na Enseada do Bananal, em Angra.

Muito possivelmente, teremos um ano melhor. Se não houver reconciliação, apenas um pouco mais de tolerância já pode ajudar. O resto são chuvas de verão, seu potencial destruidor, e cerca de 500 cidades brasileiras com um índice absurdo de infestação de Aedes aegypti, o mosquito de dengue e chicungunha.

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Mas isso já é falar de volta às aulas, em pleno período de férias. Por enquanto, vamos saudar o bode na sala: não soltaram 169 mil criminosos. Cobraram apenas alguns bilhões pela gentileza.

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