Promoção do Ano: VEJA por apenas 4,00/mês
Imagem Blog

Augusto Nunes

Por Coluna Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Com palavras e imagens, esta página tenta apressar a chegada do futuro que o Brasil espera deitado em berço esplêndido. E lembrar aos sem-memória o que não pode ser esquecido. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Martinho da Vila resume o Brasil: “Devagar, devagarinho”

A canção expressa com graça a irritante retomada da economia brasileira. Ela vai tão devagar que até parece que não sai do lugar

Por Deonísio da Silva
Atualizado em 4 jun 2024, 16h47 - Publicado em 4 mar 2018, 11h24

Deonísio da Silva

No Rio, o destino me fez professor de Martinho da Vila, autor de versos memoráveis de nosso cancioneiro. Com ele sempre aprendi muito à distância, que é o modo como talvez ele agora aprenda algo comigo, uma vez que também estas aulas são ministradas à distância.

Que bela lição nessa amostra: “Devagar/ Devagarinho/ É que a gente chega lá/ Se você não acredita/ Você pode tropeçar”.

Martinho da Vila é uma daquelas glórias brasileiras de quem todos podem se orgulhar. É homem afável, gentil, tremendamente observador: nada parece escapar de seus afiados sentidos.

Outro dia assisti a um diálogo entre ele e o embaixador Jerônimo Moscardo em reunião numa mesa de bar, nas cercanias da Academia Brasileira de Letras, e me vi boquiaberto admirando a prosa entusiasta do diplomata e ex-ministro da Cultura no governo Itamar Franco, em claro contraste com a quietude reflexiva e atenta de Martinho da Vila.

O diplomata vituperava um autor americano cujo texto deixava bem claro um projeto de esculhambar a música brasileira genuína, substituindo-a por pontas de lança destruidoras do ritmo e da melodia nacionais.

Continua após a publicidade

O cantor fluminense de Duas Barras ouviu atentamente nosso amigo cearense, senhor de grandes poderes de persuasão, levou o texto para ler com calma em casa e dias depois, estribado em seu talento e experiência, um saber de experiências feito, concluiu que o samba já venceu no passado e voltará a vencer. Mas reconheceu real e perigosa a ameaça do americano.

Na mesma canção que abre esta crônica diz Martinho da Vila: “Eu conheci um cara/ Que queria o mundo abarcar/ Mas de repente/ Deu com a cara no asfalto/ Se virou, olhou pro alto/ Com vontade de chorar”.

Apoiado nestas convicções, à moda de Martinho sem pressa, conclui muito coerentemente que “Devagar,/ Devagarinho, / É que a gente chega lá” (…) “Vou seguindo o meu caminho,/ Sei aonde vou chegar”.

Nos anos sessenta, ele emplacara, não apenas um sucesso, mas uma profecia com O Pequeno Burguês: “Felicidade!/ Passei no vestibular,/ Mas a faculdade/ É particular”.

O narrador, depois de muitas peripécias, comuns àqueles que o governo chama estudantes que trabalham, mas que são em verdade trabalhadores que estudam, pois a principal ocupação não era, como não é ainda, estudar, e sim trabalhar para pagar os estudos, não tem dinheiro para pagar as taxas que incluem o anel, o diploma e a beca de formando. Por isso não pode comparecer  à formatura.

Continua após a publicidade

Todavia, repele com firmeza o título de pequeno burguês: E depois de tantos anos/ Só decepções, desenganos/ Dizem que sou um burguês/ Muito privilegiado/ Mas burgueses são vocês/ Eu não passo/ De um pobre coitado/ E quem quiser ser como eu Vai ter é que penar um bocado”.

Pensando bem, à luz de suas canções tão fascinantes e de forte conteúdo social, Martinho da Vila não é aluno. Ele é professor! E, por justo reconhecimento, a UFRJ concedeu-lhe no ano passado o título de Doutor Honoris Causa.

É proverbial o elogio da vagareza, muito bem sintetizado no dito do dialeto italiano “piano, piano, se va lontano” (devagar se vai longe), enquanto a pressa, dada como inimiga da perfeição, é vitimada neste outro dito bem brasileiro: “apressado come cru”.

Endossada na música, no ritmo e no balanço que lhe são característicos, a canção de Martinho da Vila expressa com graça a irritante retomada da economia brasileira. Neste caso, vai tão devagar que até parece que não sai do lugar.

*Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá
https://portal.estacio.br/instituto-da-palavra

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Veja e Vote.

A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

OFERTA
VEJA E VOTE

Digital Veja e Vote
Digital Veja e Vote

Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

2 meses por 8,00
(equivalente a 4,00/mês)

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

a partir de 49,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.