J.R. Guzzo: O mistério dos 407 a 3
O PSDB, como estamos cansados de saber, é um partido aos pedaços. Sua última decisão é um enigma
Publicado no Blog Fatos
É preciso ficar prestando muita atenção nas últimas notícias, hoje em dia, para não se atrapalhar com os acontecimentos da política. Você pode se achar bem informado às 9 horas da manhã – e não saber mais nada ao meio dia. Os fatos não apenas mudam depressa. Mudam na direção contrária ao que se poderia prever na véspera, ou até menos que isso – e sabe lá que rumo vão tomar na mudança seguinte, que já deve estar vindo por aí. No sábado, por exemplo, o PSDB, partido que em geral está sempre no alto da tabela de classificação no campeonato político brasileiro, fez a sua convenção nacional – em geral, uma chatice que não tem nada a ver com nenhum interesse que você possa ter. Mas desta vez havia, pelo menos, a expectativa de uma pavorosa briga de arquibancada em campo de futebol. O grande e insolúvel problema, segundo as notícias e análises que o público recebe há meses, era a desunião do partido. Despedaçado por guerras internas insuperáveis, o PSDB teria se tornado incapaz de formar qualquer tipo de maioria, a respeito de qualquer questão. Seria impossível, mais do que tudo, conseguirem eleger uma liderança – nenhum candidato a líder teria condições de juntar mais liderados que o adversário. Desunido e desnorteado, o partido sairia da convenção com um atestado de óbito no bolso.
Ao fim da reunião, na presença da vida real, fazem as contas e resulta o seguinte: o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, foi eleito presidente do PSDB por 407 votos a 3. Como assim? O partido não estava absolutamente desunido? Como pode, estando aos pedaços, eleger um novo presidente com maioria de 99,25% dos votos da convenção – na prática, o homem que vai ser o seu candidato nas eleições presidenciais de 2018? É um mistério dentro de um enigma. Quanto mais se anuncia que alguma situação está indo para o ponto “A”, maiores são as chances de que ela já esteja chegando ao ponto “B”, ou “C”, ou qualquer outra letra do alfabeto.
O PSDB é um partido muito abaixo do que o Brasil precisa, no quesito “partidos”, para ser um país melhor do que é. Na prática, por omissão, covardia, incompetência e pelos seus próprios vícios, foi um cúmplice do PT e do PMDB na destruição do país de 2003 até o despejo de Dilma Rousseff em 31 de agosto de 2016 – e, a partir daí, já como protagonista, em diversas das desgraças que vieram depois. Vale o que vale, e nem uma lira a mais. Mas também não vale menos do que é: não pode existir desunião fatal em nenhum ambiente onde acontecem votações de 407 a 3. Sustentar isso, como se sustentava até a véspera da convenção, desrespeita os fatos, ofende a lógica e desinforma o público.