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Antonio Vieira: Um Gulag pós-moderno

ANTONIO VIEIRA Pelo que se tem observado com as reações à vinda para o país de médicos cubanos, pode-se dizer que o regime petista se meteu num aranzel cabeludo. As críticas que têm pipocado contra as medidas governamentais não possuem, verdade seja dita, qualquer tipo de aversão xenófoba. A xenofobia não é marca distintiva de […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 05h32 - Publicado em 27 ago 2013, 14h10

ANTONIO VIEIRA

Pelo que se tem observado com as reações à vinda para o país de médicos cubanos, pode-se dizer que o regime petista se meteu num aranzel cabeludo. As críticas que têm pipocado contra as medidas governamentais não possuem, verdade seja dita, qualquer tipo de aversão xenófoba. A xenofobia não é marca distintiva de nossos costumes, reitere-se. Os atletas de Cuba que praticam o vôlei, por exemplo, são admirados pelos torcedores dos times onde jogam aqui no Brasil.

Aquilo que está sendo objeto de polêmica, de fato, é o método, a maneira como os governos – brasileiro e cubano – estão a tratar da questão. Médicos de outros países (Portugal, Espanha, Argentina e outros) vêm para o Brasil como resultado de uma escolha pessoal livre e independente. Iguais a outros tipos de profissionais, sabem que precisam obedecer à legislação local caso queiram se estabelecer para ganhar o pão de cada dia. Podem receber até algum benefício que estimule sua vinda, sem que isso signifique algo reprovável.

O problema atual com os cubanos é, portanto, a maroteira como sua vinda está sendo tratada. O governo brasileiro está, sim, realmente, patrocinando um negócio jurídico internacional com o governo cubano eivado de ilicitude e de ilegitimidade. Com o pretexto de atender a uma necessidade de serviços de saúde em áreas desassistidas no Brasil, o regime petista criou um acordo de natureza mercenária que viola frontalmente o espírito de programas de intercâmbio e de assistência mútua que sociedades livres e democráticas estabelecem entre si ou com entidades internacionais.

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O Ministro Carlos Ayres Britto, na cerimônia de abertura do I Encontro Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, algum tempo atrás, disse claramente que o poder público tem a obrigação de enfrentar esse crime em prol de uma sociedade livre, justa e solidária – em sintonia com o previsto na Carta Magna. O ex-presidente do STF condenou o resquício renitente e teimoso, estrutural, histórico e cultural dos quase quatro séculos de escravidão e admitiu, inclusive, a contaminação do Poder Judiciário por meio de interpretações lenientes e frouxas, para não dizer cúmplices da escravidão.

As decisões do governo brasileiro, por outro lado, flertam de maneira indecorosa com transgressões que vão além da dimensão trabalhista. Elas são mais sérias e mais rombudas, estando capituladas no artigo 149 do Código Penal Brasileiro que reza:

“Reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”.

Esta é, pois, uma situação aberrante em termos históricos e civilizatórios, considerando-se o já enfadonho, rebarbativo mesmo, marco do Estado Democrático de Direito. A doutrina e a jurisprudência costumam se referir a casos de violação ao artigo 149 do Código Penal de maneira restritiva, apontando, como sujeitos ativos do crime, brutais empreiteiros, carvoeiros, fazendeiros e outros proprietários agrícolas moradores nos fundos rincões do país, herdeiros presumidos das práticas cruéis de seus ancestrais contra a força de trabalho – a que subjugavam – constrangendo-a a servi-los compulsoriamente por meio de incontáveis subterfúgios.

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Se aquela gente truculenta se comporta assim de maneira tão ignóbil, pelo bem da verdade histórica haveria que se considerar, então, a chance do próprio Estado, na atualidade, agir de modo similar ao de proprietários privados, quando reduzem outrem à situação análoga à de trabalhador escravo. Afinal há precedentes. Não era incomum, à época da escravidão legal, que existisse uma categoria específica de cativos – denominada “escravos da nação” – assim compreendidos aqueles que eram propriedade de entes do poder público com o mesmo status de semoventes como bois, cavalos e muares.

Qual o significado da expressão “trabalhos forçados” contida logo no início do artigo 149 do Código Penal? A resposta é indubitável: sua ocorrência fere de morte a liberdade individual, na medida em que obriga alguém a fazer o que não está obrigado pela lei. Impedir quem quer que seja de exercer seus direitos deambulatórios, ou de trabalhar para quem e onde quiser é, sem dúvida, a essência, o cerne da escravização. Contemporaneamente, situações vexatórias equivalentes foram, ou são, observadas em países de natureza totalitária sempre sob o aplauso entusiástico de epígonos do stalinismo, surpreendentemente vivo e atuante nas hostes do PT e do PC do B.

Nem o fato das vítimas reduzidas à condição análoga à de escravo – neste Gulag pós-moderno que parece estar se experimentando no país – receber pecúnia ou salário em pagamento, modifica sua situação infamante. Não era difícil observar, na tradição escravocrata brasileira, que os chamados “escravos ou negros de ganho” fossem remunerados com alguma quantia, o que chegou a possibilitar a muitos cativos acumular o suficiente para obter a própria alforria.

Medida extrema de fuga poderia ser tomada pelo cativo, inclusive com trágico apelo à via do suicídio, ato a que muitos perseguidos e espoliados se viram, se vêem, tentados a aderir, materializando a maneira última de escapar dos constrangimentos a que são submetidos. Vejamos o desenrolar dos fatos e os desdobramentos políticos e sociais que deles certamente derivarão.

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