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Por Filipe Vilicic
Crônicas do mundo tecnológico e ultraconectado de hoje. Por Filipe Vilicic, autor de 'O Clube dos Youtubers' e de 'O Clique de 1 Bilhão de Dólares'.
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Golden shower e a cortina de fumaça no Twitter

Será que as redes sociais se tornaram campos para versões virtuais de uma manjada tática militar conhecida por qualquer capitão?

Por Filipe Vilicic 8 mar 2019, 15h05

Nesses dias, recordei-me de uma conversa que tive com um amigo – já falecido – que era oficial (tenente) do Exército. Desde pequeno me interesso por literatura acerca da história militar das civilizações. Não por acaso jogava Counter-Strike quando pré-adolescente, em exames vocacionais a carreira “militar” sempre aparecia entre as três primeiras sugestões (junto com jornalismo e artes) e em meu quarto acumulava livros dos mais, digamos assim, esquisitos para um jovem – como um que mostrava como era por dentro de navios de guerra, jatos etc.

Papo vai, papo vem, ele começou a me dar uma aula de termos militares. Num dado momento – e não me lembro ao certo como se chegou ao tópico –, começamos a falar de “cortina de fumaça”. Explicou-me que, no campo de batalha (ele atuava especialmente nas fronteiras), a tática ia muito além de lançar granadas de fumaça. Abrangia toda sorte de distração criada para ofuscar os movimentos da tropa perante o inimigo.

Pesquisei então sobre a origem da expressão. Há quem crave que a primeira “cortina de fumaça” foi criada por navios holandeses em batalha contra portugueses em Macau, no ano de 1622. Assim como tem quem diga que esse tipo de estratégia sempre foi adotada em conflitos, de formas variadas.

Há muitas maneiras de se fazer a tal cortina de fumaça na vida real. Com tanques, carros, aviões, obscurecendo radares etc. Então, é natural que em um tempo no qual se diz tanto que novos tipos de guerras são travadas via internet (vide o uso do Twitter por Donald Trump em toda a crise envolvendo a Coreia do Norte), tenham sido criadas cortinas de fumaça virtuais.

O uso da tática no ambiente virtual pode ser intencional ou não. Mas funciona, convenhamos. E o Twitter parece se tornar o palco ideal para tal.

Quando se critica o congelamento das verbas públicas nos EUA, ou a forma de lidar com Kim Jong-un, repara-se como logo Trump solta umas polêmicas paralelas (como sobre atores de Hollywood) no Twitter. Usualmente, tocando em assuntos que, em teoria, nada deveriam ter da atenção do presidente de uma nação democrática.

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No Brasil tem ocorrido o mesmo. E não é de agora. Na fase do PT, era comum que, quando expostos casos de corrupção, logo líderes do partido surgiam pela internet mudando o foco (e usualmente em tentativa de culpar quem expunha os crimes, a exemplo da imprensa).

No entanto, ao que se indica a tática da cortina de fumaça virtual ganhou novos moldes – ainda não se sabe se mais sofisticados, ou se involuntariamente eficientes – nos tempos de Bolsonaro. O caso da chuva de ouro (tema também de reportagem de VEJA) é apenas mais um exemplo.

Em período no qual só se falava das laranjadas do PSL, em que foliões criticavam o governo, no qual olhares ácidos ao novo comandante do país eram traduzidos em desfiles nas avenidas, em que pipocavam dúvidas em torno da reforma da Previdência… publicou-se o já tão-falado Twitter da “golden shower”, em sequência a um vídeo que jamais deveria ser compartilhado por uma rede social pública – poderia se restringir a redes exclusivamente (ou assim se espera) frequentadas por adultos, como o site Pornhub.

Nisso, o burburinho deixou de ser acerca de frutas cítricas. Por um tempo, esqueceu-se da chuva de ouro de cheques questionáveis em caixas eletrônicos do Rio de Janeiro. Parou-se até de se falar tanto de ministros suspeitos de falcatruas e de investigações que destacam indivíduos de sobrenome Bolsonaro. Mesmo que escândalos ligados a essas notícias continuassem a aparecer, a população não mudava de assunto.

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A cortina de fumaça do Twitter deu certo. Repito: intencionalmente, ou não. E, por um tempo, só se debatia um assunto em nada presidencial: o fetiche da golden shower (um que – e nada contra indivíduos terem fetiches entre suas quatro paredes – parece atrair mais de um presidente neste planeta).

****

Termino com uma dica de leitura (dentre tantos livros acerca do assunto): Lá Vem Todo Mundo, de Clay Shirky, professor e pesquisador de Columbia e da NYU, especialista em analisar o impacto social e econômico da internet. Na obra, ele versa sobre como as novas ferramentas tecnológicas transformam as dinâmicas de grupo das sociedades. É interessante por mostrar, teoricamente, como se formaram as redes sociais. Só um porém: publicado há 10 anos, em 2008, o texto não trata de algumas consequências negativas da nova lógica da manada digital (a exemplo da formação de cortinas de fumaça no Twitter).

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