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Degelo intenso dos picos dos Alpes põe em risco famosas estações de esqui

Grupo de especialistas dedica-se no momento a redefinir um pedaço da fronteira entre Suíça e Itália perdido no meio das águas

Por Vitória Barreto Atualizado em 16 set 2022, 10h35 - Publicado em 16 set 2022, 06h00
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  • Paraíso dos alpinistas e dos esquiadores, os Alpes, maior e mais alta cadeia de montanhas da Europa, são cartão-postal dos mais conhecidos, celebrado em filmes e fotos turísticas pelas geleiras imponentes e neve a perder de vista. Infelizmente, é também um dos pontos do planeta que mais diretamente têm sentido os efeitos das mudanças climáticas em curso. Isso mesmo: os milenares picos alpinos, formados na última Era do Gelo, estão derretendo em ritmo acelerado, alterando a paisagem, causando acidentes e criando até altercações geográficas — um grupo de especialistas dedica-se no momento a redefinir um pedaço da fronteira entre Suíça e Itália perdido no meio das águas.

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    As medições não deixam dúvida sobre o estreitamento da imensidão branca. “A massa de neve nos Alpes estava muito abaixo da média em abril”, afirma Andreas Linsbauer, pesquisador do Glacier Monitoring in Switzerland, sobre os dados obtidos no fim do inverno no Hemisfério Norte pela instituição que documenta e monitora as mudanças de longo prazo das geleiras nos Alpes. O verão, claro, intensificou a tendência: em um ano, constatou-se a perda de 400 milhões de toneladas de gelo — um montante que não será integralmente reposto.

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    2016 - A mesma paisagem em passado recente: o clássico cartão-postal reflete ano a ano as intensas mudanças climáticas -
    2016 - A mesma paisagem em passado recente: o clássico cartão-postal reflete ano a ano as intensas mudanças climáticas – (Sean Gallup/Getty Images)

    O ponto de atrito fronteiriço é a bacia formada pelo degelo anual da geleira de Theodul, entre Itália e Suíça, 3 480 metros acima do nível do mar — a água escorria pelos dois lados, um em cada país, e a linha de fronteira passava bem no meio. A contínua redução da geleira, no entanto, alterou a localização da bacia a tal ponto que ameaça plantar o Rifugio Guide del Cervino, um albergue italiano no topo da montanha Testa Grigia, em território suíço. A VEJA, o topógrafo Alain Wicht, chefe da agência nacional de mapeamento da Suíça, confirmou que seu país negocia com os italianos a demarcação de uma nova fronteira. “Qualquer que seja o resultado, o refúgio deve permanecer italiano”, adianta. Segundo os cientistas que estudam as geleiras europeias, a neve do inverno dificilmente cairá em volume suficiente para repor a perda registrada nos Alpes. “Ela foi intensa no ano hidrológico que começou em outubro de 2021 e acaba neste mês”, alerta Linsbauer.

    Para piorar, intensas rajadas de vento depositaram nos Alpes a poeira vinda do Deserto do Saara e ela mudou a cor da neve para um marrom amarelado que acelera o derretimento, já que o branco reflete melhor o calor do sol. Além disso, desde maio o continente vem passando por inclementes ondas de calor que acirram o derretimento do gelo no alto das montanhas. Os últimos dados divulgados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão da ONU, mostram que a temperatura nos picos gelados subiu 0,3 grau na última década, duas vezes mais rápido do que a média global. Caso as mudanças climáticas não sejam combatidas, a previsão é que as geleiras dos Alpes definhem e desapareçam, vendo sumir mais de 80% de sua massa até 2100.

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    arte Alpes

    O desastre ambiental já causou acidentes e fatalidades em diversos trechos da cadeia de montanhas. Em julho, seis pessoas morreram em um deslizamento na banda italiana. Em agosto, dois atletas perderam a vida no Mont Blanc, a mais elevada montanha alpina: o corpo de um ultramaratonista brasileiro cuja identidade não foi divulgada, provavelmente devido à queda de uma ribanceira, e Adèle Milloz, 26 anos, campeã mundial de esqui, que escalava um flanco da montanha quando treinava, com uma colega que também morreu, para se tornar guia de montanhismo. A causa dos acidentes ainda está sendo investigada, mas tudo aponta para a maior instabilidade do terreno devido às alterações climáticas. Os alpinistas têm sido alertados para adiar suas excursões por risco de avalanches das rochas expostas pelo degelo. Além disso, quem pretender subir até o topo do Mont Blanc a partir da Rota Goûter, a que sai da França, terá de pagar 15 000 euros (80 000 reais) para cobrir possíveis custos de resgate.

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    Os moradores das regiões montanhosas sentem as mudanças no seu cotidiano. “A neve que cai agora é diferente da de dez anos atrás. A gente esquiava até no verão. Agora, subimos 3 000 metros e nada”, reclama o suíço-­brasileiro Claudio Benchimol, 22 anos, que mora em Lausanne, na Suíça. Antes do calor atual, a Agência Europeia do Meio Ambiente já calculava que, confirmando-se a previsão de aumento de 2 graus nos Alpes até 2050, apenas 61% das áreas próprias para esqui poderão ser consideradas confiáveis. Os otimistas observam, porém, que os verões mais quentes vão atrair turistas para as montanhas mesmo sem neve, em busca de temperaturas mais amenas. Os cientistas concordam em um ponto: a permanência das geleiras alpinas depende do cumprimento das metas de redução de carbono e de outras medidas contidas em acordos internacionais. Sem isso, é provável que vá tudo por água abaixo.

    Publicado em VEJA de 21 de setembro de 2022, edição nº 2807

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