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#28 O ANIMAL: Semelhantes a nós

Estudos científicos descobriram que o comportamento humano é muito mais parecido com o de outras espécies do que se imaginava 

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 21 set 2018, 07h00 - Publicado em 21 set 2018, 07h00
SELFIE - “Autorretrato” do macaco Naruto, feito em 2011, na Indonésia, com a câmera do inglês David Slater: disputa autoral (//.)

“Então disse Deus: ‘Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais grandes de toda a Terra’.” Essa é uma das passagens mais célebres do Gênesis, o primeiro livro da Bíblia. Afinal, ali está definida a identificação do ser humano com a divindade. Nas últimas décadas, porém, o trecho ganhou notoriedade por outro motivo: grupos de ambientalistas começaram a enxergar na convocação de supremacia humana na Terra a mais remota explicação para os maus-tratos que impusemos aos animais.

Uma das vozes mais ativas dessa vertente é a do filósofo australiano Peter Singer. Para ele, “tentar provar nossa superioridade não pode estilhaçar um fato duro: no sofrimento, os bichos são nossos iguais”. Singer é autor de uma obra pioneira acerca do assunto. Publicada em 1975, Libertação Animal tornou-se a base filosófica para os movimentos conservacionistas que ganharam força desde então, levando, por exemplo, à criação, em 1980, da fundação americana Peta (na sigla em inglês, “pessoas em favor do tratamento ético dos animais”). Muito atuante, a instituição pretendia, entre outras coisas, que a autoria da imagem ao lado, feita em 2011, na reserva de Tangkoko, na Indonésia, fosse creditada ao macaco-de-crista Naruto, que acabou clicando a si mesmo ao manipular a câmera do fotógrafo inglês David Slater, que se encontrava posicionada em um tripé. (No ano passado, foi fechado um acordo num tribunal de São Francisco, nos Estados Unidos, pelo qual Slater se comprometeu a destinar 25% da renda gerada pela foto a entidades que zelam por Naruto e outros animais de sua espécie que vivem em território javanês.)

As ideias de Peter Singer acabariam ganhando respaldo científico. Até meados do século passado ainda era praxe nos separar dos outros animais, principalmente sob o argumento de que apenas nós teríamos consciência da própria existência. Seguia-se o que fora dito, em 1798, pelo filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804): “O fato de que o ser humano consegue ter a representação do ‘eu’ o eleva infinitamente acima de outros seres na Terra”.

Atualmente, a máxima de Kant não se aplicaria. Para começar, a ciência descobriu que muitos bichos também possuem consciência de si mesmos — golfinhos e primatas se reconhecem em espelhos. “A nossa percepção em relação aos animais se transformou de 25 anos para cá”, disse a VEJA o primatólogo holandês Frans de Waal, professor da Universidade de Emory, nos Estados Unidos, e autor de livros que analisam o comportamento social de chimpanzés e bonobos — estes, aliás, em termos genéticos, 96% idênticos a nós (leia a reportagem). “Passamos a compreender que não podemos tratar os bichos como máquinas. Tanto que hoje existem leis que os protegem, como as que proíbem, nos EUA, testes com macacos”, frisa De Waal.

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Numa de suas obras mais conhecidas, A Era da Empatia (2009), o primatólogo mostra, por meio de pesquisas, como a maioria dos mamíferos tem habilidades cognitivas similares às dos homens. Já em Política dos Chimpanzés (1982), fruto de um estudo de seis anos que realizou em uma colônia de macacos, ele revela que os animais são capazes de constituir sociedades.

Algumas teorias cujo princípio é a valorização dos seres não humanos, hoje amplamente aceitas pela comunidade científica, começaram a ganhar força com o trabalho de duas cientistas: a americana Dian Fossey (1932-1985) e a inglesa Jane Goodall. Em experimentos iniciados em 1960 na Tanzânia, elas foram as primeiras pesquisadoras a tratar seu objeto de estudo, os gorilas e os chimpanzés, não como números, mas por meio de nomes. Seus trabalhos ajudaram a consagrar descobertas que mostraram ao mundo como os animais, incluindo os domésticos, expressam comportamentos e sentimentos que, no passado, eram considerados exclusivamente humanos. Amar e odiar, por exemplo. Sim, temos mais semelhanças com os bichos do mar, do céu e da terra do que diferenças — e isso, em vez de nos diminuir, só nos engrandece.

Publicado em VEJA de 26 de setembro de 2018, edição nº 2601 

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