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O escolhido

Edir Macedo sinaliza que o genro vai sucedê-lo no comando da Universal com a tarefa de modernizar a igreja e atrair a classe média 

Por Thiago Prado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Eduardo F. Filho Atualizado em 13 out 2017, 06h00 - Publicado em 13 out 2017, 06h00

O suspense durou quase dez anos. No último dia 5, de sua sala de teleconferências no enorme Templo de Salomão, em São Paulo, o bispo Edir Macedo anunciou aos principais líderes da Igreja Universal no mundo o nome do seu número 2 — e, nessa condição, provável sucessor e herdeiro de um império que reúne 10 000 igrejas em mais de 100 países, com 9,5 milhões de fiéis e faturamento anual que ultrapassa 1,4 bilhão de reais só em doações. O escolhido é o genro Renato Cardoso, casado com Cristiane Cardoso, sua filha mais velha. O anúncio selou o fim de uma década de mistério e também o desfecho da guerra silenciosa que fazia anos vinha sendo travada nos subterrâneos da Igreja Universal. Nesse período, além de Renato Cardoso, disputaram o posto de provável herdeiro de um dos maiores conglomerados evangélicos do mundo os bispos Clodomir Santos, Honorilton Gonçalves, Romualdo Panceiro, Paulo Roberto Guimarães e Júlio Freitas — este, casado com Viviane Freitas, outra filha de Macedo. Embora a escolha de Cardoso não tenha sido propriamente uma surpresa na igreja, para alguns ela soou quase como uma traição.

Edir Macedo sempre afirmou em reuniões internas que nenhum parente seu seria detentor de cargos-chave na Universal. Com isso, pretendia sugerir que seu sucessor seria escolhido não por laços familiares, mas por mérito — uma forma de estimular a competição interna. Para bispos que, durante mais de uma década, se esmeraram para ser reconhecidos como lideranças espirituais e arrecadadores de dízimo eficientes, na esperança de credenciar-se ao posto, a nomeação do genro de Edir Macedo teve o efeito de uma rasteira — ainda que se possa alegar que “genro não é parente”.

Renato Cardoso é tido como “o filho que Macedo não teve”. O comandante da Universal, pai de duas mulheres, chegou a adotar um filho, Moyses Macedo, que hoje é funcionário da Record, mas nunca ocupou postos de confiança na igreja. Cardoso nasceu em uma família de classe média e cresceu próximo a um templo da Universal no bairro do Brás, o mesmo que abriga o Templo de Salomão, o monumental prédio de 100 000 metros quadrados inaugurado em 2014. Aos 13 anos, era obreiro da igreja e tinha por ela uma dedicação tão obsessiva a ponto de seu pai, um pequeno empresário, expulsá-lo de casa, irritado com o que considerava um comportamento fanático do filho.

Desde então, o adolescente foi criado praticamente dentro da igreja, tornando-se pastor aos 17 anos. A devoção era tanta que ele até rompeu o noivado com uma fiel oito anos mais velha, por quem se apaixonara, para continuar no ministério (em textos e artigos, Macedo sempre se manifestou contra o casamento de fiéis com mulheres mais velhas, propensas a “mandar demais” no marido — em casos excepcionais, a diferença é admissível, desde que “não ultrapasse dois anos”, preconiza o religioso).

Nessa época, a filha mais velha do bispo, Cristiane, era pouco mais que uma adolescente e já nutria sentimentos pelo jovem pastor. O rompimento entre Cardoso e a noiva abriu caminho para que a paixão dos dois frutificasse. O casamento aconteceu em 1991, dez meses depois do início do namoro — ela tinha 17 anos; ele, 19. Partiram para Nova York com a missão de expandir a Universal nos Estados Unidos e por lá ficaram três anos, até se mudarem, em 1994, para a Cidade do Cabo, na África do Sul — sempre com o objetivo de servir aos propósitos da Universal. Em Londres, a parada seguinte, Cardoso fincou a primeira bandeira da igreja em território inglês. Em 2008, o casal voltou a morar nos Estados Unidos, onde fez cursos de coaching e educação familiar. Eles retornaram ao Brasil em 2011.

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Bênção – Macedo, com a filha: genro aprovado (//Reprodução)

Hoje, o jovem bispo é uma das estrelas mais fulgurantes da igreja de Macedo. Toda quinta-feira ele surge às 20 horas em ponto no fundo do altar principal do Templo de Salomão, anunciado por trompetes. Os cerca de 1 000 fiéis presentes se levantam e as cortinas brancas transparentes que separam o altar da multidão se abrem. Cardoso, então, dá início à sua pregação ardente. A mulher, Cristiane, assiste a tudo sentada em uma cadeira escondida no interior do altar. Só aparece na metade do culto, por não mais que vinte minutos. Juntos, eles passam a falar sobre questões matrimoniais e dar conselhos a respeito do assunto. “Existe escola para quem quer aprender inglês, para quem quer ser engenheiro, mas não tem escola para o amor. Os dados de divórcios provam que as pessoas têm se unido, mas não têm as ferramentas para fazer o amor frutificar”, costuma dizer Cardoso. Ele e Cristiane são autores do best-seller Casamento Blindado, que já vendeu mais de 3,5 milhões de exemplares. O casal mora em um apartamento de 500 metros quadrados dentro do templo, um andar acima do imóvel de Macedo.

A escolha do genro contrariou a promessa do bispo de que nunca nomearia um parente para cargos-chave

Quando surgiu, em 1977, a Universal explorava cultos voltados para o exorcismo e a cura de enfermos. Um pouco mais tarde, abraçou a chamada teologia da prosperidade, trazida por Macedo dos Estados Unidos nos anos 90 e que prometia uma versão religiosa do toma lá dá cá — o divino distribuía benesses à medida que a igreja recebia doações. Esse tipo de pregação sempre atraiu as classes mais pobres, até hoje o público predominante da Universal. Agora, porém, o objetivo da igreja é aumentar sua penetração na classe média. Para isso, conta com um discurso que mistura autoajuda, coaching e empreendedorismo, especialidades do genro de Macedo.

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Cardoso, com a ajuda da mulher, foi o responsável pela implantação de dois projetos bem-sucedidos da Universal — o Godllywood e o IntelliMen. O primeiro se dispõe a ajudar mulheres a conseguir um casamento, ou mantê-lo, sendo melhores esposas e mães. O segundo promete orientar homens que desejam sucesso material e uma família sólida. Com essas iniciativas, mais o Univer — plataforma de streaming de vídeos criados para a igreja —, Cardoso construiu a fama de administrador moderno, em sintonia com as novas demandas da igreja. Enquanto os outros bispos, mais velhos e sem experiência no exterior, fazem a pregação convencional e os tradicionais pedidos de coleta de dinheiro, Cardoso, com seus programas, cria “engajamento”. É mais um CEO do que um obreiro eficiente.

Mais autoajuda, menos oração – Culto no Templo de Salomão, em São Paulo: rumo a uma nova fase (//Divulgação)

Sob seu guarda-chuva estarão nos próximos anos 98 rádios espalhadas pelo Brasil, o jornal Folha Universal, a gráfica da igreja e toda a teia de horários comprados em canais de TV. A Universal gasta por ano cerca de 1 bilhão de reais com seu gigantesco projeto de comunicação. Além de despejar dinheiro na Record para emplacar a programação da madrugada, ela hoje compra horários na Band, RedeTV! e CNT.

O genro de Macedo terá de enfrentar ainda batalhas internas, a começar pela consolidação de sua autoridade entre os novos comandados. Muitos o enxergam como um outsider. Por ter passado vários anos no exterior, Cardoso não é considerado “alguém que deu duro” para erguer a Universal. À exceção do bispo Romualdo, hoje em Portugal, as mais importantes lideranças da igreja nunca arredaram pé de perto de Macedo. Para alguns, a dedicação à obra principal era requisito básico para se credenciar na disputa pelo comando da igreja. O anúncio de Macedo encerrou uma guerra. O desafio do genro do bispo agora é não abrir outra guerra — e garantir a paz no império.

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Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2017, edição nº 2552

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