Exuberância digital
O bitcoin atrai investidores pelo mundo e bate recorde de valorização. O risco é o dinheiro virtual ser apenas uma bolha especulativa
Enquanto realizava um estudo sobre criptografia em 2009, o engenheiro elétrico norueguês Kristoffer Koch entrou em contato com uma novidade na época: o bitcoin, moeda virtual que prometia retirar o poder das instituições financeiras sobre as transações econômicas. Interessado em modernidades do labiríntico mundo da informática, Koch decidiu aventurar-se nessa descoberta e gastou pouco mais de 20 dólares para adquirir 5 000 bitcoins. A moeda então era pouquíssimo conhecida e tinha utilidade prática tão insignificante que Koch só voltou a se lembrar do assunto quatro anos mais tarde, quando soube de uma valorização expressiva nas cotações do dinheiro digital. Gastou um dia inteiro tentando relembrar sua senha e constatou que a aventura especulativa havia lhe rendido quase 890 000 dólares, o equivalente a 3 milhões de reais. Hoje é extremamente simples converter os valores digitais em qualquer moeda, por meio das corretoras especializadas espalhadas por todo o mundo, inclusive no Brasil. O engenheiro norueguês usou parte de sua fortuna para comprar um apartamento em um bairro nobre de Oslo.
O interesse de novos investidores se explica pela alta vertiginosa das cotações do bitcoin e de outras moedas virtuais, como o ethereum, nos últimos meses. Muitos analistas financeiros alertam para o risco de estar sendo formada uma bolha especulativa. Trata-se de uma exuberância digital que faz lembrar os anos do entusiasmo irracional com a valorização das ações das empresas de internet. A maior fortuna em bitcoins (pelo menos entre as declaradas) pertence ao californiano Roger Ver, de 39 anos, com um patrimônio superior a 50 milhões de dólares. De julho de 2015 até hoje, o preço do bitcoin saltou de 260 dólares para 2 625, uma valorização de quase 1 000%. A febre especulativa já aportou no Brasil. “Percebemos o aumento do interesse de investidores mais qualificados. São pessoas entre 35 e 50 anos que já investiam na bolsa e querem testar novas aplicações financeiras”, afirma Luís Augusto Schiavon, sócio-fundador da corretora Foxbit, em São Paulo.
Ainda que seu funcionamento siga incompreensível para a larga maioria da população cujos conhecimentos de informática não vão muito além de trocar mensagens e vasculhar redes sociais, há cada vez mais pessoas que enxergam nos bitcoins a possibilidade de, assim como Koch, obter excepcionais retornos financeiros. Para adquirir e negociar a moeda virtual, existem dois caminhos. O primeiro, similar à abertura de uma conta em um banco, é recorrer a uma corretora especializada. Há três grandes empresas que prestam esse serviço no Brasil. Elas exigem um processo de identificação, todo on-line. Por meio das corretoras, de maneira análoga à das casas de câmbio, é possível transformar o dinheiro na moeda corrente (reais, por exemplo) em moeda virtual. Paga-se uma taxa pelo serviço. A segunda maneira é baixar um dos vários tipos de programas gratuitos disponíveis na internet e criar a própria conta. É um processo parecido com o da criação de um e-mail. Não há a exigência de fornecer comprovantes para a identificação de usuário, e, por isso, esse é o caminho predileto de quem deseja se manter anônimo. Com sua conta pronta, é necessário encontrar, na web, alguém disposto a vender bitcoins. A forma mais simples de transformar bitcoins em dinheiro vivo é passar por uma corretora, mas isso significa, quase sempre, deixar rastros sobre a identidade dos envolvidos na transação. É fácil também fazer compras pagando com bitcoins, desde que, obviamente, o vendedor aceite a moeda virtual. O comerciante fornece um código de sua conta. Basta que o cliente faça a transferência dos seus bitcoins, algo parecido com o envio de um e-mail. É possível que isso seja realizado através de aplicativos. O vendedor pode checar em tempo real se o “depósito” foi efetuado.
Publicado em VEJA de 12 de julho de 2017, edição nº 2538