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Doria, 100 dias como prefeito: o Júnior cresceu

Antes desconhecido na política, ele agora acumula popularidade, faz agenda típica de campanha e polariza com presidenciáveis, mas nega ter Planalto na mira

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 10 abr 2017, 00h06 - Publicado em 9 abr 2017, 15h35

Na manhã do sábado 1º de abril, o prefeito João Agripino da Costa Doria Júnior (PSDB) pegou na enxada. Vestiu o uniforme do dia, de jardineiro, e, cercado por câmeras, plantou mudas numa praça na zona oeste de São Paulo, em mais uma ação do Cidade Linda, programa de zeladoria que se tornou a vedete do seu governo e ganhou projeção nacional ao ser exibido em placas publicitárias em dois jogos da seleção.

Só parava de capinar para apertar a mão de quem passava – geralmente, vinha dele a iniciativa. Estava acompanhado de crianças escoteiras e da apresentadora de TV Adriane Galisteu, que renderam ótimas imagens para as suas páginas no Facebook, Twitter e Instagram. Assim que percebia os flashs, fazia o símbolo da campanha (o V deitado) com as mãos. Parecia um comício, mas era apenas mais um dia normal do prefeito-gestor, que, com apenas 3 meses de governo – completa 100 dias nesta segunda-feira –, passou a ser cotado para a disputa presidencial de 2018.

“A impressão é que ele está em campanha eterna, mas esse é o jeito dele”, resumiu uma assessora. De fato, Doria é um comunicador nato e um bem-sucedido empresário do ramo. Se ele tem ou não pretensão de concorrer ao Planalto, é cedo para dizer. Ele passou os últimos dias negando a possibilidade. Mas é certo que há uma mobilização por parte do tucanato, de movimentos de rua e do empresariado para empurrá-lo à disputa, mesmo que isso signifique passar por cima do governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Para aliados próximos, ele nunca trairia o seu padrinho político, que lhe assegurou base partidária e enfrentou caciques da sigla para conduzi-lo à prefeitura. “Os dois têm uma conexão muito forte. Se houver alguma coisa, será um projeto único entre os dois”, diz Júlio Semeghini, que foi secretário de Desenvolvimento de Alckmin e hoje é secretário de Governo de Doria. O prefeito também sabe que dificilmente conseguiria se eleger sem ter o apoio de um cabeça do partido. “Só popularidade não é suficiente. Para eleição presidencial, é preciso coligação e tempo de TV. Esses movimentos e grupos de empresários que o apoiam não entendem nada de como funciona a política”, diz um aliado de primeira hora de Alckmin.

Como o governador dá sinais claros de que não arredará o pé da disputa pelo Planalto, boa parte do PSDB paulista acredita que o prefeito deve deixar o edifício Matarazzo para tentar uma vaga no Palácio dos Bandeirantes. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Doria admitiu que pode se candidatar ao governo estadual, caso haja um pedido de Alckmin. Se isso acontecer, ele teria que enfrentar o vice-governador Márcio França (PSB), que sonha com o posto. “Só quem não conhece bem o Doria, pode imaginar ele tendo um gesto de ingratidão. Primeiro ao povo que o elegeu para cumprir um mandato e, depois, ao Alckmin, que foi o primeiro a acreditar nele”, comentou França.

A percepção geral é que, faltando ainda um ano e cinco meses para as eleições, Doria vai “deixar rolar”, conforme as palavras de um auxiliar, principalmente num momento em que as delações da Odebrecht tendem a golpear políticos tradicionais da sigla, entre eles o senador Aécio Neves e o próprio Alckmin, ambos citados nos depoimentos. Enquanto isso, ele continua com a sua agenda frenética e o discurso antipetista e pró-privatizações que o fez conhecido além das fronteiras paulistanas.

Temas nacionais

Se na campanha ele evitou tratar de temas nacionais (recusava-se, por exemplo, a opinar sobre as mudanças na CLT aprovadas no Congresso à época), agora fala abertamente sobre esse tipo de pauta, da reforma da Previdência ao julgamento da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

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Em suas constantes aparições, sempre busca um jeito de polarizar com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, provável candidato do PT em 2018. Ao plantar uma muda de pau-brasil num evento no fim de março, fez uma dedicatória ao ex-presidente, “o maior cara de pau do Brasil”. Além disso, prometeu recentemente “usar todas as suas forças” para impedir a volta do petista e disse que iria visitá-lo na prisão para lhe dar um chocolate. Numa referência ao seu arqui-inimigo, Doria, que nunca fala palavrões, criou um xingamento direcionado aos críticos — chamá-los de “filhos do Lula” ou mandá-los para Curitiba, sede da Operação Lava Jato. Lula, por outro lado, passou a evitar os rebates — “Ele me provoca para ganhar projeção nacional”, disse o petista em entrevista a uma rádio pernambucana.

O tucano também faz questão de rivalizar com outro pré-candidato, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT-CE), que o chamou para a briga ao afirmar que “prefere mil vezes Jair Bolsonaro ao farsante do Doria”. O prefeito não deixou barato e disse que Ciro “precisava se preocupar com sua saúde mental”. Em relação ao seu antecessor, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT), que o criticou na última semana por ter “optado pelo obscurantismo” ao elevar a velocidade das marginais, não houve nenhum contra-ataque. Segundo seus assessores, não queria dar “ibope” ao petista.

Em 3 meses à frente da prefeitura – que mais pareceram 3 anos, conforme aliados -, Doria, que ainda se considera um não político, soube capitalizar e se tornar o centro das atenções em quase tudo o que aconteceu na cidade no período, até em ações das quais pouco participou.  Alardeou, por exemplo, que o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) havia retirado um acampamento na Avenida Paulista após um pedido seu, o que foi negado pelo movimento. Converteu propagandas negativas em positivas, como no caso da Amazon, que polemizou ao projetar trechos de livros nos “muros cinzas”, cujas pichações e grafites haviam sido apagados pela gestão tucana. Doria reagiu dizendo que, se ela se importava tanto com a cidade, faria doações a bibliotecas e escolas. Na saia justa, a companhia atendeu ao pedido.

Antecipou tempestades e agiu rápido, por exemplo, ao quitar — sem pestanejar — uma dívida de 90.000 reais do IPTU de sua mansão logo que a denúncia foi feita pela oposição na Câmara Municipal. Também não deixou passar medidas que tinham pequeno impacto econômico, mas grande apelo popular, como a criação da “Nota do Milhão”, que premia mensalmente com o valor quem pede nota fiscal em serviços municipais; a extinção da versão impressa do Diário Oficial; e a venda carros da administração. Se ele conseguiu colher frutos com essas realizações menores, imagine com as promessas de campanha que foram efetivamente cumpridas, como a de zerar a fila de exames na rede municipal e a de aumentar a velocidade nas marginais.

Uniformes

Quando Doria apareceu no primeiro dia de governo vestido de gari, muitos se perguntaram por quanto tempo isso duraria. Nos dias seguintes, ele se vestiria de jardineiro, pedreiro, agente da CET, operador de máquina de tinta, entre outros figurinos. Ele levou o marketing pessoal a um outro patamar, criou uma marca em torno de si, a de um workaholic que dorme três horas por dia e trabalha normalmente aos fins de semana. No feriado de Carnaval, os paulistanos que o seguiam no Facebook assistiram-no varrendo a sujeira dos blocos num domingo à noite e, na segunda-feira, às 5h30, se encontrando com Alckmin para assinar um convênio de fiscalização em postos de combustível.

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Por essas e outras, não é incomum Doria ser aclamado como presidente por onde passa. Nas redes sociais, já chegaram a lhe sugerir ter Alckmin como vice. Segundo a última pesquisa do Datafolha, ele chega em seu quarto mês de governo com aprovação recorde em relação a todos os seus antecessores – 43% dos paulistanos consideram ótima ou boa a sua gestão. No mesmo período, Gilberto Kassab (PSD) teve 16% de aprovação, contra 24% de Paulo Maluf (PP) e Celso Pitta, 20% de José Serra (PSDB) e 34% de Marta Suplicy (PT).

No dia 21 de março, a empresária Lucília Diniz organizou um jantar em homenagem aos 81 dias de mandato do prefeito, seu amigo e vizinho de longa data. Trezentos e setenta convidados da alta sociedade paulistana compareceram, entre eles os empresários Luiza Trajano (Magazine Luiza) e Flavio Rocha (Riachuelo), o banqueiro Luiz Carlos Trabuco (Bradesco) e o governador Alckmin. Ao dar as boas vindas, Lucília disse no microfone que Doria surgia como “a maior promessa de renovação da vida pública de todos os tempos”. Ficou a impressão de que ele seria anunciado para 2018. Mas, antes de qualquer manifestação dos presentes, Doria agiu. Agradeceu aos elogios e afirmou que “o maior nome da política nacional era Geraldo Alckmin”, a quem passou o microfone. Numa fala curta, o governador lembrou que a “campanha dele foi fiel” e que estavam ali juntos. O prefeito, então, completou, deixando bem claro: “Não sou candidato a nada. Aprendi com meu pai a ser leal. Lealdade nunca vai me faltar”. Depois, tirou os sapatos, subiu no sofá e continuou entretendo os convidados falando sobre amenidades. O recado estava dado.

Diante das especulações em torno do seu nome, o prefeito proibiu os seus auxiliares de falarem sobre 2018 e intensificou a sua agenda com o governador. Nesta segunda-feira, na apresentação do balanço dos 100 dias, Alckmin e seu secretariado devem estar presentes. O objetivo é evitar qualquer crise com o padrinho, que já enfrenta a resistência do presidente do partido, Aécio Neves, para se lançar à Presidência. “Alckmin é candidatíssimo a presidente. E Doria está preparado para qualquer cargo”, comenta o presidente estadual do PSDB, Pedro Tobias.

Ao ser eleito no ano passado, Doria prometeu que não largaria a prefeitura nem disputaria a reeleição. Em menos de três meses de governo, essa promessa parece cada vez mais perder o sentido, principalmente entre aliados que já o veem no mínimo como candidato ao governo estadual. Como disse o prefeito recentemente a um canal de TV, “irreversível é só a morte”.

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