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As propostas inusitadas (e nada úteis) de deputados

Parlamentares querem ensino de tupi nas escolas, airbag para motoqueiros e Dia Nacional do MMA. Projetos demonstram incompreensão sobre próprio papel

Por Gabriel Castro
4 mar 2012, 09h09

“Muitos parlamentares fazem proposições tentando apresentar sugestões que vêm da população. E há outros que simplesmente têm ideias esdrúxulas”

Antônio Flávio Testa, cientista político

No presidencialismo brasileiro, a maior pauta de votações da Câmara se resume a medidas provisórias e projetos de lei patrocinados pelo governo. Sim, os deputados também têm suas ideias – mas muitas delas estão bem longe do objetivo de tornar o Brasil mais justo e eficiente. Um olhar atento sobre os projetos que circulam nos subterrâneos da Casa mostra como os parlamentares interpretam mal a função legislativa. Num país atolado por uma quantidade infindável de leis municipais, estaduais e federais, parte dos deputados vê o ofício como a missão de aprovar mais medidas inexplicáveis e, com isso, criar mais proibições desnecessárias. Discretamente, muitas passam pelas comissões e chegam à votação no plenário.

A deputada Janete Pietá (PT-SP) é um exemplo revelador. Tal qual o personagem de Lima Barreto, a petista acredita que o currículo das escolas precisa incluir aulas de línguas indígenas. A medida, sonha a parlamentar, “irá despertar nas novas gerações o interesse do aprofundamento da cultura indígena, o respeito pelas comunidades afastadas, a valorização de seus direitos”.

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Vinicius Carvalho (PTdoB-RJ) caprichou. Apresentou em 2009 um projeto de lei que obrigaria as emissoras de TV a exibir, diariamente, reportagens sobre o funcionamento do Congresso Nacional. Para o deputado, a TV Câmara, a TV Senado e A Voz do Brasil são insuficientes. Na justificativa, Vinicius expõe seus ressentimentos: “Apesar de todas as atividades parlamentares desenvolvidas, os trabalhos realizados pelos congressistas não têm recebido o devido destaque junto às emissoras comerciais de televisão”. Carvalho, que não conseguiu se reeleger em 2010, pediu, ele mesmo, a retirada da proposta de tramitação.

Recém-promovido a ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) demonstrou criatividade em sua passagem pela Câmara. Ele elaborou uma proposta que tornaria obrigatório para os motoqueiros o uso de um colete inflável, uma espécie de air bag. Nelson Bornier (PMDB-RJ), por sua vez, quer que todos os ônibus de linha do país tenham janela de vidro refletivo (espelhado). “De pronto, passageiros e condutores terão maior conforto térmico no interior dos veículos, independentemente do uso de ar condicionado”, justifica o parlamentar.

Enquanto isso, donos de imóveis com piscina podem ter que construir grades de 1,20 metro de altura em volta da água. A ideia de Jefferson Campos (PSB-SP) valeria para as piscinas públicas e particulares. O parlamentar estabeleceu com detalhe as medidas necessárias para a grade, “de forma que impeça a passagem de crianças e animais”.

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Datas – Outra tarefa pela qual os deputados têm apreço é a criação de datas comemorativas. Como se torna cada vez mais difícil achar uma categoria que não tenha sido contemplada, é preciso ser criativo. No ano passado, por exemplo, os parlamentares propuseram a criação do dia da Ação Paramaçônica Juvenil, da Aquicultura, da Oração, Celebração e Adoração a Deus, da Paz e da Conciliação, da Planta Medicinal, das Artes Marciais, do Capelão Evangélico Civil e Militar, do Corista, do Perdão, do Samba de Roda e do MMA – este último, ideia do ex-campeão de boxe Acelino Popó Freitas (PR-BA).

Distorção – As iniciativas inusitadas dos parlamentares são reveladoras de um mal que atinge os legisladores no país: a tese de que a solução de todos os problemas, mesmo os mais simples, passa pela criação de leis e pelo aumento do poder estatal. São deputados que se comportam como se fossem ‘vereadores federais’.

“Muitos deputados ou senadores chegam e fazem proposições tentando apresentar sugestões que vêm da população”, diz o cientista político Antônio Flávio Testa. “Outros simplesmente têm ideias esdrúxulas. De qualquer forma, dificilmente esses projetos chegam ao plenário”. De fato, essa é uma irônica consequência positiva da cooptação do Congresso pelo Executivo: como a Câmara e o Senado se transformaram em apêndices do Planalto, aprovando apenas propostas de interesse do governo, os projetos de lei esdrúxulos tendem a adormecer eternamente nas gavetas do Parlamento.

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