Um grupo de cientistas europeus acrescentou na semana passada uma informação extraordinária aos estudos sobre a evolução humana. Ao contrário do que se imaginava, o Homo Sapiens não apenas interagiu com o Neandertal, seu primo já extinto, mas também acasalou com ele, teve filhos e hoje carrega parte de seu DNA.
A descoberta é resultado de cinco anos de pesquisas do genoma do Neandertal realizadas por cientistas do Instituto Max-Planck de Antropologia Evolutiva, da Alemanha. Eles analisaram três ossos de Neandertais que viveram há 38.000 anos, encontrados na Croácia. A partir deles, foi possível sequenciar 60% do DNA neandertal. O passo seguinte foi comparar o material genético de cinco voluntários que vivem em locais diferentes do mundo: dois africanos, um da Papua Nova Guiné, um chinês e um francês. �Selecionamos pessoas que representassem o máximo de variedade genética possível�, disse a VEJA o biólogo Richard Green, um dos participantes do estudo. Todos os voluntários, à exceção dos africanos, compartilhavam de 1% a 4% de seu DNA com os Neandertais.
Os cientistas ficaram surpresos pelo fato de que a presença de DNA neandertal foi igual nos franceses e nos voluntários da China e da Nova Guiné. Seria de se esperar que ela fosse mais elevada nos franceses, já que os neandertais viveram na Europa antes de desaparecer, por volta de 28.000 anos atrás. Segundo eles, isso aponta para a hipótese de que os acasalamentos entre Homo sapiens e Neandertais aconteceram quando eles coexistiram no Oriente Médio, entre 45.000 e 80.000 anos atrás, logo após os sapiens deixarem a África.
A princípio, os próprios cientistas do Max-Planck duvidavam de que Homo Sapiens e Neandertais tivessem acasalado. Um estudo publicado em 1997 por um dos pesquisadores do grupo analisou o DNA mitocondrial do Neandertal e não conseguiu identificar nenhuma relação com o homem moderno. Mas a análise do DNA do núcleo celular, que contém maior quantidade de informação genética, contou outra história.
Alguns cientistas já defendiam a tese do acasalamento. A análise de ossadas de Cro Magnons, os europeus primitivos, mostra que eles tinham características tanto do homem moderno como do Neandertal. �Os fósseis tinham características anatômicas como tronco largo e pernas curtas, típicas do Neandertal, que indicavam esse cruzamento�, disse a VEJA o português João Zilhão, professor de arqueologia paleolítica da Universidade de Bristol, na Inglaterra.
Mas apenas o sequenciamento genético pôde comprovar essa tese. �Conseguimos colocar fim ao longo debate de como teria sido a interação entre Homo Sapiens e Neandertais. O próximo passo é descobrir se esse cruzamento trouxe mudanças importantes para a nossa evolução�, disse a VEJA David Reich, geneticista de Harvard que participou da pesquisa.