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Novos remédios tornarão o câncer uma doença crônica, diz médico

Cirurgião afirma que pacientes poderão viver com a doença graças a novos tratamentos específicos para cada tipo de tumor

Por Guilherme Rosa
4 ago 2012, 11h33

O cirurgião oncologista Rogério Neves acredita que estamos entrando em uma nova era no combate ao câncer. Com a descoberta de novos tratamentos específicos para cada tipo de tumor, em pouco tempo a doença poderá se tornar crônica, sem necessariamente matar os pacientes. Brasileiro, Neves é professor da Penn State University, nos Estados Unidos, onde é diretor do Programa de Melanoma e Oncologia Cutânea e está diretamente envolvido na pesquisa de novas drogas para o câncer de pele. Ele esteve em São Paulo, onde participou do XIV Congresso Mundial de Câncer de Pele, que termina neste sábado. Neves falou sobre as terapias alvo para o carcinoma basocelular. Em entrevista ao site de Veja, Neves fala sobre os novos tratamentos que compara o novo momento do combate ao câncer à descoberta da penicilina e afirma ainda que o que podemos esperar do futuro.

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Por que temos visto tanto avanço no combate ao câncer? Isso começou há menos de 20 anos, com os projetos de leitura do genoma do câncer. Naquela época, levava dois anos para sequenciar um tumor. Hoje, faço isso em meu laboratório em uma hora. Ficou muito mais fácil saber as diferenças entre os tumores. Antes, quando nos deparávamos com o mesmo tipo de câncer, no mesmo lugar, em dois pacientes, não víamos diferença. Mas de repente percebíamos que um deles era mais agressivo: uma pessoa morria dentro de três meses, a outra estava viva três anos depois. A gente não sabia por que isso acontecia. Era claro que havia alguma coisa diferente dentro do tumor, mas não sabíamos o que era. Agora estamos começando a descobrir. São genes diferentes, que são ativados ou desativados dependendo do caso, ou proteínas que são expressas dependendo da circunstância. Sabendo disso, conseguimos inventar terapias alvo, voltadas para cada tipo específico de câncer.

Saiba mais

CÂNCER DE PELE

O câncer de pele é o câncer mais frequente no Brasil e corresponde a 25% de todos os tumores malignos registrados no país. Se for detectada precocemente, a doença apresenta altos percentuais de cura. Entre os tipos de câncer de pele mais frequentes está o carcinoma basocelular, responsável por 70% dos diagnósticos.

CÂNCER DE PELE MELANOMA

O melanoma tem origem nas células produtoras de melanina, substância que dá cor à pele. Esse tipo de câncer de pele é menos frequente, sendo responsável por apenas 4% de todos os tumores malignos no país. Estimativas do Inca sugerem que, em 2012, teremos 6.230 novos casos da doença.

CARCINOMA BASOCELULAR

O carcinoma basocelular costuma desenvolver-se em superfícies da pele que estão expostas à radiação solar como face, couro cabeludo, orelha, mãos, dorso e pernas. Os tumores começam com formações muito pequenas, brilhantes, duras e salientes. Geralmente, a doença cresce lentamente e não provoca dor. O tratamento, se realizado nas fases iniciais, é muito simples e resulta quase sempre na cura do tumor.

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O que essas terapias significam na luta contra o câncer? Estamos perto de uma cura? Eu não acredito que vamos encontrar a cura do câncer, nem em três gerações. Até porque temos muitos tipos de tumores, mais de 300. O que vai acontecer é que para a geração dos meus filhos, a maioria dos cânceres vai ter se tornado uma doença crônica. Uma doença com a qual a pessoa vai poder conviver, sem necessariamente morrer por causa dela. Numa hora, um tumor vai aparecer, e o médico vai retirar, numa outra, o paciente vai ter que trocar o tratamento. Mas ele vai continuar vivo.

Vai ser parecido com o tratamento atual contra a Aids, onde o paciente consegue controlar a doença ao consumir um coquetel de remédios? Vai ser exatamente igual. É isso que estamos buscando. Para tratar o melanoma, por exemplo, já estão surgindo coquetéis de medicamentos. O objetivo é controlar os vários caminhos pelos quais o câncer pode crescer. Novas drogas estão surgindo num ritmo incrível. Na área do melanoma, não surgia nada novo há 30 anos. Isso é muito excitante.

E quais as novidades no tratamento do melanoma? Uma análise genética dos melanomas mostra que, pelo menos, 50% deles têm uma mutação em um gene chamado BRAF. Foi criada uma droga, chamada debrafenib, que age especificamente nessa mutação. Ela entra na célula e bloqueia esse mecanismo que a faz crescer descontroladamente. Na outra metade dos melanomas, no entanto, você não pode aplicar o remédio, porque pode piorar o tumor. Por isso, o tratamento contra o câncer vai ter que ser totalmente personalizado.

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Temos exemplos desse tipo de tratamento em outros cânceres de pele? Sim, e até mais efetivos. Em nosso laboratório, nós estamos estudando substâncias para tratar o carcinoma basocelular, o tipo mais comum de câncer de pele. Nós participamos de testes com o vismodegib, uma droga que teve resultados tão bons que foi aprovada há seis meses nos Estados Unidos para uso em tumores avançados. Agora, estudamos drogas parecidas com essa, para descobrir qual pode ser o melhor tratamento. Existe uma gama grande de novas drogas disponíveis, que atingem o mesmo mecanismo no tumor.

E qual mecanismo é esse? Ela atua sobre o que chamamos de via de sinalização Hedgehog, um conjunto de eventos e sinais que regulam o desenvolvimento celular. Normalmente, essa via está inibida. Mas quando ela sofre mutações, causadas por exemplo pelos raios ultravioleta, começa a fazer as células crescerem e se multiplicarem de maneira desorganizada. A droga que age nesse mecanismo foi descoberta de maneira acidental, na década de 1950, nos Estados Unidos. Alguns bezerros começaram a nascer ciclopes, com um só olho. Ao estudar o caso, cientistas descobriram que eles estavam comendo uma planta que agia justamente na Via de Hedgehog. A indústria farmacêutica mudou a molécula para que ela pudesse agir nos tumores desencadeados por esse mecanismo. E até 90% dos carcinomas basocelulares têm alterações nessa via. Por isso, o tratamento é muito promissor.

Esses remédios são capazes de erradicar o carcinoma de um paciente? Em alguns casos, sim. No primeiro estudo com a substância, tivemos entre 60% e 70% de resposta completa, com o sumiço total do tumor. Em outra boa porcentagem, houve resposta parcial. Nesses casos, o câncer diminuiu ou parou de crescer. O que é ótimo, porque podemos operar esse paciente. Imagina um caso onde o carcinoma atinja a região dos olhos, o nariz ou a orelha do paciente. Diminuindo seu tamanho, podemos tornar a cirurgia menos mutiladora.

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E como a comunidade médica está reagindo a essas descobertas? Tente imaginar como foi quando descobriram a penicilina, o tanto de vidas que puderam ser salvas. É assim que estamos nos sentindo nesse momento.

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