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Mais dinheiro, a mãe de todas as promessas para a saúde

Por Daniel Jelin Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 Maio 2016, 16h38 - Publicado em 27 ago 2010, 18h14

O tucano José Serra, a petista Dilma Rousseff e a verde Marina Silva são todos favoráveis à regulamentação da emenda constitucional 29, que eleva os níveis de investimento na área de saúde. Mas isso não diz muita coisa. Lula e a oposição tampouco discordaram nesse particular, e isso não bastou: o assunto se arrasta no Congresso lá se vão dez anos, e o que se conseguiu até agora foram redações diversas que chegaram a rachar até a bancada da saúde. O impasse se deve a uma pergunta sem resposta: de onde sai o dinheiro?

A última batalha foi travada em 2008. O projeto saiu do Senado prevendo a aplicação de 10% da receita bruta da União em saúde. Na Câmara, a base governista derrubou o piso de 10% e quis criar um novo tributo, batizado de CSS, que reeditava a extinta CPMF. A oposição chiou – como, aliás, a maioria dos brasileiros, segundo as pesquisas da época -, e o governo acabou recuando: após uma vitória inicial apertada, por apenas dois votos de diferença, desistiu de votar o destaque final da emenda, que definiria – ou eliminaria, em caso de derrota – a fonte da arrecadação. “Não dá mais para aumentar a carga tributária”, diz o deputado federal Rafael Guerra (PSDB-MG), médico e ex-presidente da Frente Parlamentar da Saúde. “Se tem dinheiro para o trem-bala, por que não tem para a saúde?”

Lula afirma ser impossível aumentar os recursos para a saúde sem nova tributação específica e creditou o fim da CPMF à “maldade” da oposição. “Por mesquinharia, o Senado me tirou R$ 40 bilhões do orçamento da Saúde”, discursou. Há aí um exagero, algumas omissões e muito cálculo político. O exagero: dos R$ 40 bilhões da CPMF, apenas R$ 24 bilhões seriam destinados à saúde e menos ainda, R$ 11 bilhões, sob a forma da CSS. A primeira omissão: mesmo sem novos impostos, a arrecadação vem batendo recorde atrás de recorde, e foi uma decisão de governo comprometê-la com o aumento temerário das despesas com a máquina – em particular o gasto com a folha de servidores, que cresceu 54% nos anos Lula. Outra omissão: com mais ou menos receita, recai sobre o presidente a responsabilidade pelo Orçamento, e se é verdade que boa parte (90%) já nasce carimbado – os chamados gastos obrigatórios -, foi dos 10% restantes – as despesas ‘discricionárias’ – que saíram, por exemplo, as prioridades Bolsa-Família e PACs. Não saiu foi o PAC da Saúde, que emperrou justamente porque o governo preferiu vinculá-lo à receita extra da CPMF.

“A regulamentação da emenda 29 é desejada”, diz o professor e diretor do Centro Paulista de Economia da Saúde da Unifesp, Marcos Bosi Ferraz. “Porém, mais do que isso, seria interessante que o governo federal assumisse de fato um compromisso com o financiamento da saúde.” Carlos Schneider, do Movimento Brasil Eficiente, acrescenta: “É preciso separar o que é gasto em saúde do que é a manutenção da máquina. Hoje a máquina pública virou um fim em si mesmo, e não um serviço à sociedade”.

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Embora a regulamentação da emenda 29 esteja fora dos palanques, como se fosse um aborrecimento burocrático, reforçar e estabilizar o caixa dessa área é uma espécie de promessa-mãe nessa área. É o que pode dar consistência a uma série de outras promessas, de maior ou menor impacto sobre o Orçamento. Isso porque o cobertor da saúde é notadamente curto – e ainda partilhado pela assistência social e seu primo rico, a previdência social, todos parte de uma peça de ficção chamada Orçamento da Seguridade Social.

Ao todo, o dinheiro que o estado e as famílias gastaram com saúde em 2007 equivaleu a 8,4% do PIB, conforme a última apuração do IBGE. Desses gastos, 41,6% saíram dos cofres do estado, 57,4% do cofrinho das famílias e o restante 1% de instituições sem fins lucrativos. Em países como França e Inglaterra, onde vigoram, como no Brasil, sistemas de saúde que se pretendem universais, o setor público arca com 70% a 75% dos gastos.

O governo federal não apenas gasta pouco. Ele tem empurrado parte da conta para os estados e municípios. Sua participação no financiamento da saúde caiu de 60% há dez anos para cerca de 50% hoje. Isso porque a lógica do dinheiro carimbado para a saúde já vale para estados e municípios, embora não valha para a União. Assim, cada vez que a arrecadação de impostos aumenta – como tem aumentado nos últimos anos – o investimento em saúde cresce junto nos âmbitos estadual e municipal.

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Mas é preciso obrigar o governo a investir em saúde? Para os críticos da emenda 29, é contraproducente engessar ainda mais o Orçamento. Além disso, pode-se também argumentar que, para um certo município ou região, investir em saneamento básico ou em segurança do trânsito tem mais efeito sobre a saúde que a construção de pum ambulatório. São argumentos que não convencem Carlos Vital Corrêa Lima, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina. “Não pode haver mais manobra, não pode haver mais desvio”, diz. Para ele, é justamente esse conceito alargado de saúde que empobreceu o setor. “Se nossos gestores tivessem responsabilidade, não seria preciso regulamentar o que é saúde e o que não é”, concorda Ferraz. “Mas, como a média deles não tem, a regulamentação será positiva”.

Clique na imagem abaixo e confira os dados da Organização Mundial da Saúde para os gastos do setor:

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