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‘Discussão sobre emagrecedores derivados de anfetamina está encerrada’, afirma diretor da Anvisa

Dirceu Barbano afirma que emagrecedores à base de anfetamina não voltarão ao mercado e que a agência não descarta a proibição da sibutramina, em fase de 'testes'

Por Aretha Yarak
1 out 2012, 07h26

“Os médicos poderiam, por exemplo, se atualizar com os pacientes que tratam obesidade na Europa, que tratam obesidade nos Estados Unidos, sobre como é que eles fazem lá. Porque lá não tem nem sibutramina e nem os anorexígenos.”

Os problemas enfrentados pelos brasileiros com sobrepeso ou obesos que ficaram sem alternativa com a retirada dos emagrecedores à base de anfetamina do mercado não fará Dirceu Barbano, diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mudar de ideia. Em entrevista ao site de VEJA, ele foi categórico ao afirmar que os medicamentos femproporex, anfepramona e mazindol, proibidos pela agência no ano passado, não devem retornar ao mercado nacional. “Essa discussão está encerrada”, diz Barbano.

Criticado por algumas das principais organizações médicas do país, que se opuseram à retirada desses medicamentos, alguns deles usados há décadas para o tratamento da obesidade, ele rebate dizendo que os médicos poderiam se atualizar com seus pares europeus e americanos. “Lá não tem nem sibutramina e nem os anorexígenos.” Barbano também não garante a permanência da sibutramina no mercado. Até o final do ano, segundo ele, a agência continuará “testando” o remédio para determinar se continua a ser vendido ou não.

A Anvisa tem monitorado a situação dos pacientes que ficaram sem os inibidores de apetite derivados da anfetamina? Cumprimos aquilo que a Anvisa tem o dever: monitorar a utilização dos produtos autorizados no mercado que passam por prescrição médica. Nesses meses o que fizemos foi acompanhar e monitorar a utilização da sibutramina.

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Há casos de pacientes que desenvolveram problemas como hipertensão e danos nas articulações pelo ganho de peso. A Anvisa tem mantido uma conversa com as classes médicas sobre a situação atual dos pacientes que tomavam os derivados de anfetamina? Certamente existiam pessoas que estavam sofrendo os agravos relacionados aos efeitos adversos desses produtos, que não estão sofrendo mais. É perigoso afirmar que um paciente desenvolveu hipertensão ou diabetes por causa da ausência do tratamento da obesidade. Há produtos para serem utilizados no mercado, e os médicos têm à disposição ferramentas terapêuticas para tratar seus pacientes. Estamos preocupados agora é em reafirmar que aqueles produtos saíram do mercado por terem um perfil de segurança e eficácia muito negativo. Não há nenhuma perspectiva de que eles retornem ao mercado. A discussão daqui para frente é se a sibutramina vai permanecer ou não.

Há algum dado sobre piora da obesidade após a retirada dos produtos? A obesidade, a epidemia de obesidade, foi construída com esses produtos no mercado, não nesses oito meses após sua retirada. Reduzir a discussão achando que se esses produtos voltarem ao mercado o problema da obesidade está resolvido é menosprezar o problema. Esse problema está relacionado a um conjunto de fatores, e é um desafio para todos os sistemas de saúde do mundo. Não podemos nos vangloriar de achar que o Brasil seria melhor mantendo produtos que são condenados no mundo inteiro, que não estão à disposição no mercado na maior parte dos países. Se esses medicamentos nos fizesse tratar melhor a obesidade do que eles, teríamos níveis menores da doença, o que não é verdade. A obesidade vem aumentando nos últimos anos e isso demonstra que não são só os medicamentos que vão resolver.

Qual a avaliação até o momento sobre a sibutramina? Tivemos uma pequena redução no número de prescrições. Houve uma redução de 4% nos sete primeiros meses após a proibição, em relação aos sete meses anteriores à proibição. Em contrapartida, tivemos uma redução de 34% no volume de sibutramina vendida. Tínhamos uma média nos sete meses anteriores à proibição de 245.000 embalagens de 30 cápsulas por mês, em média. Após a norma, foram 182.000 embalagens. Essa diferença entre redução de volume e número de prescrições aconteceu porque, pela norma, estabelecemos limites máximos por prescrição. Assim, a dose se tornou mais compatível com os dados científicos que recomendam a utilização do produto.

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As prescrições da sibutramina não deveriam ter aumentado? Isso pode significar que os pacientes não encontram nesse remédio um tratamento similar ao que vinham fazendo? Uma segunda leitura é que aqueles pacientes que usavam a sibutramina, mas não se enquadravam nos critérios, pararam de tomar o remédio. Esse número pode ter sido substituído pelos pacientes que tomavam os derivados de anfetamina, e agora usam a sibutramina.

A obesidade não para de crescer. O Brasil está sem opções de tratamento para conter o problema. Quais as perspectivas? Nos Estados Unidos não existem derivados da anfetamina há 40 anos. No Brasil, eles resistiram 40 anos. A epidemia de obesidade não tem relação com a existência ou não desses remédios – eles sempre existiram aqui. A obesidade passou a existir com ou sem esses produtos. O que é necessário, então, é um combate claro às causas da obesidade, e não a opção por caminhos perigosos, com drogas que têm perfil de segurança e eficácia duvidosos. A Anvisa tem certeza que o problema da obesidade é sério. Quando novos produtos chegarem com pedidos de análise, se eles tiverem perfil adequado, serão registrados no Brasil.

A Anvisa pode vir a aprovar novos medicamentos contra a obesidade, mesmo aqueles derivados de anfetamina? Qualquer produto com pedido de registro será analisado, mesmo se ele for um derivado de anfetamina. Essa substância não foi colocada na lista de produtos proibidos. Mas esse é um caminho muito difícil, tanto que em nenhum país do mundo há proposições de registro desses produtos. Não há estudo sendo conduzido ou que tenha sido apresentado que demonstre o perfil de segurança e eficácia desses produtos. Por isso, a Anvisa não volta a discutir se esse produtos vão retornar ou não para o mercado. Essa discussão foi encerrada no ano passado. Esses remédios foram retirados do mercado.

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Algumas outras medicações, como a aspirina e certos anti-inflamatórios também não respondem às exigências de 2003 sobre os testes clínicos de segurança… Constantemente a imprensa publica casos de produtos que estão no mercado há bastante tempo, e que tiveram seu pedido de renovação de registros reprovados por falta de estudos clínicos. Todos os produtos, quando da renovação dos seus registros no Brasil, têm que apresentar estudos clínicos. Não há produto que permaneça no mercado brasileiro sem a necessidade de apresentação desses estudos. Até 2014 todos os produtos registrados na Anvisa terão que ter apresentados seus dados clínicos. Só assim a Anvisa vai mantê-los no mercado.

As sociedades médicas reclamaram de que não tinham sido ouvidas. O que aconteceu? A Anvisa não vai retomar essa conversa. Isso é assunto do passado. A classe médica foi ouvida, sim. Tivemos um ano e meio de discussão, eles participaram ativamente. A única questão é que a opinião deles, que tem interesse visível na permanência desses produtos no mercado, não foi a que prevaleceu. Todos os dados científicos com os quais trabalhamos implicavam em contestar a afirmativa desses grupos de médicos, que tem interesse na comercialização desses produtos.

Na composição da Agência não existe médico. Isso pode ter enviesado o parecer final? A diretoria da Anvisa já teve médicos, farmacêuticos, advogados e enfermeiros. Atualmente, ela tem um advogado e dois farmacêuticos. Não fazemos consulta médica na Diretoria Colegiada. As decisões da Anvisa são baseadas nos pareceres técnicos das áreas técnicas, que têm inúmeros médicos, farmacêuticos, enfermeiros, mestres e doutores.

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O senhor afirmou quando da proibição dos anorexígenos que estava havendo uma venda indiscriminada dessas drogas. Não seria responsabilidade da Anvisa fiscalizar e controlar isso? Não. A Anvisa não prescreve medicamentos, quem faz isso são os médicos. O uso abusivo era feito por prescrição abusiva. O abuso foi constatado por informações relativas à prescrição médica no Brasil. Quem abusava eram os médicos. Essa não é uma falha da Anvisa. A Anvisa tem o papel de fiscalizar. Ela fiscalizou e denunciou a situação para o Conselho Federal de Medicina. Nosso papel foi feito. Controlar eticamente o que os médicos faziam com seus pacientes era responsabilidade do Conselho Federal de Medicina. Estabelecemos um limite de quantidade de sibutramina a ser prescrita, porque, de novo, estava havendo abuso. Então a Anvisa coloca um limite: não pode prescrever mais do que isso por receita. Aparentemente, os médicos têm cumprido isso.

Quando o CFM foi alertado? Isso foi feito em 2009, em 2010. Fizemos novamente ano passado. Tínhamos pediatras prescrevendo esses remédios para emagrecer. Dos campeões de prescrição, alguns eram pediatras. Isso tudo foi informado ao Conselho Federal de Medicina.

A sibutramina está proibida na Europa e nos Estados Unidos. A droga foi liberada no Brasil com base nos mesmos testes clínicos que a proibiram no exterior? Para o registro foram os mesmos dados clínicos. Eles optaram por retirar com base nas mesmas informações que nós temos. Aqui no Brasil, entendemos que se fizéssemos um controle, poderíamos ter esse monitoramento de um ano para chegar a uma decisão final – que deve ser tomada agora no fim do ano. Já recebemos quase 2.000 relatórios de reações adversas de farmácias ao longo de 2012, sendo seis de eventos adversos graves. Vamos ter de avaliar se eram pacientes que podiam usar a sibutramina, porque se alega que quando o paciente se enquadra nos critérios, ele não tem riscos desses efeitos adversos. A Anvisa vai cruzar essas informações de eventos adversos com os dados de mercado e decidir se a sibutramina continuará sendo comercializada ou não. Essa é a única discussão sobre o assunto daqui para frente.

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Uma das críticas da classe médica é de que o número de efeitos adversos, que foi considerado crítico pela Anvisa, é, na verdade, considerado normal para o período de cinco décadas. Em relação aos derivados de anfetamina, não há nada em discussão na Anvisa. Esses produtos foram proibidos para uso no Brasil e assim permanecerão. Agora estamos preocupados se vamos manter ou não a sibutramina no mercado. É essa a discussão. Há uma tentativa desses setores médicos que têm interesse na comercialização desses produtos de reabrir a discussão. Ela não será reaberta pela Diretoria Colegiada da Anvisa. Essa discussão foi debatida durante um ano e meio. Foi uma decisão importante que não trouxe prejuízo algum à saúde das pessoas. Muito pelo contrário, está evitando que pessoas usem um medicamento cujo perfil de segurança e eficácia é muito duvidoso e gera riscos. A discussão está encerrada.

Como a Anvisa vê o uso off label de drogas como o topiramato, bupropiona e mazindol? A responsabilidade de prescrever um medicamento que não está autorizado no país para aquela determinada doença, é única e exclusiva do médico que o faz. A questão é que hoje não temos um monitoramento sobre que tipo de efeito, seja ele terapêutico ou adverso, isso tem gerado. Estamos estudando uma possibilidade de tornar obrigatória a notificação da prescrição off label. Assim, teremos condições de acompanhar se esses pacientes se beneficiam ou se prejudicam por essa decisão unilateral do medico. Decisão essa que, muitas vezes, pode não estar respaldada cientificamente, como é o caso do Victoza.

Após a proibição, os médicos brasileiros ficaram de mãos atadas… Os médicos poderiam, por exemplo, se atualizar com os pacientes que tratam obesidade na Europa, que tratam obesidade nos Estados Unidos, sobre como é que eles fazem lá. Porque lá não tem nem sibutramina e nem os anorexígenos.

Existe alguma política interna que vise a acelerar a aprovação de novos produtos contra a obesidade? Certamente, produtos inovadores já são priorizados, porque trazem propostas de novas terapias. Se, por ventura, alguma empresa tiver alguma novidade ainda que com produtos antigos, com relação à obesidade, a diretoria se preocupa muito em analisar e fazer chegar mais rapidamente ao mercado.

Como ficou o comércio ilegal desses produtos? A venda na internet sempre existiu, e a Anvisa junto com a Polícia Federal combate a venda ilegal desses produtos. O número de apreensões não aumentou nos últimos sete meses, nem o número de inquéritos. A venda ilegal é um problema que sempre existiu. Mandávamos fechar site de vendas em número semelhante ao que tivemos nesse período. A Policia Federal, a Polícia Rodoviária Federal e a Anvisa fizeram apreensões de medicamentos falsificados e de contrabando em quantidades semelhantes nesse período ao que fez no período anterior.

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