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Os acertos e os riscos no acordo de paz com as Farc

O grupo terrorista se comprometeu a entregar todas as armas. A questão é se irão abandonar também o narcotráfico

Por Duda Teixeira Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 24 jun 2016, 17h05

Um acordo de paz só se faz com concessões dos dois lados. Mas elas devem respeitar a natureza dos envolvidos. Para o governo colombiano, que há três anos e meio está em negociações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em Havana, há limites que não podem ser ultrapassados. São aqueles que estão definidos pela constituição e pelos tratados internacionais assinados pelo país.

Não haveria como aceitar, por exemplo, que os que cometeram crimes contra a humanidade fossem anistiados pela Justiça. Também não seria possível permitir que os terroristas mantivessem armas, a pretexto de se defender de outros grupos. Na assinatura do acordo entre as partes, que aconteceu na quinta 23, o governo colombiano parece ter conseguido tudo o que queria. “Eles entregarão até a última pistola”, comemorou o presidente Juan Manuel Santos.

No documento de quinze páginas, os representantes esmiuçaram as condições em que as armas serão entregues. Os terroristas poderão se dirigir a 23 zonas espalhadas pelo país, onde serão registrados, deixarão suas armas e ficarão acampados por até 180 dias. O objetivo é que, a partir daí, eles sejam gradualmente incorporados à vida civil. Aqueles que possuíam cargos mais baixos na hierarquia poderão confessar seus crimes e terão penas atenuadas. Poderão até mesmo cumprir a pena fazendo trabalhos voluntários. Outros, acusados de terem cometidos crimes mais graves ou de terem integrado a cúpula da organização, serão julgados por um tribunal especial.

Os que ficarem livres poderão ingressar em movimentos sociais e fundar partidos políticos. Essa questão incomodava muitos colombianos, principalmente os que sofreram nas mãos do grupo terrorista ou perderam parentes. “O problema é que não havia outra alternativa a não ser permitir que as Farc pudessem constituir um partido. Foi uma concessão necessária, a qual muitos já estão se acostumando”, diz a cientista política colombiana Sandra Borda, da Universidade de Bogotá Jorge Tadeo Lozano.

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Como há vários itens do acordo que não são consensuais, uma Corte Constitucional está examinando a possibilidade de convocar um referendo popular para aprová-lo ou não. Nesse ponto, Santos obteve outra vitória sobre as Farc, que antes se recusavam a se submeter a um a consulta e pediam a instalação de uma Assembleia Constituinte. Foi preciso muita lábia para convencer os terroristas a aceitarem a proposta de um referendo, que ainda não foi marcado.

Uma das maiores dúvidas é se as Farc irão realmente abandonar o narcotráfico. Desde 1983, a organização tem incentivado seus membros a obter receitas de fontes ilegais para sustentar a guerra interna. Várias frentes de batalha, principalmente aquelas que ficam mais próximas das fronteiras com o Equador, com a Venezuela e com o Brasil, envolveram-se com atividades ilegais como o tráfico de pessoas, de armas, de drogas e a mineração clandestina de ouro.

“Alguns grupos estão há vários anos vivendo dessas atividades ilegais. São famílias inteiras envolvidas nesses negócios e com conexões com cartéis internacionais. É muito difícil que troquem de ramo”, diz o cientista político e antropólogo colombiano Eduardo Alvarez, da Pontifícia Universidade Javeriana, em Bogotá, e pesquisador da Fundação Ideias para a Paz.

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Em seu governo, Santos tem tentado se distanciar de seu antecessor, Álvaro Uribe (2002-2010), que reduziu a criminalidade e impulsionou a economia combatendo as Farc com o Exército. Santos, que ajudou a Uribe a subjugar as Farc, apelou para a conversa depois de assumir. Nas negociações em Havana, por exemplo, apareceram assuntos como reforma agrária e a promessa governamental de ajudar na substituição dos cultivos de coca. Com Uribe, isso seria impensável.

A boa vontade, contudo, só se tornará realidade se houver ganhos financeiros para os que trabalham no campo. Como a renda obtida com o narcotráfico é muito mais alta que a gerada pelos cultivos tradicionais, muitos podem preferir continuar com a coca.

Uma das boas surpresas nas mesas de negociação em Havana é que todas as frentes das Farc, incluindo as que mergulharam de cabeça na criminalidade, estavam representadas. De tempos em tempos, os delegados que iam para Havana retornavam para o seus acampamentos na Colômbia para informar os demais integrantes e convencê-los a ceder, no que foi chamado de “pedagogia de paz”. Essas viagens foram autorizadas e acompanhadas pelo governo central.

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A coesão entre os cabeças das Farc e suas bases foi fundamental para que alguns avanços acontecessem. As Farc já se comprometeram a não mais recrutar crianças e libertaram os que estavam sequestrados. Agora, fala-se apenas em “desaparecidos”. Entre as tarefas das Farc, está a de mostrar os lugares onde os corpos estão. Na próxima fase, é importante que as Farc mantenham a disciplina atual. Só assim será possível garantir que eles entreguem até a última pistola.

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