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“O Boko Haram nos aproximou dos muçulmanos”, diz arcebispo nigeriano

Ignatius Kaigama é arcebispo da cidade de Jos e presidente da Conferência de Bispos Católicos da Nigéria

Por Julia Braun
16 abr 2016, 09h23

Ignatius Kaigama, arcebispo da cidade de Jos, na região central da Nigéria, foi uma das primeiras vozes a denunciar as atrocidades praticadas pelos jihadistas do Boko Haram, grupo terrorista que matou mais de 20.000 pessoas nos últimos sete anos só no estado de Borno, um dos mais atingidos pela violência dos extremistas islâmicos, de acordo com o Banco Mundial.

Para combater a violência em seu país, dom Kaigama aposta no diálogo com os líderes muçulmanos da Nigéria e nas promessas do presidente Muhammadu Buhari. “O Boko Haram nos aproximou dos muçulmanos. Nem todo muçulmano é uma pessoa ruim, nem todo muçulmano é terrorista”, afirma. Em visita ao Brasil, o religioso falou ao site de VEJA sobre sua batalha para chamar a atenção da comunidade internacional para os problemas da Nigéria e de suas esperanças para o futuro do país.

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O Boko Haram vem espalhando terror na Nigéria há sete anos e suas ações têm se tornado cada vez mais violentas. Por que a comunidade internacional não une forças para combater os jihadistas? Essa é a pergunta que faço ao mundo com frequência. Deveriam haver esforços internacionais constantes para reprimir a atuação dessas células terroristas na Nigéria e nos países vizinhos. Eu sempre comparo nosso conflito com os ataques em Paris. Fiquei muito feliz em ver os líderes dizendo ao mundo que estavam todos unidos contra o terrorismo, e acredito que a comunidade internacional tem a capacidade de criar esse mundo pacífico para todos.

O conflito na Nigéria não desperta tanta comoção mundial como um atentado em Paris, por exemplo. Como reverter esse quadro? As pessoas só se preocupam com sua própria localização geográfica, mas é muito importante sabermos do que acontece em outros lugares. Algumas pessoas nem sabem onde fica a Nigéria. Se algo acontece nos grandes países, a notícia é exibida 24 horas por dia em todos os outros grandes jornais do mundo. No entanto, quando a notícia acontece onde não existem interesses econômicos, ela acaba se perdendo. Eu luto pela proteção das áreas menos conhecidas e para que as pessoas saibam que vivemos todos no mesmo mundo. Direta ou indiretamente, os problemas daqueles que sofrem devem atingir quem está em situação de conforto.

Relatos de ataques do Boko Haram, que se concentravam no noroeste da Nigéria, são cada vez mais frequentes nos países vizinhos. Você acha que haverá uma escalada no conflito? Acredito que sim. Há muitas ações sendo feitas para expulsar os terroristas da Nigéria, mas o grupo se espalhou para Camarões, Chade, Níger e outros lugares. O esforço agora deve agora ser estendido para esses outros países.

A aliança com o Estado Islâmico fortaleceu o Boko Haram? Eles juraram lealdade ao Estado Islâmico, que adotou o Boko Haram como seu ‘filhote’. Mas, por enquanto, estamos contando com agências de inteligência e com a comunidade internacional para entender qual o nível de cooperação entre eles e qual será o impacto dessa aliança na vida das pessoas.

Estima-se que o Boko Haram tenha usado pelo menos 105 mulheres e crianças em atentados suicidas desde junho de 2014. Esse tipo de ataque se tornou uma das marcas do conflito? Este não é um modelo de guerra convencional. Na Nigéria, o terrorista entra em um restaurante ou bar vestido como homem comum e se explode. Ou então uma garota de 10 ou 14 anos, que se veste normalmente, mas dentro de suas roupas carrega um colete de bombas, se explode no mercado. Esses ataques são muito difíceis de prever e impedir.

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O senhor acredita que o presidente Muhammadu Buhari está cumprindo suas promessas de combate ao Boko Haram? Sim, ele é um sopro de ar fresco para nós. Seu governo foi capaz de recapturar áreas tomadas pelo Boko Haram no passado e motivar as agências de segurança e os militares a fazer mais. Ele realocou a estrutura de comando dos militares para Borno e Maiduri e está sempre tentando dialogar com os líderes de países como Chade, Camarão e Benim, para fazer com que trabalhem juntos. Em nível internacional, ele busca o auxílio dos Estados Unidos e de nações europeias. Muito está sendo feito para combater o Boko Haram.

Qual o seu papel e da Igreja Católica no conflito? Nós exercemos um papel moral, encorajamos as vítimas a denunciar os males sofridos e as pessoas de fora a fazer algo para mudar o que acontece na Nigéria. Através da Conferência dos Bispos Católicos da Nigéria estamos tentando manter contato com o presidente para reportar o que vemos em nossas cidades, o que aconteceu com as pessoas que foram atacadas.

Como a Igreja Católica se relaciona com a comunidade muçulmana na Nigéria? Vocês estão unindo forças para lutar contra o extremismo religioso? O Boko Haram nos aproximou dos muçulmanos. Nem todo muçulmano é uma pessoa ruim, nem todo muçulmano é terrorista, nem todo muçulmano faz parte do Boko Haram. Nós tentamos nos aproximar dos seus líderes mais influentes e criar diálogo. Agora nós falamos a mesma língua de condenação à violência e ao terrorismo. O Boko Haram é diferente, não dialogamos com eles. Seus membros se tornaram pessoas más, irracionais, insensíveis, incapazes de dialogar. Eles não ouvem.

Nigéria e África do Sul brigam pelo posto de maior economia da África. No entanto, seu país ainda sofre com muitos contrastes sociais e econômicos. Como você imagina a Nigéria no futuro? A Nigéria é o meu país e eu desejo só o melhor para seu povo. O país tem potencial; fomos presenteados por Deus com vastos recursos naturais. A descoberta do petróleo motivou as pessoas a buscarem dinheiro fácil e se tornarem corruptas, mas ainda estamos muito otimistas de que o presidente Buhari vai recuperar nossa economia.

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