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‘Se o passageiro colabora, tudo fica mais fácil’, diz tripulante

Integrante da equipe de bordo da mesma empresa do navio naufragado na Itália critica quem faz brincadeiras na hora da simulação de emergência em cruzeiros

Por Cecília Araújo
19 jan 2012, 06h25

Entenda o caso

  1. • O navio Costa Concordia viajava com mais de 4.200 pessoas a bordo quando bateu em uma rocha junto à ilha italiana de Giglio, na noite do dia 13 de janeiro.
  2. • A colisão abriu um grande buraco no casco do navio, que encheu de água, encalhou em um banco de areia e virou.
  3. • Onze mortos foram confirmados até agora.
  4. • Os trabalhos de buscas são retardados pela necessidade de retirar 2.400 toneladas de combustível do navio, sob o risco de contaminação da área do naufrágio.

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O cruzeiro Costa Concordia carregava mais de 4.200 pessoas a bordo quando naufragou na noite da última sexta-feira, deixando 11 mortos e 28 desaparecidos, segundo as informações mais recentes. Do momento em que o transatlântico colidiu contra uma rocha próximo à ilha italiana de Giglio até o início da evacuação passaram-se pouco mais de uma hora. Os passageiros, em pânico, reclamaram de despreparo por parte da tripulação para coordenar o resgate. Mas Carolina Cheuen, que integra a equipe de bordo da empresa Costa Crociere e estava de férias no dia do acidente, defende os colegas e critica quem faz brincadeiras no momento em que é feita a simulação de emergências. “Culpar os tripulantes é muito fácil, mas é complicado controlar milhares de passageiros em pânico – e muitos deles desinformados por opção”, diz ela, que concedeu entrevista ao site de VEJA.

Qual foi sua reação ao saber do naufrágio? Minha reação foi igual à de qualquer tripulante que estava em terra ou a bordo de outros navios no momento do acidente: fiquei em choque. A princípio, não acreditei no que tinha acontecido. Depois, me veio a preocupação sobre como estariam os meus colegas, que já trabalharam comigo em outras viagens e poderiam estar a bordo.

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Alguns passageiros reclamaram que a tripulação demorou muito para autorizar a evacuação do navio. A que a senhora atribui essa espera? Não sei o que aconteceu especificamente no Concordia. Mas os tripulantes recebem ordens dos superiores, como o comandante e outros oficiais da equipe. Um tripulante só age quando é instruído a agir, principalmente para evitar pânico desnecessário. Geralmente, os oficiais aguardam até que acabem todas as possibilidades de se resolver determinado problema antes de concluir que a evacuação é de fato necessária. Isso pode explicar uma possível demora na comunicação entre os oficiais e os tripulantes.

Tripulantes participam de simulações de situações de emergência com frequência? Temos um treinamento em terra, o Curso Básico de Segurança em Navio (STCW), antes de embarcar. São cinco dias de treinamento prático, um pré-requisito para qualquer viagem. Durante o curso, aprendemos como funciona o navio, como ele é dividido, como usar botes e coletes salva-vidas. É obrigação para se trabalhar em qualquer empresa, inclusive na Costa Crociere (responsável pelo Costa Concordia). Já dentro do navio, fazemos treinamentos intensivos com os passageiros. Dependendo da duração do cruzeiro, pode ser feito mais de uma vez. Ali, tentamos mostrar ao passageiro a importância de se estar bem informado numa situação de emergência. A preocupação com segurança é muito grande, independentemente da companhia.

Como a senhora avalia o interesse dos passageiros nesse treinamento de segurança? Na Europa, os passageiros participam mais, acho que porque são mais acostumados a fazer cruzeiros. Mesmo pessoas que já estão no seu sétimo cruzeiro participam do treinamento. Já os brasileiros, participam muito menos. E foram eles que encheram a boca para dizer que a tripulação estava despreparada. Uma mulher disse à imprensa, por exemplo, que estava jantando e, “de repente”, as pessoas a sua volta já estavam de colete salva-vidas. Se ela tivesse participado do treinamento, saberia que determinado sinal sonoro indica que o navio está em emergência, que ela deveria se dirigir ao local onde se encontram os coletes salva-vidas e ficar a postos para a evacuação. Ouvi falar de um passageiro que pulou na água no momento do desespero. Qual a necessidade disso? Se ele tivesse assistido ao treinamento, saberia que o navio demora mais de 7 ou 8 horas para emborcar completamente. É uma informação básica.

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O treinamento é de fato eficaz para quem participa dele? A maioria vai para tirar foto com o colete salva-vidas. Prestar atenção é outra história. Eles não estão interessados em entender o significado dos sinais sonoros, saber o momento em que o bote desce ou descobrir depois de qual alarme ou instrução é preciso evacuar o navio. Isso é uma falha dos passageiros que faz toda a diferença no momento de um naufrágio. Se existe o treinamento é porque existe risco em alto-mar.

Especialistas já disseram que é impossível salvar todo mundo em um navio tão grande, inclusive nas melhores condições. Quais fatores dificultam o trabalho dos tripulantes? Para um navio com mais de 4.000 pessoas a bordo, o trabalho dos tripulantes do Costa Concordia foi brilhante. Fazer a evacuação num navio inclinado, à noite, sem luz – porque a batida levou à pane elétrica – e ainda com passageiros desesperados não é para qualquer um. Culpar os tripulantes é muito fácil, mas é complicado controlar milhares de passageiros em pânico – e muitos deles desinformados por opção. Cabe ao passageiro ter o interesse de participar dos treinamentos toda vez que o navio sai do porto de embarque. São 20 ou 30 minutos que valem uma vida.

A senhora diz que tem orgulho de ser tripulante e está preparada para situações de emergência. Acidentes como esse não lhe fazem repensar seu trabalho? Quem trabalha com isso, faz porque gosta. Para ficar mais de nove meses longe da família e dos amigos tem de gostar muito. Não é todo mundo que aguenta, muitos desistem no meio do caminho. Às vezes, bate uma preguiça de fazer o mesmo treinamento toda semana, só que quando acontecem acidentes assim vemos que é necessário. Claro que existe pânico na hora do acidente, até por parte do tripulante, mas ele sabe exatamente o que fazer. Nunca passei por uma situação de emergência, graças a Deus, mas me considero completamente preparada para isso. E, se o passageiro colabora, tudo fica mais fácil.

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