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Anderson Silva, nascido para ser super-herói

Por Silvio Nascimento, com reportagem de Davi Correia
14 jan 2011, 21h59

Numa quarta-feira quente do início do verão carioca, uma fila de sete atletas começa a se organizar à beira do octógono, numa academia da zona sul do Rio, para dar início ao treino do campeão da categoria dos peso-médios de UFC, Anderson Silva. O clima entre os sparrings é de camaradagem, mas o campeão não quer conversa: de pé, num canto, passa as ataduras nas mãos, aperta, reaperta, até que estejam firmes ao seu gosto e aí calça as luvas. A respiração é profunda, pausada e o olhar fixo nas mãos. É parte do exercício de concentração do lutador de 35 anos que, dia 5 de fevereiro, vai colocar em jogo seu título contra Vitor Belfort no UFC 126, em Las Vegas. A expectativa no dia da luta é de quebra de recordes de público no ginásio, expectadores pelo mundo e, claro, arrecadação. Apenas uma noite de evento pode render mais de 70 milhões de reais. O preço dos ingressos foi de 125 a 1.250 reais, 130 países exibem o campeonato em 20 línguas e há pelo menos 1 milhão de assinantes em pay per view pelo planeta. A marca UFC foi avaliada em mais de 1 bilhão de dólares, segundo a revista Fortune, e Anderson é seu maior nome neste momento. Seu estilo é agressivo, com chutes e joelhadas poderosos e finalizações surpreendentes, como na última luta, contra o americano Chael Sonnen: com a costela trincada, Anderson foi golpeado impiedosamente durante todo o tempo e no minuto final, quando parecia que ia perder, buscou forças e conseguiu imobilizar o adversário, fazendo-o desistir. Com tal determinação, Anderson cativa torcedores dos mais variados perfis – do ator Wagner Moura à cantora Sandy, para ficar entre as celebridades. Hoje, ele é uma espécie de Ayrton Senna dos ringues. Muito suor Por isso o treino é pesado. Troca de socos, pontapés, imobilizações, por cerca de 90 minutos. Os sparrings se revezam, mas Anderson quase não faz intervalos. “Chega uma hora que você sabe o que precisa fazer, mas o corpo não responde ao cérebro”, diz ele. Três vezes ao dia – manhã, tarde e noite – a rotina começa com aquecimento com jiu-jitsu (de 35 a 40 minutos) e depois troca de golpes. O caminho não é fácil e o empenho tem de ser máximo. Mas as recompensas não são poucas. É difícil estimar o patrimônio de uma estrela de UFC como ele, mas numa projeção acanhada, entre premiações, contratos de patrocínios fixos e licenciamento de produtos, seu faturamento pode ultrapassar os 2 milhões de dólares num ano. No UFC, um atleta faz entre duas e três lutas por ano, no máximo. Vaidoso, Anderson tem uma coleção de cremes para o corpo em cada uma das casas em que vive, no circuito Curitiba, Rio de Janeiro e Los Angeles. No sobrado de três andares da Barra da Tijuca, ele exibe orgulhoso algumas dezenas de relógios esportivos, cuidadosamente acondicionados em almofadas dentro de uma caixa, numa prateleira próxima da que acomoda bonecos de lutadores – seu preferido é o do boxeador Muhammad Ali. No guarda-roupa, em cada gaveta, meias, cuecas e acessórios separados por tipo de uso – social ou esportivo. Ele usa camisas quase sempre com estampas em xadrez, de cores neutras, e as camisetas prediletas são da grife jovem Abercrombie & Fictch. No Rio, ele dirige uma Land Rover importada – utilitário esportivo, que acomoda bem a família. Na casa de Los Angeles, a garagem espera o Camaro em fase de finalização numa oficina, que o deixará parecido com um carro do filme Transformers. Anderson tem paixão especial pela motocicleta superesportiva, a qual afirma que gostaria de usar mais.

Luta em casa – Uma das recompensas da dedicação ao ringue, talvez a mais emocionante para Anderson, vem dos cinco filhos. Ou, mais precisamente, dos amigos deles. À sua volta, não há menino que não diga que quer ser igual a ele quando crescer. Anderson é uma espécie de super-herói para as crianças. O atleta assume o papel, mas faz questão de aproximá-lo da vida real. “Posso ser um super-herói, mas daqueles que também têm contas para pagar, família para criar. Nada vem de graça”, diz ele. Casado há treze anos com Dayane – “Ela pegou toda a época ruim da minha carreira, quando não tinha muito dinheiro para viajar, faltava patrocínio, enfim, tempos muito difíceis” -, Anderson tem no videogame seu passatempo favorito com João (5 anos), Kauana (9), Kalil (11), Gabriel (13) e Kaori (14). O game com o qual brincam não é de arte marciais. Geralmente é Call of Duty, game de guerra, com matança sem economia. Anderson não ensina os filhos a lutar, mas o tema é obrigatório em casa. Todos têm de conhecer as particularidades das “artes marciais mistas” e sabem que se trata de um esporte – por favor, “vale tudo”, não. Nascido em São Paulo, de família muito simples, Anderson foi morar, aos quatro anos, em Curitiba com os tios Edith e Benedito – na verdade tios da mãe -, a quem passou a chamar de pai e mãe. Foi com um irmão, George, e lá encontrou três primos – Sandra, Wilson e Welson. Ficou muito apegado à tia, sempre mais presente em seu cotidiano. O tio é militar aposentado e criou os filhos com muita disciplina: quando as crianças brigavam, colocava todas abraçadas durante horas até que fizessem as pazes. Às quartas-feiras e aos sábados, levava todos ao quartel da policia militar para que sentissem o clima de exigência, organização, respeito à hierarquia e disciplina da vida militar. Edith morreu há quatro anos e Anderson ainda lacrimeja quando fala sobre ela. Diz que ela foi sua fonte de inspiração e força – e que também o ensinou a controlar o temperamento. “Nunca procurei briga, mas também não fugia de nenhuma”, diz ele. Seu primeiro contato com a luta foi com o primo-irmão Wilson, que treinava boxe tailandês no quintal de casa, antes dos oito anos. Logo depois disso, Anderson treinou capoeira, mas pensava mesmo em ser jogador de futebol. Era magro, elétrico, gostava de jogar na lateral-esquerda, mas a idéia foi abandonada quando começou a praticar a sério artes marciais. Quase imediatamente trocou tudo primeiro pelo taekwondo, depois jiu-jitsu e algumas modalidades de kung-fu. Ali ele se encontrou, ficava à vontade no tatame.

Office boy – Mas era difícil viver apenas do esporte e ter de arcar com viagens e treinos. Para seguir lutando, trabalhou como office boy, como segurança, e numa rede de fastfood. Finalmente foi contratado para dar aulas de boxe tailandês em uma academia em Curitiba. Como não podia parar de treinar, chegava à academia às 6 horas e, às vezes, saía à 1h da manhã. A primeira luta oficial aconteceu em Corumbá, Mato Grosso do Sul. Ainda sem patrocinadores, foi até a cidade com trinta reais no bolso. Chegou no dia da competição, fez a pesagem e venceu as quatro lutas da noite. A última foi a mais difícil, não pela força do oponente, mas porque o adversário era um amigo de treino. De volta à Curitiba, participou do Meca, um dos eventos nacionais de luta mais bem conceituados, mas foi eliminado após perder uma luta por pontos. Sentiu que tinha potencial e foi determinado. Decidiu que faria a vida no esporte. “Sempre quis ser igual ao Royce Gracie”, diz ele. Anderson participou do Pride, evento no Japão, e foi contratado para lutar o Cage Rage, evento tradicional na Inglaterra, no qual foi campeão da categoria meio-médio. Bastou para que os organizadores do UFC prestassem atenção ao seu cartel de lutas, e assim ele ganhou um contrato em 2006, ano em que garantiu o cinturão da categoria dos pesos médios – nocauteou o então campeão Rich Franklin no primeiro round. Hoje, Anderson tem 26 vitórias e quatro derrotas. É considerado pelo presidente do UFC, Dana White, o melhor lutador de todos os tempos. E por que a identificação com o Homem Aranha, apelido praticamente incorporado ao seu nome? O motivo é inusitado: “Antes de uma luta, estava usando uma camisa com o desenho do Homem Aranha quando uma locutora fez uma brincadeira e disse que eu era parecido com o super herói da estampa. Para minha surpresa, quando entrei no ringue ela anunciou: Anderson Silva, o Aranha do Brasil.” LEIA TAMBÉM:

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