Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

‘O Cristo Redentor não é da Igreja’, critica Carlos Saldanha

Diretor de 'Rio' lamenta a interferência da Cúria na produção de filmes que mostram o monumento, como 'Rio, Eu Te Amo' - vetado e depois liberado

Por Pollyane Lima e Silva, do Rio de Janeiro
25 jul 2014, 10h44

“Esse é o ponto mais sério de todos: nenhuma entidade tem o direito de restringir ou tentar criar empecilho para a expressão de uma ideia. A liberdade de expressão é única e tem de ser respeitada em todo país democrático.”

Quando estava finalizando o primeiro filme da série de animação Rio (2011), Carlos Saldanha foi surpreendido pela informação de que sua produção seria submetida à aprovação da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro. Tudo por que o Cristo Redentor aparecia em algumas das cenas. Liberado, ele pode inclusive usar a estátua na sequência Rio 2 (2014). Meses atrás, viu seu amigo e colega de profissão José Padilha passar pelo mesmo crivo – mas, agora, com tentativa de censura. O segmento Inútil Paisagem, do filme Rio, Eu Te Amo, chegou a ser cortado da versão final. O fato de o personagem de Wagner Moura desabafar com o Cristo sobre suas crises pessoais foi considerado desrespeitoso. O longa já estava sendo finalizado quando, na última segunda-feira, a Arquidiocese voltou atrás e autorizou a exibição das cenas. Saldanha, que já tinha assistido à composição de Padilha, comemorou o desfecho, mas pediu a abertura de um debate sério sobre o caso: “O Cristo Redentor é uma figura subjetiva da Igreja ou uma imagem que pertence a todos nós?”.

OPINE: A Igreja pode controlar uso da imagem do Cristo Redentor?

De férias na cidade natal, Saldanha recebeu o site de VEJA em um hotel na Zona Sul, nesta semana, para divulgar o lançamento de Rio 2 em DVD e blu-ray. Sempre simpático, ele só desfez o sorriso ao comentar sobre a saga de Padilha em Rio, Eu Te Amo – longa do qual ele também participa, gravando pela primeira vez com atores de verdade. “Não tem como fazer um filme sobre o Rio sem mostrar o Cristo – essa é a discussão”, criticou ele, adiantando que já iniciou conversas para dar continuidade às aventuras da ararinha azul Blu em um terceiro filme da série de animação. Confira os principais trechos da entrevista:

Rio, Eu Te Amo é seu primeiro filme com atores de verdade. Como foi o trabalho? Sim, foi a primeira vez que gravei com uma equipe, antes só tinha feito coisas muito pequenas, de publicidade. Foi minha estreia no Brasil também, nunca tinha filmado aqui e me senti em casa. Fui o primeiro a gravar, deu aquele frio na barriga, mas foi uma experiência incrível. A locação do meu segmento (o Theatro Municipal do Rio) é linda, os atores (Rodrigo Santoro e Bruna Linzmeyer) se empenharam bastante e, para mim, foi um processo muito satisfatório. É uma história de amor, um drama, bem diferente dos filmes que já fiz.

Chegou a ver o episódio do José Padilha? Sim, e achei legal demais.

Continua após a publicidade

O que achou do veto da Igreja ao uso da imagem do Cristo Redentor? Fiquei triste quando a parte dele teve de ser excluída, e muito feliz agora que voltou. Mas o episódio abriu um debate maior: O Cristo Redentor é uma figura subjetiva da Igreja ou uma imagem que pertence a todos nós? Não tem como fazer um filme sobre o Rio sem mostrar o Cristo – essa é a discussão. E ele não é só da cidade, é um monumento da humanidade (foi eleito uma das sete maravilhas do mundo moderno).

Na sua opinião, então, a estátua não está ligada a uma religião? Não tem nada a ver. A Igreja e o símbolo deveriam ser completamente separados. O Cristo Redentor não é da Igreja. O fato de a estátua ser uma imagem religiosa não significa mais nada. Quantos judeus, muçulmanos e pessoas que nem acreditam em Jesus, sobem o Corcovado só para tirar foto com o Cristo de braços abertos? Eu conheço muitos.

Padilha disse que se sentiu censurado com a proibição. Concorda? Esse é o ponto mais sério de todos: nenhuma entidade tem o direito de restringir ou tentar criar empecilho para a expressão de uma ideia. A liberdade de expressão é única e tem de ser respeitada em todo país democrático. Se você fala bem ou mal, faz parte. Se todos falassem bem, o mundo seria falso e chato. Temos sempre que ter os dois lados. Mas vale a pena destacar que o curta do Padilha não fala mal do Cristo. É um desabafo pessoal do personagem, algo que quase todo mundo faz. Então, toda essa questão precisa ser repensada.

Rio 1 e 2 também precisaram passar pelo crivo da Cúria? Passaram sim. E eu fiquei surpreso quando me disseram que todo filme que mostra a estátua precisa dessa aprovação. Estou mostrando símbolos que sempre achei que fossem cariocas, e não da Igreja. Achei estranho, mas não tive problemas.

Continua após a publicidade

Os dois filmes foram lançados com um intervalo relativamente curto. Já se sabia que seria um sucesso? Fizemos cabines de teste e as reações eram tão boas que começamos a pensar no segundo logo depois do lançamento do primeiro. Porque esse filme demora muito para ser feito, de três a quatro anos – e esse é o tempo máximo ideal para se lançar uma sequência, para estar presente na memória das pessoas. Se se espera muito tempo para fazer o próximo, não vale a pena. O processo de criação e os lançamentos, hoje em dia, estão muito competitivos e rápidos.

Diante disso, podemos pensar que Rio 3 está a caminho? Estamos pensando, conversando a respeito. É um processo natural diante do fenômeno que foram os dois primeiros. Mas também preciso ver como encaixar isso no tempo que eu tenho. Já estou trabalhando em outro filme, a adaptação do livro infantil Ferdinando, O Touro, mais uma animação, que deve ficar pronta em 2017.

O que a série Rio representa na sua carreira? Trabalho com animação há 23 anos. A primeira grande fase da minha trajetória profissional foi com sucesso de A Era do Gelo, que colocou meu nome e meus projetos em evidência, e me deu respaldo suficiente para fazer o Rio, que era um sonho. Foi uma realização pessoal, muito importante pra mim. É um filme mundial, mas com temática extremamente pessoal. Eu tinha vontade de mostrar de onde eu vim, um pouco da minha cultura. E consegui unir realização pessoal e profissional. Foi um marco da minha carreira.

Tem algum personagem favorito? Adoro vilões. O Nigel e a Gabi, neste segundo, foram muito legais de fazer.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.